O presidente da Câmara dos Deputados, deputado Arthur Lira (PP-AL), tem em suas mãos o poder de atrapalhar a agenda do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em particular na pauta econômica.
Governistas e aliados do líder do centrão, no entanto, avaliam que ele não fará uso de pautas-bomba para prejudicar a agenda do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
O risco de Lira acionar um pacote de votações de projetos que aumentem as despesas ou retirem receitas do Executivo entrou no radar após o clima de tensão em Brasília que marcou o seu discurso, na semana passada, durante a abertura dos trabalhos legislativos deste ano. Lira cobrou que o governo federal cumpra com acordos firmados e disse que o Orçamento não pode ser de autoria exclusiva do Poder Executivo.
A possibilidade de uma relação conflituosa com a presidência da Câmara traz à memória dos petistas a reta final do governo Dilma Rousseff (PT). Na ocasião, o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (à época no MDB-RJ), lançou uma guerra contra o Planalto, colocando em votação matérias que punham em risco a estabilidade fiscal do país, o que passou a ser chamado de pauta-bomba.
A interlocutores Lira disse que sua estratégia não é adotar um tom bélico na agenda econômica. A avaliação é que Lira vai atuar caso a caso e que o clima de tensão, na prática, pode acabar aumentando o seu poder de barganha.
Se por um lado medidas econômicas impopulares enviadas pelo governo ao Congresso aumentariam a pressão dos deputados sobre Lira, por outro, quando o governo precisar, ele teria mais poder de negociação para tentar fazer seu sucessor no comando da Câmara.
Desde a campanha para a sua eleição à presidência da Casa, Lira buscou se firmar como um interlocutor confiável do mercado financeiro e do empresariado e não vai jogar fora essa posição com pautas-bomba que colocariam em risco a trajetória de recuperação econômica, afirmam pessoas próximas a ele ouvidas pela reportagem.
Pelo menos três pautas econômicas são importantes para o governo com tramitação inicial na Câmara: a negociação da MP (medida provisória) da reoneração da folha de pagamento, a regulamentação da reforma tributária e, se for necessário, o projeto para alterar a meta de déficit zero das contas do governo em 2024.
Aliados de Lira afirmam nos bastidores que é errada a visão de que o presidente da Câmara entregou os principais projetos da pauta econômica ao governo no primeiro ano do terceiro mandato de Lula e que agora estaria sem força para negociar.
Em 2023, o Congresso Nacional aprovou a pauta prioritária do governo, em particular votando o novo arcabouço fiscal, a tão aguardada reforma tributária e as medidas tributárias de aumento de arrecadação.
Lira teve um encontro com Lula na sexta-feira (9), no Palácio da Alvorada, o primeiro desde o estremecimento das relações -que teve início nos últimos dias do ano passado. A trégua selada após encontro com o presidente Lula é, porém, considerada tênue e pode se desfazer, caso os acordos não sejam cumpridos e se perceba uma tentativa do governo de querer antecipar o processo de sucessão na Câmara.
Lira e seus aliados se ressentem de uma série de ações do governo Lula, principalmente o veto a dispositivo da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) deste ano que estabelecia um calendário para pagamento de emendas parlamentares; o corte de R$ 5,6 bilhões nas emendas de comissão; além da edição da MP que reonerou a folha de pagamento e revogou o Perse, programa para o setor de eventos largamente defendido por Lira e deputados do centrão.
O fim do Perse é uma medida que Haddad precisa para aumentar a arrecadação e ajudar a diminuir a necessidade de bloqueio orçamentário em 2024. Para o relator da LDO, deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), o corte das emendas quebrou acordo feito com a articulação política, mas o mais urgente agora é garantir a aprovação do cronograma de pagamento das emendas parlamentares, com a derrubada do veto.
O parlamentar reclama da edição da MP da reoneração na véspera do Ano-Novo, apesar do conselho dado a Haddad de que não tomasse essa medida na contramão do que tinha sido aprovado pelo Congresso.
O relator afirma que Lira, mesmo diante de tentativas de antecipação do processo de sucessão, segue com muito poder para atrapalhar os planos do governo se o clima de animosidade voltar.
“O presidente Lira tem de ser tratado com o poder e a responsabilidade que tem. Não pode ser uma fera ferida”, afirma. “Entre o chão do plenário e a Faria Lima, ele escolhe o primeiro”, diz.
O encontro no Alvorada baixou levemente o clima de animosidade, com Lula prometendo manter a partir de agora um canal direto com Lira, por meio do telefone de um de seus auxiliares
(FOLHAPRESS)