Texto aprovado pelos senadores e deputados permite que governo federal possa utilizar 0,08% de toda receita para utilização na abertura de crédito suplementar em caso de superávit fiscal, expectativa é que a gestão Lula tenha um excedente a partir de 2025 um valor liberado de R$ 15,7 bilhões para fazer frente às despesas da União.

Por Humberto Azevedo, com informações da Agência Senado.

O Senado aprovou na noite desta última quarta-feira (8) a recriação do novo seguro obrigatório para veículos, semelhante ao antigo Danos Pessoais por Veículos Automotores Terrestres (DPVAT). Votaram a favor da recriação da tarifa 41 senadores, o número mínimo de votos necessário para a aprovação desse tipo de proposição. 28 senadores, a maioria ligada à oposição ao governo Lula 3, votaram contra. O texto segue para a sanção da Presidência da República.

O texto aprovado pelos senadores é praticamente o mesmo que já tinha sido aprovado pelos deputados, com pequenas alterações de redação e não de mérito. O novo DPVAT faz parte do Projeto de Lei Complementar (PLP) 233/23, de iniciativa do Poder Executivo, permitirá ainda que governo federal possa utilizar 0,08% de toda a receita para utilização na abertura de crédito suplementar em caso de superávit fiscal. A expectativa com esse expediente é que a gestão Lula 3 tenha um excedente, a partir de 2025, um valor liberado de cerca de R$ 15,7 bilhões para fazer frente às despesas da União.

O projeto foi relatado pelo líder do governo no Senado, senador Jaques Wagner (PT-BA), que destacou o caráter solidário do novo seguro “para quem não tem seguro contratado”. O texto recria o Seguro-Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT), nove nome da cobrança.

De acordo com a iniciativa, o SPVAT deve ser cobrado anualmente dos proprietários de automóveis e motocicletas e usado para pagar indenizações por acidentes. A Caixa Econômica Federal (CEF) será a administradora do fundo desses recursos. “É um seguro solidário. O valor deve ser entre R$ 50 e R$ 60 por ano. É para ajudar aqueles que não conseguem um seguro privado”, informou Wagner.

DEBATES

A aprovação da matéria, no entanto, só veio depois de muitos debates. A oposição criticou a recriação de uma nova despesa para a população, enquanto senadores da base governista destacaram o caráter solidário da proposta e a garantia de que a população mais pobre, vítima de acidente de trânsito voltará a possuir um mecanismo de proteção social.

Ao defender a aprovação da matéria, o senador Eduardo Braga (MDB-AM) disse não haver dúvida de que a saúde pública precisa de mais recursos. Segundo o senador Fabiano Contarato (PT-ES), o seguro é importante para ajudar as vítimas de acidentes de trânsito.

Já o senador Cid Gomes (PSB-CE) relembrou como ocorreu o fim do DPVAT no governo passado, envolvendo uma disputa política entre o ex-presidente Jair Bolsonaro e o deputado federal Luciano Bivar (União-PE). De acordo com o ex-governador do Ceará, o fim do DPVAT prejudicou a população que perdeu, segundo ele, um instrumento que era bom na vida dos brasileiros. Declarou que o atual projeto é importante para ajudar nas despesas dos hospitais públicos e destacou a justiça na cobrança, já que o seguro será cobrado de todos os proprietários de veículos e motocicletas.

Conforme informou o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), senador Davi Alcolumbre (União-AP), a aprovação do projeto foi um acordo entre as lideranças do Congresso com o governo. O senador Weverton (PDT-MA) também declarou apoio à matéria, que seria importante para ajudar nos recursos do SUS.

A senadora Zenaide Maia (PSD-RN) também manifestou apoio ao projeto e afirmou que, como médica de urgências, sabe a importância de mais recursos para atender as vítimas de acidentes de trânsito. De acordo com o senador Otto Alencar (PSD-BA), mais de 40% do valor arrecadado será direcionado para o SUS, para atender principalmente a população mais carente. “Há uma conotação social na arrecadação desse recurso”, defendeu Otto.

ALTERAÇÕES

A Câmara dos Deputados alterou o texto original proposto pelo Poder Executivo para ampliar a lista de despesas a serem cobertas pelo SPVAT. O rol passa a contemplar assistência médica e suplementar, como fisioterapia, medicamentos, equipamentos ortopédicos, órteses e próteses. Também passam a ser pagos serviços funerários e despesas com a reabilitação profissional de vítimas que ficarem parcialmente inválidas. Os deputados incluíram ainda a possibilidade de pedidos de indenização e assinatura de documentos por meio eletrônico.

O texto recebeu 30 emendas na CCJ do Senado. O senador Wagner acatou apenas uma delas, de redação, proposta pelos senadores Marcos do Val (Podemos-ES) e Rogério Carvalho (PT-SE). A alteração deixa claro que o cônjuge e os herdeiros da vítima devem receber indenização por morte e reembolso de despesas com serviços funerários. A vítima recebe as demais coberturas: invalidez permanente e reembolso por despesas com fisioterapia, medicamentos, equipamentos ortopédicos, órteses, próteses e reabilitação profissional.

Durante a votação na CCJ, o relator informou que o presidente Lula irá vetar o item que cria uma multa de trânsito por atraso no pagamento do SPVAT. Ele classificou a previsão de multa como uma penalização excessiva colocada pelos deputados durante a tramitação do projeto na Câmara.

Já na discussão durante o plenário, o senador Carlos Viana (Podemos-MG) apresentou um destaque para que o SPVAT fosse considerado obrigatório apenas para os proprietários que não tenham cobertura de outros seguros. Essa alteração foi rejeitada por 33 votos a 27.

ARCABOUÇO FISCAL

Além de criar o SPVAT, o projeto altera o novo arcabouço fiscal (Lei Complementar 200, de 2023). O texto antecipa em dois meses a permissão para a abertura de crédito suplementar em caso de superávit fiscal. Segundo Wagner, a mudança permitiria uma elevação de 0,8% nas despesas da União, o equivalente a uma estimativa de R$ 15,7 bilhões.

Parte do dinheiro pode ser usada para compensar o corte de emendas parlamentares ao Orçamento (Lei 14.822, de 2024). Na mensagem de veto parcial ao texto do Orçamento (VET 4/2024), o presidente Lula suspendeu uma dotação de R$ 5,6 bilhões prevista para o pagamento de despesas sugeridas por comissões permanentes das duas Casas.

Conforme disse Wagner, a aprovação da matéria permite que o valor de R$ 3,6 bilhões seja usado para compensar o corte de emendas imposto pelo veto de número 4/24 estabelecido pelos congressistas. O veto ao Orçamento está na pauta de uma sessão deliberativa do Congresso marcada para acontecer nesta quinta-feira (9).

O líder do governo no Congresso Nacional, senador Randolfe Rodrigues (Sem Partido-AP), afirmou que a alteração no arcabouço fiscal é apenas uma antecipação de valores. Randolfe disse que a liberação desses valores é necessária para pagar despesas de universidades e ajudar o governo a viabilizar programas sociais e a construção de hospitais. “A justificativa para esse valor é isso: ajudar os mais pobres”, justificou Randolfe.

A oposição ainda apresentou um destaque para tentar tirar do projeto os itens de alteração no arcabouço. Levado a votação, porém, o destaque foi rejeitado por 43 votos a 25 e o texto foi mantido conforme o relatório apresentado pelo senbador Jaques Wagner.

CRÍTICAS AO SPVAT

Para o líder da oposição, senador Rogério Marinho (PL-RN), o SPVAT é uma forma de aumentar impostos para uma população já fragilizada e carente. Ele disse que o seguro na verdade é um tipo de imposto, já que é obrigatório. Segundo Marinho, o cálculo é que o novo seguro possa render até R$ 7 bilhões ao ano para o governo – o que serviria para ajudá-lo a fazer frente ao superávit fiscal.

“O governo pretende aumentar seus gastos em detrimento das finanças brasileiras. Isso implode a economia e aqueles que o governo quer proteger serão as vítimas — declarou Marinho, ao pedir a rejeição do projeto”, comentou o senador oposicionista potiguar – ex-tucano e agora um dos maiores próceres do ninho bolsonarista.

O senador Jorge Seif (PL-SC) declarou que a criação do SPVAT é mais um imposto nas costas do brasileiro. Na mesma linha, o senador Eduardo Girão (Novo-CE) também criticou o projeto e o governo. Girão disse que votava de forma contrária “com convicção”. O senador Carlos Portinho (PL-RJ) definiu o governo como “impostor”, que só pensa em aprovar mais impostos.

Já o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) disse ter saudade da gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, seu pai, que se preocupava, segundo ele, em “tirar o estado do cangote do contribuinte”. O filho “zero 1” do ex-presidente lembrou que foi o ex-presidente que acabou com o DPVAT. “Qual foi o impacto que a falta do DPVAT fez na vida do povo? Nenhum! Isso aqui é pra arrecadar mais”, declarou Flávio Bolsonaro.

O senador Lucas Barreto (PSD-AP) se declarou contrário ao projeto, enquanto o senador Esperidião Amin (PP-SC) criticou o “jabuti” da alteração no arcabouço fiscal. O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) afirmou que a história do DPVAT “não é uma boa história”, mas disse que o grande problema do projeto é “o jabuti que o texto carrega”, fazendo referência à alteração no arcabouço fiscal que libera mais de R$ 15 bilhões para o governo federal. “Quando se muda um estatuto como esse, de forma sorrateira, o mercado percebe e cria insegurança jurídica” criticou Oriovisto, ao anunciar voto contrário à proposta.