Xênia Guerra
O PL 1904/24 é um tema sensível que merece atenção não apenas dos operadores do direito, mas sobretudo da própria sociedade. Não se pode permitir uma regressão na lei brasileira e, pior ainda, que coloca à vítima uma pena maior que a do predador sexual.
No Brasil, a cada oito minutos uma mulher é estuprada e uma boa parte delas são crianças ou adolescentes.
Conforme o relatório Anual Socioeconômico da Mulher (Raseam), publicado este ano, em 2022, por exemplo, das 62.091 notificações recebidas, mais de 45 mil tinham como vítimas pessoas com menos de 19 anos de idade.
E é por isso que não podemos fechar os olhos para isso e lutar para evitar retrocessos. E a seccional de Mato Grosso não pode se omitir neste debate. Até porque, infelizmente, nosso estado está entre os que mais registram crimes de exploração sexual infantil, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. O documento também aponta que crianças e adolescentes continuam sendo as maiores vítimas da violência sexual.
Reconheço que o debate é um tema controverso, mas não podemos ignorar os fatos, os números e o cenário no qual as mulheres estão inseridas. Vivemos em um país que possui um alto índice de feminicídio e de violência contra as mulheres. O PL 1904/24 acaba por criminalizar a vítima, fazendo com que ela sequer vá procurar as autoridades policiais e muito menos o sistema de saúde, que sabemos ser essencial nestes casos, para justamente prevenir doenças e até mesmo uma gravidez decorrente da violência sexual.
Outro ponto que precisa ser levado em consideração é que em casos de crianças e adolescentes, muitas demoram para denunciar, por medo, pois são ameaçadas. Os casos, em sua maioria, ocorrem dentro de casa, e quando se descobre a gravidez, infelizmente, já está tarde. Esta é a realidade atual que não pode ser ignorada e não podemos, jamais, aceitar qualquer retrocesso jurídico no direito das mulheres.
Inclusive o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil já se manifestou pela inconstitucionalidade do PL 1904/2024, que equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples, inclusive nos casos de gravidez resultante de estupro.
A discussão deve ser profunda, isenta e sem açodamento. É necessário redobrar os cuidados e proteção estatal para mulheres, crianças e adolescentes.
Temos que lutar hoje e sempre pelos direitos das mulheres, crianças e adolescentes do nosso país.
Xênia Guerra é presidente da subseção de Sinop da OAB-MT
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