ROSANA LEITE ANTUNES DE BARROS
Foi sancionada no dia 28 de dezembro último a Lei 14.786/2023, que cria o protocolo “Não é Não”, visando a prevenção ao constrangimento e à violência contra as mulheres.
A norma surge para firmar a garantia e a liberdade para as mulheres, mirando como foco as casas noturnas e boates, locais fechados e shows, onde acontecem consumo de bebidas alcoólicas. A palavra “proteção”, sem qualquer dúvida, é o foco da legislação, com a finalidade precípua de fiança para que as mulheres possam circular onde bem entenderem, e, dignamente possam se divertir.
Eclodiu no início de 2.023 a violência sexual sofrida por uma jovem na Espanha, tendo sido apontado como agressor o jogador de futebol brasileiro Daniel Alves. Por conta do protocolo espanhol “No Callem”, ou “Não se Calem” em português, os funcionários do estabelecimento espanhol já sabiam como agir, evitando a revitimização da mulher. No caso espanhol as provas foram facilitadas, a jovem vítima amparada, e com declaração da magistrada atuante nos autos de que existem provas suficientes para a condenação do agressor.
Há que se pensar na dificuldade da juntada de provas em casos tais, justamente pelo julgamento da sociedade quanto ao gênero. Primeiro, geralmente, as falas acabam por reduzir as mulheres ao ambiente doméstico, como se elas fossem proibidas de saírem para a diversão, que deve ser de todas as pessoas. Até mesmo quando uma mulher é assassinada, estando em ambiente de divertimento para todas as pessoas, acaba sendo “julgada” por inúmeras falas.
A sociedade carece de compreensão quanto ao direito máximo e digno de distração para toda e qualquer pessoa. E isso é premente. Todavia, a sensação que fica é a de que as mulheres só podem estar nesses ambientes quando acompanhadas. E esse raciocínio deve mudar o quanto antes, com normas a dizer o evidente, como a citada.
O protocolo brasileiro “Não é Não” define o constrangimento e a violência contra as mulheres; informa sobre o atendimento a ser prestado a elas; sobre o protagonismo delas; sobre capacitação permanente de pelo menos uma pessoa no estabelecimento para respectivo atendimento; sobre a informação de contatos para que elas possam se valer imediatamente; colaboração para amealhar provas para ações futuras; manutenção dos vestígios do delito; preservação das imagens de câmeras por, pelo menos 30 dias; sobre o selo “Não é Não – Mulheres Seguras”; criação de código próprio a ser divulgado no sanitário, para que elas possam alertar os funcionários do estabelecimento e pedir ajuda; divulgação de campanhas educativas; divulgação pelo poder público dos locais seguros para mulheres.
É de se ressaltar pontos de discordância da citada lei, a meu sentir. A uma, a exclusão peremptória no parágrafo único do artigo 2º, dos locais de cultos e eventos realizados em caráter religioso. E, a duas, a vacatio legis de 6 meses para a entrada em vigor da norma.
Quanto à isenção religiosa, há que se ponderar que o Código Penal Brasileiro pode, e deve, ser aplicado para qualquer lugar. Assim, em havendo vítimas de crimes contra a dignidade sexual em qualquer lugar que seja, aplicar-se-ão outras normas que fazem parte do arcabouço de normas dos direitos humanos das mulheres no país. De outro turno, o tempo transcorrerá para que a norma possa ser aplicada efetivamente. Podíamos já contar com essa importante lei durante o período carnavalesco de 2024, mas, certamente, para que se pudessem fazer as adequações pertinentes, o lapso temporal se fez necessário.
Leis e políticas públicas afirmativas entram em vigor para a reeducação da sociedade. Justiça social se encaixa, neste caso, na obviedade, que deve ser dita muitas vezes, para garantia da liberdade feminina.
Que se cumpra, como deve ser!
(*) ROSANA LEITE ANTUNES DE BARROS é Defensora Pública Estadual e mestra em Sociologia pela UFMT.
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