A descoberta aparentemente simples de um broche metálico do século 9 levou arqueólogos noruegueses a um dos sepultamentos mais intrigantes já encontrados no país. O achado, feito por um detectorista de metais no condado de Trøndelag revelou o corpo de uma mulher da Era Viking enterrada com um ritual até então desconhecido, que incluía duas grandes conchas de vieira (um tipo de molusco) posicionadas na sua boca.
Os pesquisadores da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU), responsáveis pelo projeto, relatam que a investigação começou quando Roy Søreng identificou uma fivela oval (joia característica das vestimentas femininas vikings) enquanto ele explorava um campo em Val, na região de Bjugn. O objeto estava perto da superfície, ameaçado pelo próximo preparo do terreno antes do plantio.
Søreng e o proprietário da terra, Arve Innstrand, alertaram o Museu de Ciências da NTNU e o Conselho do Condado de Trøndelag sobre o item, desencadeando uma escavação que se mostrou surpreendente. “Durante a inspeção, percebemos que estávamos diante de uma nova sepultura com esqueletos que corriam sério risco de serem danificados”, destaca a arqueóloga Hanne Bryn, em comunicado publicado no dia 12 de novembro.
Escavação do sítio arqueológico
Debaixo do solo da fazenda, a equipe encontrou o esqueleto de uma mulher enterrada com roupas e duas fivelas ovais que prendiam as alças do vestido e uma pequena fivela circular que fechava o decote da anágua. Foi exatamente uma dessas fivelas que Søreng detectou.
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Aquilo que ninguém esperava, porém, era o posicionamento cuidadoso de duas grandes vieiras à altura da boca da falecida. As conchas estavam colocadas com a parte curva voltada para fora e a borda reta virada para cima, cobrindo parcialmente a mandíbula. Ao longo do sepultamento, os arqueólogos também encontraram pequenos ossos de pássaros – outro elemento ritual incomum.
Um ritual ainda sem decifração
Os enterros vikings eram rituais cuidadosamente elaborados, nos quais joias, roupas e objetos funerários expressavam identidade, status e a memória da pessoa falecida. Os funerais eram eventos públicos, carregados de símbolos destinados aos presentes.
Ainda assim, tanto as vieiras quanto os ossos de ave representam elementos que nunca haviam sido observados em sepulturas pré-cristãs na Noruega. É provável que tivessem um significado especial, já que a presença de conchas no túmulo não parece se relacionar com simbolismos cristãos posteriores, como a associação medieval das vieiras ao culto de São Tiago. As teorias ainda estão em aberto.
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Diante da raridade do achado, o Ministério do Patrimônio Cultural do país destinou fundos emergenciais para garantir a preservação da sepultura. “Esta é uma descoberta incrivelmente empolgante. É muito raro encontrar um esqueleto tão bem preservado em sepulturas antigas. Esta descoberta tem grande valor para o patrimônio cultural e enorme potencial de conhecimento”, afirmou a ministra Hanna Geiran.
A política também elogiou a colaboração de Søreng e Innstrand. “Gostaria de parabenizar tanto o proprietário do terreno quanto quem fez a descoberta por nos permitirem aprender um pouco mais sobre um período fascinante de nossa história comum”, lembrou ela.
Possíveis laços familiares
Este não é o primeiro achado no local. No início do ano, arqueólogos documentaram outro esqueleto extremamente bem preservado na mesma fazenda. No caso, o exemplar pertencia ao século 8, algo entre uma e três gerações mais antigo que a mulher das vieiras.
A coincidência, porém, levantou novas perguntas: teriam essas pessoas relação familiar? Pertenciam à mesma comunidade ou linhagem? As respostas podem surgir com as análises planejadas pela equipe para o futuro próximo.
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“Vamos examinar o esqueleto, preservar os objetos e coletar amostras para datação e análise de DNA. O objetivo é aprender mais sobre a pessoa e sobre um possível parentesco com a descoberta anterior”, destaca Sauvage.
Mais do que só DNA, os pesquisadores ainda irão estudar características como altura, sexo, sinais de doenças e idade aproximada, buscando reconstruir o perfil biológico e social da mulher.
(Por Arthur Almeida

