O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) pediu, no domingo, a condenação de todos os acusados pelo crime de incêndio culposo que ocorreu no Ninho do Urubu, centro de treinamentos do Flamengo, em fevereiro de 2019. A tragédia resultou na morte de dez garotos da base. Outros três sofreram lesões.
O órgão ouviu mais de 40 testemunhas durante mais de três anos desde o oferecimento da denúncia.
– Diante da complexidade do caso e a pluralidade de acusados, o MPRJ entendeu que o conjunto probatório angariado comprova plenamente a responsabilidade criminal dos denunciados que ocupavam cargos com ingerência na administração do referido CT – disse o órgão em nota.
Os acusados são:
- Antonio Marcio Mongelli Garotti (ex-diretor de Meios do Flamengo)
- Marcelo Maia de Sá (ex-diretor adjunto do Patrimônio (Obras) do Flamengo)
- Claudia Pereira Rodrigues (representante da empresa NHJ, que forneceu os contêineres usados como alojamento)
- Danilo da Silva Duarte (engenheiro responsável pela fabricação, montagem e instalação dos contêineres)
- Fabio Hilario da Silva (engenheiro responsável pela fabricação, montagem e instalação dos contêineres)
- Weslley Gimenes (engenheiro responsável pela fabricação, montagem e instalação dos contêineres)
- Edson Colman da Silva (responsável pela manutenção dos aparelhos de ar-condicionado)
Onze pessoas foram denunciadas, mas o Judiciário entendeu que dois acusados não estavam mais vinculados ao fato ocorrido. Além disso, um terceiro foi absolvido por entenderem que suas ações não contribuíram para a prática do crime.
O quarto excluído da denúncia foi Eduardo Bandeira de Mello. Ele não chegou a ser julgado porque atingiu a idade prevista no Código Penal que implicava a redução de sua pena, o que resultou na prescrição do delito. Foi ele quem assinou todos os contratos de compra dos contêineres que pegaram fogo. Em 2014, o ex-presidente do clube chegou a ser notificado pelo Ministério Público e pelo Ministério Público do Trabalho pra regularizar a situação considerada precária pelas autoridades.
Na nota, o MPRJ diz que o “episódio, que ficou conhecido como ‘a maior tragédia da história do Flamengo’, poderia e deveria ter sido evitado”. Na peça, o órgão diz “demonstrar, com rigor técnico, como os comportamentos dos denunciados contribuíram para a ocorrência do delito que ceifou a vida de dez adolescentes”. O Ministério Público pede a “condenação como a resposta penal justa e necessária”.
Leia a nota:
“O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio da Promotoria de Justiça vinculada à 36ª Vara Criminal da Capital, requereu, no domingo (11/05), a condenação de todos os acusados pelo crime de incêndio culposo que ocorreu no Centro de Treinamento Presidente George Helal (Ninho do Urubu), pertencente ao Clube de Regatas do Flamengo, na madrugada de 08 de fevereiro de 2019. O episódio resultou na morte de dez adolescentes e em lesões corporais a outros três menores de idade.
Após longa instrução criminal, com a oitiva de mais de quarenta testemunhas, que perdurou mais de três anos após o oferecimento da denúncia, diante da complexidade do caso e a pluralidade de acusados, o MPRJ entendeu que o conjunto probatório angariado comprova plenamente a responsabilidade criminal dos denunciados que ocupavam cargos com ingerência na administração do referido CT, Antonio Marcio Mongelli Garotti e Marcelo Maia de Sá, dos acusados responsáveis pelos contêineres destinados ao alojamento dos adolescentes, Claudia Pereira Rodrigues, Danilo da Silva Duarte, Fabio Hilario da Silva e Weslley Gimenes, bem como do responsável contratado para realizar a manutenção dos aparelhos de ar-condicionado, Edson Colman da Silva.
Cumpre destacar que, embora onze pessoas tenham sido denunciadas, no decorrer do processo o Judiciário rejeitou a exordial acusatória em relação a dois acusados, por entender que não estavam mais vinculados, no tempo e no espaço, ao fato ocorrido. Além disso, um terceiro foi absolvido sumariamente, diante do entendimento de que suas ações não contribuíram para a prática do crime. Já o quarto excluído do polo passivo não chegou a ser julgado por questão de ordem pública, uma vez que atingiu a idade prevista no Código Penal que implicava a redução de sua pena, o que resultou na prescrição do delito.
Episódio poderia ter sido evitado
Em memoriais, o Ministério Público assevera que o nefasto episódio, que ficou conhecido como “a maior tragédia da história do Flamengo”, poderia e deveria ter sido evitado. Na peça apresentada, o MPRJ demonstra, com rigor técnico, como os comportamentos dos denunciados contribuíram para a ocorrência do delito que ceifou a vida de dez adolescentes, afastando completamente a percepção sobre o evento como um acidente inevitável ou uma simples fatalidade.
A Promotora de Justiça subscritora ressalta a ciência inequívoca por parte dos acusados de que o Centro de Treinamento se encontrava em atividade mesmo sem possuir alvará de funcionamento, em razão da ausência do certificado de aprovação emitido pelo Corpo de Bombeiros, já tendo sido interditado e autuado diversas vezes diante da clandestinidade em que operava. O órgão de execução ainda destaca que, além das irregularidades elétricas encontradas no local, as provas constantes nos autos evidenciam a falta de uma manutenção preventiva por parte do responsável pelos aparelhos de ar-condicionado, vez que apontado que o incêndio teve início após a ocorrência de um fenômeno termoelétrico no interior de um dos aparelhos.
Além disso, são enfatizadas as escolhas dos denunciados ligados à empresa responsável pela fabricação dos contêineres destinados ao alojamento dos adolescentes, as quais incrementaram o risco e impuseram diversos obstáculos à fuga dos jovens, ressaltando-se que o contêiner contava com uma janela gradeada por quarto, portas de correr que emperraram durante o incêndio e uma única porta de saída descentralizada, localizada distante do quarto 1, onde todos os jovens que ocupavam faleceram. Além disso, não dispunha de qualquer sistema ativo de combate a incêndio e continha, no interior das chapas de aço, material sem tratamento antichamas, que por possuírem alta inflamabilidade, permitiram o desenvolvimento rápido do incêndio, conforme devidamente apurado pela perícia técnica.
Por entender que restou plenamente comprovado o incremento do risco de produção do resultado e a violação ao dever jurídico de cuidado a partir dos comportamentos dos denunciados, requer o MPRJ a condenação como a resposta penal justa e necessária que a sociedade espera e confia”. (GE)