ALBERTO SCALOPPE
Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso (MPMT), requerendo a suspensão da Lei 11.861/22, levantou mais um debate sobre a preservação ambiental em nosso estado. Chamada de Lei do Pantanal, a norma revela a existência de mais um gargalo entre a necessidade de preservação e o avanço da produção agropecuária mato-grossense.
A Lei do Pantanal altera a Lei 8.830/2008, que trata da política estadual de gestão e proteção à Bacia do Alto Paraguai. Em outras palavras, a legislação alvo do MP promove a flexibilização de regras já existentes. Entre elas está a permissão para o acesso e uso das áreas de Reserva Legal na planície alagável para a pecuária extensiva e a restauração de pastagem nativa, além de outras alterações que se mostram uma afronta aos Princípios da vedação ao retrocesso ambiental e da Precaução que, subsidiados pelo artigo 225 da Constituição, vedam qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção.
A primeira, e talvez principal, reflexão que devemos fazer nesse caso é: Mato Grosso precisa desse excedente econômico explorando o nosso Pantanal? Levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta, por exemplo, que somos, desde 2004, o estado com maior produção de bovinos do país, com 9,5 vezes mais cabeças de gado do que pessoas. O mesmo estudo demonstra que, de 2021 para 2022, o rebanho bovino aumentou 5,6%.
O Ministério da Agricultura e Pecuária também coloca Mato Grosso como destaque. Segundo o órgão federal, em 2023, o Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP) do nosso estado chegou a R$ 184,3 bilhões, sendo R$ 21,1 bilhões somente de carne bovina. Esses números nos mantêm como o principal contribuinte para o VBP brasileiro e, de certa forma, colocam em dúvida uma necessidade de maior exploração do Pantanal.
Fato é que, nesses últimos anos, tem havido uma proatividade em Mato Grosso a buscar por uma flexibilização das leis ambientais, sob a justificativa de desburocratizar o que consideram inibidor do crescimento econômico. Mesmo utilizando mecanismos legais, essa é uma questão que precisa ser melhor avaliada, principalmente diante dos visíveis impactos climáticos que, inclusive, devem provocar neste ano uma quebra de safra da soja de mais de 20%.
Ou seja, estamos em um cenário em que ao mesmo tempo que caminhamos para uma queda na produção, decorrente de um problema climático, também articulamos para flexibilizar leis e potencializar a exploração ambiental. Na verdade, essa queda indica uma urgência de maior responsabilidade com o meio ambiente, para manter o equilíbrio entre a produção e a sustentabilidade.
Uma resposta a essa intempestividade deve ser uma preservação maior, principalmente do Pantanal. O estado não precisa desse excedente econômico, dessa diferença de ganho em cima do Pantanal. Como uma planície alagável, o potencial de exploração do Pantanal é ínfimo em relação ao impacto que vai ocorrer por conta da ocupação. Existem, atualmente, tecnologias e mecanismos suficientes para fortalecer essas atividades intensivas em outras regiões.
É imprescindível que o Pantanal seja preservado. Estudos desenvolvidos por pesquisadores com interesse público demonstram uma necessidade muito maior de protegê-lo do que a de prosseguir com uma pecuária extensiva. É preciso entender que preservar não significa inibir o desenvolvimento ou condenar ao atraso.
O estado é rico em informação, dados e diagnósticos, bem como já tem avançado nas regularizações de áreas alteradas e consolidadas permitindo mais produção e melhor fiscalização.Com o que já há regulado, dá para continuar progredindo economicamente. Preservar também é avançar para o futuro!
(*) ALBERTO SCALOPPE é advogado do escritório Scaloppe Advogados Associados, em Cuiabá
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