BRUNO SOLLER

Com a aproximação do final do ano, diversas empresas de pesquisas têm feito levantamentos acerca do desempenho do governo federal. O resultado, no entanto, é bastante preocupante para o presidente Lula. Em um país que saiu extremamente dividido das urnas, qualquer vacilo pode ser o fortalecimento do outro lado. Pela primeira vez, as medições mostram maior rejeição ao governo do que aprovação e um ponto que deve acender o alerta no Planalto é que as expectativas com o futuro são desoladoras.

A consultoria Quaest, contratada pelo Banco Genial, mostrou que para 49% dos brasileiros o País caminha para a direção errada. O número supera em 6% aqueles que concordam com os ventos para os quais o Brasil segue. Também foram 6% os que deixaram de aprovar o governo, segundo a pesquisa. Outra pesquisa, realizada pela Atlas, mostrou que 45,1% dos entrevistados consideram o governo ruim ou péssimo, em contraponto a 42,7% que classificam como ótimo ou bom.

Essa virada de chave no crepúsculo do ano frustra a ideia do governo que se lançou com o slogan de “União e Reconstrução”. A reconstrução não está sendo vista pela população, que inclusive olha para o futuro com apreensão ao não concordar com os rumos da gestão e a união merece uma análise à parte, já que apesar do tradicional mapa eleitoral mostrar a divisão azul e vermelha do país e o sul/sudeste estarem sempre preenchidos de azul, Lula obteve resultados importantes nessas regiões, que foram fundamentais para garantirem sua vitória com pouco mais de 2 milhões de votos de diferença, ou seja, nem 2% do eleitorado.

Um exemplo importante foi a diferença de resultado na capital paulista quando se compara 2018 e 2022. Na primeira, Jair Bolsonaro bateu Haddad por quase 20% de diferença. O ex-presidente somou 60,38% dos votos da cidade, contra 39,62% do então candidato petista. Quatro anos mais tarde, Lula vence Bolsonaro por 7%. Uma mudança drástica no maior eleitorado de cidade do país. Em Curitiba, na eleição de 2018, Bolsonaro fez 76,5% contra Haddad, 10 pontos a mais do que a vitória que teve contra Lula, em 2022. Essa diminuição de distâncias e até algumas viradas foram essenciais para Lula se eleger pela terceira vez presidente da República.

Ao analisar os números das pesquisas, chama a atenção que a queda brusca da aprovação de Lula se dá justamente nessa porção da sociedade brasileira. No Sudeste, queda de 6% e, no Sul, queda de 10%. A união que tanto se prega no slogan governamental e que caminhava com algum sentido após o resultado das eleições, parece não mais ser exitosa a partir do momento que as diferenças regionais começam a se apurar mais intensamente. O azul e o vermelho do mapa ao invés de caminharem para uma simbiose roxa, estão ganhando contornos mais vivos.

“No Sudeste, queda de 6% e, no Sul, queda de 10%.”

Apesar de alguns itens recaírem positivamente sobre o governo Lula, como uma certa melhoria nos preços dos alimentos e alguns itens como o óleo de cozinha e uma boa expectativa com o Desenrola Brasil, o custo de vida para o brasileiro está muito alto. O alto valor de aluguel, de contas de luz e água, preço dos combustíveis e a baixa recomposição salarial afetam diretamente o dia a dia das pessoas. A comparação se dá de maneira muito simples e sempre repetida em grupos de foco: com 300 reais antes se saía com o carrinho de compras cheio e, hoje, não dá pra absolutamente nada.

A cobrança de impostos de importação em redes de compras online internacionais, tipo Shopee e Shein, e o veto na desoneração da folha são pontos isolados, mas que quando conjugados dão a sensação de um país que cobra mais imposto dos seus habitantes, em uma fase de “vacas magras”. O final de ano, especificamente, também é uma época em que as pessoas acabam por gastar mais, devido as festas natalinas e réveillon, além da apreensão com as contas de janeiro, em especial, as matrículas e o IPVA. Portanto, a percepção ganha contornos ainda maiores.

As viagens de Lula pelo mundo com gastos exorbitantes e comitivas recheadas de ministros e assessores, além de um protagonismo ao estilo “blogueirinha” da primeira dama, também são mal vistos pela população. Apesar do entendimento de que é necessário um maior ativismo brasileiro no cenário internacional, Bolsonaro deixou um comparativo na cabeça do brasileiro quando se hospedava em embaixadas e comia refeições populares, como o episódio da pizza na calçada em Nova Iorque, Estados Unidos. Apesar de apelativo e até hipócrita para algumas pessoas, o fato é que o brasileiro entende que é possível gastar menos e se assusta com cifras milionárias que saem nos noticiários, como os 164 milhões de reais em despesas internacionais.

A participação brasileira nos conflitos internacionais também está no radar das críticas e afetam a imagem do governo. A titubeante posição na guerra Russia-Ucrânia, a tentativa em vão de ser mediador da paz na guerra Israel-Hamas, com mais discursos de condenação a Israel do que ao terrorismo do Hamas e as vistas ao projeto de anexação de Essequibo, pela Venezuela, colocam o Brasil em um eixo que é rejeitado pela maioria da população. Quando Lula coloca as relações internacionais brasileiras como ponto chave de seu governo é natural que a discussão sobre suas ações recaia sobre este ponto.

O legado pós pandemia é bastante perverso para todas as economias. Algumas marcas serão de difícil mudança, mas a expectativa do brasileiro com um novo governo é de que a vida pudesse, mesmo que vagarosamente, melhorar. O resultado após 25% do mandato concluído é de um mais do mesmo. Poucas coisas mudaram de fato. Há uma expectativa ainda sobre reformas que estão sendo conduzidas pelo Parlamento, que podem criar ambientes mais positivos para investimentos. Ainda é o começo da gestão e muita água tem para rolar, mas o resultado de início é pífio e tem feito Lula desidratar justamente no eleitor que foi fundamental para sua vitória. Se buscar falar apenas para convertidos, Lula poderá sofrer do mesmo mal que derrotou Bolsonaro.

(*) BRUNO SOLLER – Estrategista Eleitoral. Especializado em pesquisas de opinião pública. Graduado em Relações Internacionais pela PUC-SP, com especialização em Comunicação Política pela George Washington University. É Colunista do Jornal O Estado de São Paulo. Foi chefe de gabinete do Ministério da Cultura e trabalhou na Câmara dos Deputados e Prefeitura de São Paulo. Foi observador eleitoral pela ONU. Apresentou o programa Poder em Análise na Rádio Trianon e cobriu as eleições nacionais pela RecordTV.

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