A partir de imagens capturadas pelo telescópio MeerKAT, da África do Sul, astrônomos descobriram uma nova radiogaláxia. Com jatos de plasma 32 vezes maiores do que a Via Láctea e uma megaestrutura de 3,3 milhões de anos-luz de ponta a ponta, ela foi chamada de Inkathazo (que significa “problema” nas línguas xhosa e zulu).

Os pesquisadores esperam que sua “descoberta emocionante e inesperada”, como descrito em comunicado, ajude a esclarecer a misteriosa origem e evolução de algumas das maiores estruturas do Universo. Os resultados encontrados pelo estudo renderam a publicação, em novembro de 2024, de um artigo na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Descoberta de radiogaláxias

As radiogaláxias são gigantes cósmicos que expelem jatos de plasma quente a milhões de anos-luz através do espaço. Esse material, que brilha em frequência de rádio, é alimentado por buracos negros supermassivos nos centros das galáxias.

Por muito tempo, os especialistas acreditaram que esses corpos celestes eram bem raros. No entanto, com a popularização de nova geração de radiotelescópios, como o MeerKAT, essa ideia virou de cabeça para baixo.

“O número de descobertas de radiogaláxias gigantes explodiu nos últimos cinco anos graças aos novos e poderosos telescópios”, afirma Kathleen Charlton, primeira autora do novo estudo. “As pesquisas sobre esses fenômenos está se desenvolvendo tão rapidamente que está quase difícil acompanhar. Isso é incrivelmente emocionante”.

Mapa de idade espectral de "Inkathazo". Ciano e verde mostram plasma mais jovem, enquanto roxo indica plasma mais velho — Foto: KKL Charlton (UCT), MeerKAT, HSC, CARTA, IDIA
Mapa de idade espectral de “Inkathazo”. Ciano e verde mostram plasma mais jovem, enquanto roxo indica plasma mais velho — Foto: KKL Charlton (UCT), MeerKAT, HSC, CARTA, IDIA

Inkathazo

Segundo Charlton, a galáxia recém-descoberta recebeu o nome de “Inkathazo” como uma referência ao “problema” que foi entendê-la. Ela não tem as mesmas características de muitas outras radiogaláxias gigantes, como o formato típico de jatos de plasma. Enquanto a maioria delas projeta-se em uma linha reta, esta apresenta jatos dobrados,

Inkathazo também vive no centro de um aglomerado de galáxias, em vez de estar em relativo isolamento. Para os cientistas, essa característica deveria dificultar que os jatos de plasma atingissem tamanhos tão enormes, mas isso não parece ser um impeditivo no seu caso.

“Esta é uma descoberta emocionante e inesperada”, reitera Kshitij Thorat, coautor do estudo. “Encontrar radiogaláxias em um ambiente de aglomerado levanta questões sobre o papel das interações ambientais na formação e evolução dessas galáxias gigantes”.

Mergulho de cabeça no fenômeno

De forma a tentar entender mais sobre esse enigma cósmico, os pesquisadores aproveitaram as capacidades excepcionais do MeerKAT para criar alguns dos mapas de idade espectral de mais alta resolução já feitos para tais corpos celestes. Tais mapas rastreiam a idade do plasma em diferentes partes da estrutura e fornecem pistas sobre os processos físicos em ação.

Os resultados revelaram complexidades intrigantes nos jatos de Inkathazo, com alguns elétrons recebendo impulsos inesperados de energia. Os pesquisadores acreditam que isso pode ocorrer quando os jatos colidem com gás quente nos vazios entre galáxias em um aglomerado.

“Esta descoberta nos deu uma oportunidade única de estudar a física por trás desses eventos em detalhes extraordinários”, explica Thorat. “Nossos achados desafiam os modelos existentes e sugerem que ainda não entendemos muito da complicada física do plasma em jogo nessas galáxias extremas”.

A maioria das grandes galáxias conhecidas foi encontrada em latitudes do norte com telescópios europeus, enquanto o céu do sul permanece relativamente inexplorado para tais objetos gigantes. Mas Inkathazo não está sozinha; com ela, há pelo menos outras duas radiogaláxias, as quais foram registradas em um levantamento de 2021.

“Só pelo fato de termos revelado três galáxias apontando o MeerKAT para um único pedaço do céu mostra que provavelmente há um enorme tesouro ainda não descobertos no céu do sul”, pondera Jacinta Delhaize, investigadora responsável pela publicação de 2021. “O MeerKAT é incrivelmente poderoso e está em um local perfeitamente posicionado”.

Como precursor do Square Kilometer Array (SKA), que deve começar a operar no final desta década, o MeerKAT oferece sensibilidade e resolução sem precedentes, permitindo descobertas como o Inkathazo. Espera-se que ele permita aos cientistas achar ainda mais respostas sobre os mistérios que cercam as galáxias de rádio gigantes.

(Por Arthur Almeida)