André Baby – Walter Aguiar
Conhecida carinhosamente como “Cuiabrasa”, a capital do MT recentemente registrou o agosto mais quente nos últimos 62 anos (INMET). Esse marco não é um recorde isolado, mas um alerta estridente de um planeta em crise. O Secretário-Geral da ONU, António Guterres, proclamou que a era do aquecimento global deu lugar à era da fervura global e Cuiabá está vivenciando cada vez mais os impactos dessa mudança.
Segundo o Serviço de Mudanças Climáticas Copérnico e o Centro Europeu de Previsões Meteorológicas a Médio Prazo, as ondas de calor estão se tornando mais frequentes e intensas, sublinhando a necessidade urgente de enfrentar a crise climática.
Atualmente, presenciamos evidências inegáveis da emergência climática: o aumento da temperatura global, o aquecimento e acidificação dos oceanos, a elevação do nível do mar, o recuo de geleiras e a redução da cobertura de neve. O gelo do Ártico diminui e eventos extremos, como incêndios florestais e terremotos, estão se tornando mais frequentes e intensos. Tais transformações são observadas em todo o sistema climático, que engloba a atmosfera, biosfera, oceanos e calotas polares. Vale destacar que ondas de calor resultaram na morte de mais de 60.000 pessoas em 35 países da União Europeia somente no verão de 2022 .
A crise climática não faz distinção, ela impacta tanto as zonas urbanas quanto as rurais, sendo que esta última tem especial relevância em Mato Grosso devido à sua intensa atividade agropecuária. Os efeitos tangíveis da mudança climática já são evidentes em nossa produção agrícola, na qualidade do ar que respiramos e nas altas temperaturas que enfrentamos. Como exemplo, a agricultura brasileira é altamente dependente do regime de chuvas, o que torna as alterações no clima ainda mais preocupantes. A conceituada revista Nature Climate Change apontou que o prejuízo para o agronegócio causado pelas mudanças climáticas ocorre em lavouras com e sem irrigação. Nas lavouras irrigadas de soja, a perda na safra estimada pelos cientistas já chegou a 11 quilos por hectare no Matopiba (Região do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) e a 114 quilos por hectare no Mato Grosso; no cultivo sem irrigação, o prejuízo foi de 5 quilos por hectare no Matopiba e 26 quilos por hectare no MT.O efeito das mudanças climáticas já está sendo sentido no Centro-Oeste e em específico no Cerrado brasileiro, região responsável por metade da produção agrícola brasileira. Cerca de 28% das áreas agricultáveis estão fora do padrão climático ideal para o cultivo de soja e milho, por exemplo, segundo o estudo “O Limite Climático para a Agricultura no Brasil ”.
Em estudo publicado pela UNEMAT, em parceria com outras instituições científicas, no periódico científico Cadernos de Saúde Pública, nos chamou a atenção para qualidade do Ar onde 20 milhões de residentes no Centro-Oeste e Norte são expostos a pelo menos 3 a 4 meses ao ano à má qualidade do Ar.
Para Cuiabá e para todo o MT é tempo de reconhecimento e ação. É imperativo que autoridades públicas, sociedade civil organizada, comunidade científica e setor produtivo unam forças para elaborar estratégias de mitigação e adaptação. Não há mais como separar impactos exclusivos ao campo ou à cidade. O que acontece no campo influencia na qualidade de vida da cidade e vice-versa.
Nos últimos anos, a atividade humana provocou um aquecimento do planeta em uma escala sem precedentes. Dados do INMET destacam que Cuiabá ficou 1,5° mais quente nas últimas décadas e o Planeta Terra variou +/- 0,2°C do ano 0 até 1850; dos anos 1850 a 1950 aumentou 0,5°C; e entre 1950 e 2023 aumentou 0,6°C. Ou seja, de 1850 a 2023 aumentou 1,1°C .
A era da fervura global é mais do que uma mera mudança de terminologia, representa um apelo à ação. Cuiabá e MT estão em posição de liderar a resposta brasileira a essa crise, especificamente a próxima gestão municipal de Cuiabá deve se atentar as mudanças climáticas, suas implicações, promover a mitigação e a adaptação sob pena de termos uma cidade inviável ambientalmente para viver. O momento de agir é agora, visando garantir que as próximas gerações desfrutem de um planeta mais equilibrado, justo e sustentável.
André Baby- Engenheiro Florestal, Especialista em Gestão Ambiental e Mestre em Sustentabilidade e conselheiro do Crea-MT
Walter Aguiar- Engenheiro Eletricista, Especialista em Sustentabilidade e Mestrando em Física Ambiental (UFMT) e Conselheiro do Crea-MT