Ana Carolina Naves Dias Barchet*
Ela chega à IV Conferência Nacional da Mulher Advogada (que agora, após Cíntia Chagas, tenho certeza ser pleonasmo) da Ordem dos Advogados do Brasil realizada em Curitiba – PR pontualmente, vestida de forma elegante e discreta, esbanjando bom humor e simpatia, grava vídeos, conversa, tira fotos e atende a todos os presentes.
Conversando com a Diretoria do Conselho Federal da Ordem sobre os burburinhos de eventuais protestos contra sua presença, é informada de que esses “esfriaram” e que se houvesse algo, acreditava-se que seriam manifestos pequenos e minoritários. O deslocamento para o pavilhão da palestra é feito de carro, com a sua equipe e a mediadora do Conselho Federal.
Ao adentrar o local da palestra uma multidão de advogadas é acometida pelo sentimento de admiração e felicidade de poder viver aquele momento, enquanto uma minoria barulhenta e enfezada a agride verbalmente no intuito de força-la a se retirar do palco.
Vamos aos motivos do ódio: “ah ela disse que mulher que bebe cerveja é deselegante”; “ah ela disse que pintar a unha do pé de francesinha é cafona”; “ah ela disse que a mulher tem que ser submissa ao homem e isso alimenta a violência doméstica”; por último e não menos chocante: “ah ela ganha muito dinheiro com isso”! Problemas com interpretação de texto a parte, a última critica é absurdamente chocante, pois na mente diminuta das pensadoras protestantes não passa sequer a idéia de que a autonomia financeira é o primeiro remédio contra a submissão! Pois é, caros leitores nenhuma crítica era no sentido de que ela não tinha autoridade e conhecimento que a habilitassem a proferir uma palestra sobre comunicação e oratória.
Concluiu a palestra brilhantemente sob aplausos efusivos, vaias, gritos de guerra, pedidos de fotos e ameaça de um banho de cerveja, logo a bebida por ela não apreciada! Saiu do palco escoltada direto para o aeroporto, pois o barulho atrasou o evento fazendo com que tivesse que retornar naquela hora.
Vivi tudo desde o primeiro momento, pois a recepcionei e fui a mediadora do painel, e ao final me questionava sobre a tal sororidade, sempre pensei e falei que era seletiva, e após esse episódio a coloquei no nível de “altamente seletiva”. Ao compartilhar tal pensamento escutei que a sororidade não poderia ser “guarda chuva para o machismo”, o que abriu mais uma questão em minha mente: “não pode ser guarda chuva para machismo, mas pode ser um escudo para repelir e hostilizar mulheres que pensam de forma diferente?”
Nós mulheres temos muito a aprender, talvez a antropologia possa nos dar uma luz! O homem saia com outros homens para caçar, compartilhavam coisas e comida, enquanto a mulher ficava na caverna na defesa do seu território, daí o territorialismo que nos acompanha desde lá, e não nos permite aprimorar a capacidade da partilha, da aceitação da outra, ou melhor do sucesso da outra que pensa de forma diferente, claro.
Nesse cenário onde muito já conquistamos, desejo que um dia sejamos capazes de além de pregar, viver a sonoridade, e que, na casa das liberdades democráticas o gosto estético, o gosto alcoólico, a forma como cada uma conduz um relacionamento e ganha dinheiro não seja desculpa para a hostilidades e agressões. Minha filha Luísa merece essa realidade, todas nós merecemos!
*Ana Carolina Naves Dias Barchet, advogada, Conselheira Federal da OAB pelo Estado de Mato Grosso
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