Formar uma jogadora de futebol nas categorias de base é um verdadeiro desafio. Eventualmente uma menina é proibida de praticar o esporte em alguma competição pelo Brasil. E, desta vez, o episódio aconteceu em São Mateus, Região Norte do Espírito Santo. Nicoly Almeida, 12 anos, devidamente inscrita e relacionada para uma partida da Copa A Gazetinha 2024, disputou um jogo pelo Cepe, equipe da cidade, mas agora está proibida de participar dos próximos jogos da competição.

No dia 16 de março, com Nicoly em campo, o Cepe venceu o Assavac por 5 a 0, em jogo válido pela categoria 12/13. Foi aí que tudo começou. Após ser goleado, o Assavac entrou com o recurso junto à organização da competição alegando que conforme o regulamento não é permitida a participação de meninas na competição.

Os organizadores emitiram um ofício informando que a inscrição e participação de Nicoly eram irregulares e o Cepe seria punido conforme o parágrafo 3° e artigos 35 e 36 – que não tratam da presença de atletas do sexo feminino nos times, mas que penalizam o clube por “uso irregular de atleta”. Assim, o Cepe perdeu os pontos da partida, que foram revertidos para o Assavac e também foram informados da proibição de Nicoly seguir na competição.

Técnico do Cepe, Iran Dias afirmou que só escalou Nicoly na partida porque recebeu o aval da competição.

– No dia 16/03 pedi a listagem dos atletas aptos à disputa e o nome de Nicoly constava entre eles – contou em entrevista ao portal A Gazeta.

Padrasto diz que organização pensou que Nicoly era um menino

Nicoly, jogadora do Cepe — Foto: Arquivo Pessoal

Nicoly, jogadora do Cepe — Foto: Arquivo Pessoal

Para ser inscrita na competição, a família de Nicoly precisou enviar uma foto 3×4 da menina, outra imagem com ela de frente e segurando a certidão de nascimento, além dos documentos pessoais, tudo conforme às regras da competição.

– Os organizadores alegaram que, mesmo com as fotografias e documentações, acharam que Nicoly fosse um menino. Ela lamentou muito ter que sair do campeonato.

O fato é que Nicoly fez a solicitação para ser inscrita, teve sua inscrição deferida, foi relacionada, entrou em campo, disputou a partida e em nenhum momento ela ou o clube foram repreendidos. Só após o apito final e com a reclamação de outra equipe, que os organizadores se movimentaram e optaram por punir o Cepe.

O Outro lado

Nicoly, jogadora do Cepe — Foto: Arquivo Pessoal

Nicoly, jogadora do Cepe — Foto: Arquivo Pessoal

A reportagem conversou com Rodrigo Couto, organizador da Copa A Gazetinha para pedir explicações sobre o ocorrido. Com relação à competição ter deferido a inscrição de Nicoly mesmo com um regulamento que não prevê a participação de meninas, Rodrigo afirmou que a escalação dos atletas é de total responsabilidade dos clubes.

– É uma questão simples. Houve uma inscrição irregular. O time adversário recorreu e foi aplicada a regra do artigo 35 do regulamento. O clube e seus representantes são responsáveis pela escalação dos atletas. Não cabe à Coordenação Geral, buscar ou tentar provar irregularidade em qualquer associação, salvo o perfeito conhecimento da causa – declarou.

De forma geral em relação à participação de meninas na competição, Rodrigo preferiu enviar seu posicionamento em forma de nota oficial, onde também relata que no caso específico de Nicoly “os dirigentes das equipes foram didaticamente informados antes do início da competição que a Copa A Gazetinha 2024 não é de futebol misto. Mesmo assim, alguns dirigentes colocaram em campo atletas de forma irregular, mesmo sabendo que a Copa A Gazetinha 2024 não é de futebol misto”.

Confira abaixo a nota oficial na íntegra

A direção da Copa A Gazetinha esclarece alguns pontos em relação à participação feminina na competição, evento que valoriza e promove a inclusão de todas as crianças, adolescentes e jovens no esporte.

Ao longo dos seus 46 anos de história, a Copa A Gazetinha nunca discriminou a participação do sexo feminino no futebol. Pelo contrário, sempre incentivou e apoiou o desenvolvimento do futebol feminino, inclusive com a realização da Copa A Gazetinha Feminina.

É importante destacar que, embora a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) tenha liberado o futebol misto nas categorias de base no ano passado, essa medida não é obrigatória e cabe a cada organização decidir se irá implementá-la ou não, de acordo com seu perfil e suas particularidades.

Além disso, Regulamento definido e divulgado antes do início da competição 2024 não prevê, em nenhum momento, a inscrição de times mistos, como corrobora parecer do nosso departamento jurídico.

No caso da Copa A Gazetinha, o atual modelo de disputa da competição não nos permite, neste momento, implantar a disputa por equipes mistas devido a diversas implicações organizacionais e estruturais que precisam ser cuidadosamente analisadas e planejadas.

E em função da dimensão da Copa A Gazetinha, que envolve mais de 160 times do Espírito Santo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia, tendo o ápice a realização das Finais Gerais, durante uma semana numa cidade-sede, onde há toda uma estrutura e logística de alojamento e acolhimento dos jogadores, a direção do evento se compromete a planejar, com antecedência, estruturas necessárias para garantir a segurança e o bem-estar de todos os envolvidos, principalmente com a inclusão das jogadoras menores de idade, com o regimento atualizado face às modificações sugeridas pela CBF.

Entendemos a importância de proteger a participação das meninas e estamos comprometidos em estudar esta questão do futebol misto da melhor forma possível, sempre priorizando a segurança e a formação no desenvolvimento adequado das crianças atletas.

É importante ressaltar que, a partir de agosto, teremos a Copa A Gazetinha Feminina, onde todas as meninas terão o estímulo e a estrutura necessária para participar plenamente da Copa A Gazetinha. Incentivamos a todas as equipes de base a manter as suas equipes femininas para disputar a Copa A Gazetinha. Assim, vamos fortalecer ainda mais as meninas no futebol, em evolução constante.

No caso específico, esclarecemos que não houve “DESCLASSIFICAÇÃO” de nenhuma atleta. O que houve foi a inscrição irregular de atleta mista, que não está previsto no regulamento. Os dirigentes das equipes foram didaticamente informados antes do início da competição de que a Copa A Gazetinha 2024 não é de futebol misto.

Mesmo assim, alguns dirigentes, colocaram em campo atletas, de forma irregular, mesmo sabendo que a Copa A Gazetinha 2024 não é de futebol misto. Por fim, reforçamos os nossos compromissos com todos os atletas, indiscriminadamente, cumprindo a nossa missão de revelar atletas para o futebol brasileiro e mundial, e unir as famílias por meio do futebol. (GE)