Josh Wander, sócio-fundador da 777 Partners, não acreditaria se alguém lhe contasse, vinte anos atrás, que ele administraria clubes de futebol pelo mundo. Para começar porque, bem, sua paixão não era exatamente o “soccer” – jeito peculiar que americanos usam para denominar o esporte mais popular do planeta. Ele preferia o futebol de bola oval – era presença constante nos jogos do Miami Dolphins.
Hoje, o investidor está à frente de uma multinacional ainda em formação. Na Itália, a 777 é proprietária do Genoa. Na Espanha, a empresa possui uma participação de 15% sobre o Sevilla. E agora, no Brasil, o grupo avança para comprar o controle do clube-empresa que o Vasco abrirá.
Na tarde desta terça-feira, um dia após assinar pré-acordo com o presidente vascaíno, Jorge Salgado, Josh concedeu sua primeira entrevista a um veículo brasileiro. O investidor conversou com o ge, de dentro de seu escritório, em um arranha-céu de Miami, por cerca de 40 minutos.
A intenção da 777 é tornar o Vasco uma superpotência global. Global, aliás, é uma palavra que ele repete com frequência. Tanto para se referir ao clube carioca, quanto para tratar de uma futura liga de clubes do futebol brasileiro. Esses aspectos são essenciais para que a companhia obtenha o retorno que espera sobre o investimento.
– Primeiramente, obrigado por falar conosco. Minha primeira pergunta é: como você escolheu o Vasco para investir? O que te interessou no Vasco?
– Para começar, quero dizer como estamos incrivelmente empolgados de fazer parte do Vasco da Gama e sua rica história. Sou um fã de esportes desde que nasci e mais recentemente me tornei um grande fã de “soccer”, ou football, como é chamado em algumas partes do mundo. O entusiasmo dos torcedores brasileiros, a história do futebol no Brasil me empolga pessoalmente como fã. A possibilidade de ver o futebol ser jogado onde ele foi feito para ser jogado.
– Sobre o Vasco, eu acho que, como em todo investimento que analisamos, estamos procurando fatores que nos façam acreditar que haverá valorização desse ativo ao longo do tempo. O Vasco está na segunda maior cidade do Brasil, no quinto maior país do mundo. Há uma população enorme, que podemos comercializar. Nossa visão é que, antes de tudo, queremos comprar clubes que achamos que tenham cenários econômicos que fazem sentido. Que possam ser bem-sucedidos comercialmente, dentro do possível. Ter uma população grande, em países com uma rica história no futebol, tradição, com uma grande conexão com seus torcedores, é muito importante para nós.
– Antes de tudo, nós observamos o Vasco como um clube histórico, que está numa cidade muito populosa. Antes de entrar em mais detalhes, achamos que essa é uma oportunidade muito interessante, num país com grande crescimento populacional, numa indústria que nos últimos anos viveu problemas por causa da Covid.
– A mudança da lei no Brasil permitiu a entrada de investidores estrangeiros. Investir num clube histórico é empolgante para nós. Quando você começa a entrar em detalhes, você percebe que o Vasco tem uma história incrível de derrubar barreiras sociais e raciais. 25 anos antes de o Jackie Robinson se tornar o primeiro negro na Major League Baseball e da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, o Vasco já era um defensor destemido dos direitos humanos, da diversidade e da inclusão. Isso nos empolga, queremos nos envolver em negócios nos quais possamos ir bem e fazer o bem. E o Vasco claramente está na vanguarda dessa área nos esportes. O componente ESG (sigla em inglês para ambiental, social e governança) nos animou. E queremos continuar essa tradição no Vasco.
– Como terceiro ponto, nós acreditamos que o Brasil, e o Rio em particular, é um dos melhores, se não o melhor, local do mundo de captação de talentos futebolísticos. A possibilidade de ter acesso a esse talento, de ajudar a cultivá-lo e finalmente de vê-lo florescer no Vasco ou em outros clubes pelo mundo é animadora. Adoramos a ideia de trabalhar com pessoas que sejam as mais talentosas no que elas fazem, e a base de talentos no Brasil é animadora para a 777.
– Quando vocês estavam considerando as possibilidades no Brasil, analisando o mercado, vocês consideraram outro clube sem ser o Vasco? Como foi o processo para encontrar o clube?
– Nós analisamos o mercado, claro, como faríamos em qualquer negócio, e olhamos quais eram as opções. Não havia tantas opções ainda, porque, para ser uma opção, o clube tem que tomar a decisão de virar SAF. Olhamos alguns clubes antes do Vasco, mas acho que chegamos ao Vasco pelas razões que eu acabei de descrever. Acho que a razão principal, o diferencial na nossa perspectiva, foi a história, a tradição, o legado que o Vasco tem não só dentro do campo, mas também fora.
– A principal pergunta entre torcedores do Vasco nas últimas 24 horas é: que grupo é esse? Quem são essas pessoas? Eles querem saber mais sobre a 777. E, sabendo que as pessoas normalmente não conhecem a área de equity, gostaria que você explicasse o modelo de negócios.
– 777 é uma holding global que atua em seis áreas: consumo e comércio; seguros; aviação; empréstimos; finanças de litígio; esportes, mídia e entretenimento. Em cada uma dessas áreas, 777 tem diversas empresas no portfólio em diferentes lugares do mundo. Mas a ideia principal da estrutura de holding e da nossa habilidade de investir no longo prazo é que, dentro do possível, todos os nossos negócios vão criar valor para outros negócios. Nós somos capazes de criar eficiências dentro do nosso ecossistema para todos os negócios, assim eles podem se beneficiar dos recursos que a 777 tem como uma holding.
– A função principal do que a 777 faz é consolidar algumas das partes mais rotineiras dos negócios de todas as empresas que temos no portfólio, através do nosso ecossistema. Fazendo isso, nós criamos eficiências de custo, operacionais, potencial compartilhamento de dados, a possibilidade de utilizar recursos de um negócio num local distante do mundo no seu negócio, porque está no mesmo ecossistema.
– Na 777, nós estamos construindo essa estratégia de comprar diferentes clubes, que vamos chamar de 777 Football Group. O 777 Football Group vai se concentrar em mercados-chave, com tradições ricas e profundas, verdadeiras identidades de marca, conexões com bases de torcedores que consideramos que fazem sentido. Nós vamos desenvolver talentos, vamos desenvolver fortes categorias de base, empregar análises inovadoras de dados do futebol para nos ajudar a tomar decisões. Vamos integrar operações de forma parecida com a que fazemos na holding 777 e tentar contratar os melhores gestores para administrar esses negócios.
– Não é tão diferente do que fazemos na nossa holding, a diferença é que se concentra em clubes de futebol. Acreditamos que há real valor e que poderemos criar eficiências nesses clubes. Enquanto isso, ao administrar o clube, devemos garantir que ele possa ter o maior sucesso possível no seu ambiente atual. O objetivo vai ser sempre, para todos os clubes, o de vencer. Mas vencer dentro do contexto do seu orçamento e da sua liga. Nossa esperança é que todos esses clubes se tornem muito bem-sucedidos.
– Sim, certamente. O Vasco é fundamental nesse sistema. Vasco será o centro da nossa operação na América Latina. Na nossa visão, é uma joia da coroa no mundo do futebol, e deve ser tratado assim. Nosso objetivo é fazer tudo que estiver ao nosso alcance para garantir que o Vasco possa retomar o seu domínio no lado esportivo. Para fazer isso, nós vamos nos concentrar, com nossos outros clubes, no recrutamento, no scouting, no desenvolvimento da performance dos jogadores. Criar eficiências no negócio que tornem o negócio sustentável daqui para frente. Para que o Vasco possa se perpetuar pelos próximos 100 ou 200 anos, através da estrutura, a infraestrutura de sustentabilidade financeira que será implementada.
– E aí, claro, todos os benefícios desse grande ecossistema do 777 Football Group, no qual provavelmente teremos maior poder de barganha, teremos economia de escala, poderemos usar recursos de outros clubes para o Vasco e vice-versa. O tempo todo tentando defender o espírito do esporte, garantindo que todos os clubes, no seu direito, possam ter o maior sucesso possível.
– Você falou que o Vasco vai ser a joia da coroa no mercado sul-americano. Nós lemos na imprensa francesa notícias sobre o interesse de vocês em comprar o Saint-Étienne. Vocês têm planos de comprar outros clubes fora o Vasco? E qual é a estratégia global de vocês?
– Para vocês saberem, a notícia sobre o Saint-Étienne foi novidade para mim também. Nunca falamos com ninguém sobre o Saint-Étienne ou analisamos o clube. No mundo do futebol em particular, rumores tendem a se espalhar mais rápido por causa da paixão relacionada ao esporte. A resposta é sim, nós certamente temos interesse em comprar outros clubes pelo mundo. Estamos analisando outros clubes.
– Em quais países?
– Alguns países na Europa. Nos próximos meses e anos, nós estaremos muito ativos no mercado mundial do futebol. Quanto mais ativos nós estivermos, melhor será para nossos acionistas e para os clubes, os torcedores, os atletas desses times que nós compramos ou dos quais fazemos parte.
– Nosso objetivo é construir valor através da combinação desses clubes. Da mesma forma que o nosso objetivo é construir valor através da combinação e do compartilhamento de recursos nos nossos negócios em geral na 777. Talvez uma companhia aérea que use a tecnologia do nosso negócio de empréstimos para financiar passagens aéreas. Ou uma empresa de leasing que faça o leasing de um avião para a companhia aérea. Ou a possibilidade de usar um modelo de dados que um de nossos clubes tenha criado para avaliar talentos e procurar talentos.
– Dentro de multinacionais do futebol, nós temos alguns grupos, não todos, que usam alguns clubes como satélites de outros. Podemos citar o exemplo do City Football Group. O Manchester City é a joia da coroa e usa outros clubes como satélites. Alguns torcedores do Vasco têm essa preocupação. Você acha que eles têm razão para se preocupar que em algum momento do futuro, quando a 777 tiver outros clubes, o Vasco pode ser satélite de um clube da Europa, por exemplo?
– Nós ouvimos isso como um dos problemas das multinacionais do futebol. Nossa visão de ter vários clubes é bem simples. Nós precisamos construir cada clube para ter o maior sucesso possível no lado esportivo. Todo clube terá que tomar decisões difíceis sobre seu talento, sobre seu negócio em algum momento. Como toda empresa faz. Quando você tem que tomar essa decisão, você toma essa decisão baseado no benefício econômico, na viabilidade de longo prazo do seu negócio e, claro, no custo de curto prazo. Então nós acreditamos que essas decisões terão que ser tomadas ao longo do tempo. Essas decisões terão que ser tomadas em clubes maiores e em clubes menores.
– Nosso objetivo é tornar o Vasco a superpotência global que acreditamos que ele pode ser, por causa da sua história, da sua tradição e dos talentos que existem no Brasil. À medida que o Brasil evoluir como país, que o Rio evoluir como cidade, que as pessoas em torno desses clubes e no país prosperarem, nós acreditamos que o Campeonato Brasileiro terá a capacidade nos próximos anos de ser um dos principais campeonatos do mundo. Quando isso acontecer, nossa esperança é que nós possamos contratar jogadores de outros países pelo mundo, não vice-versa.
– Então é realmente importante, dentro do contexto da estratégia de ter vários clubes, que você olhe pela lente do esporte competitivo e do espírito de competição. O espírito de competição significa que você faz tudo que estiver ao seu alcance para garantir que seu clube vença. E isso eu posso prometer aos torcedores do Vasco que nós vamos fazer.
– Vocês acabaram de anunciar um investimento de R$ 700 milhões no Vasco, nessa companhia que está sendo criada. Como você planeja usar esse dinheiro? Em infraestrutura, jogadores…
– E, claro, ajudar a expandir o alcance do clube internacionalmente. A habilidade de ajudar a comercializar e contextualizar o negócio no século 21 de uma perspectiva de conteúdo. Ajudar jogadores e o clube a construir bases de seguidores pelo mundo. Todas essas coisas precisam de tempo, dinheiro e recursos. Nós pretendemos observar todos os aspectos do negócio e tentar fazer tudo que pudermos, com os recursos que temos na 777, para ajudar.
Wander diz que 777 vai analisar possível reforma de São Januário — Foto: Thiago Ribeiro/AGIF
– Você acabou de falar de instalações. O Vasco tem um estádio histórico, de 95 anos de idade. Quais são seus planos para o estádio? E também instalações de base, de centro de treinamento para o time principal. Quais são seus planos para instalações no estádio e nos centros de treinamento?
– Veja, está cedo, nós vamos avaliar todas as instalações enquanto avançamos nos próximos meses para tentar determinar do que elas precisam, se precisam de alguma coisa. Mas, é claro, nós não queremos fazer nada para tirar o Vasco do estádio no qual ele joga há 100 anos. Nós acreditamos nisso. Como parte da nossa transação, nós concordamos com a associação em jogar nesse estádio pelo tempo que quisermos. Não temos visões de curto prazo do que devemos ou não fazer com a instalação principal, que é o estádio. Nós queremos estar lá, é onde a história foi criada, para nós é importante preservar isso. Nós vamos analisar os centros de treinamento, tentar ver o que podemos fazer para ajudar no que for necessário. Mas agora o foco é atravessar os próximos três meses e chegar a um ponto em que a 777 esteja pronto para finalizar nosso investimento. E aí vamos levar o nosso time com o escopo completo de recursos que podemos oferecer.
– A parte do estádio é muito importante. Quando você analisa o negócio do futebol atualmente, é fundamental que você tenha camarotes, muitos lugares, um estádio moderno para trazer os torcedores para perto do clube. Vocês têm planos para uma reforma completa de São Januário?
– Nós iniciamos esse tipo de projeto nos nossos outros clubes. E é claro que queremos fazer tudo que estiver ao nosso alcance para garantir que o clube e o negócio do clube sejam sustentáveis no longo prazo. Para fazer isso, você analisa coisas como reforma do estádio, para garantir que ele crie a lucratividade que permite ao clube existir no longo prazo. Então isso é algo que vamos analisar, mas não é o foco do que vamos fazer nos próximos meses. O foco do que vamos fazer nos próximos meses é garantir que nós finalizemos o negócio e nós avancemos para construir o negócio e o clube com nossos sócios no Brasil e os torcedores do Vasco.
– Sobre a sua operação no Brasil, você planeja contratar alguém para ser seu representante? Como um CEO da estrutura sul-americana… Como vocês serão representados no mercado sul-americano?
– É provável que tenhamos pessoas no dia a dia no Brasil, como nós fazemos com todos os investimentos em qualquer parte do mundo. Não sei qual seria o nome do cargo e tenho certeza de que seria mais de uma pessoa. Tenho certeza de que não será difícil convencer alguns caras do escritório a ir para o Brasil. Acho que todo mundo vê o Rio como uma linda cidade e adoraria passar um tempo lá. É certo dizer que muitos de nós na 777 vamos passar um tempo no Brasil nos próximos anos. Estou empolgado para levar minha esposa e minha filha e mostrar a elas a bela cidade que sedia o clube que nós compramos. E pretendemos estar nele por um longo tempo.
– Você falou sobre os próximos 90 dias. O Vasco tem a tarefa de aprovar a venda, a tarefa política. Quero saber qual é a principal tarefa de vocês, a principal tarefa da 777 nos próximos 90 dias. O que vocês vão fazer para conhecer melhor o Vasco? Ainda no curto prazo, vocês têm objetivos para o primeiro ano? Para o segundo ano? Objetivos esportivos, objetivos competitivos.
– Deixa eu responder antes à primeira pergunta. A primeira é basicamente uma diligência de confirmação. Nos próximos três meses, nós vamos confirmar muitas coisas que falamos e discutimos com os diretores do Vasco, com o presidente e com representantes nos últimos meses. Nós passamos muito tempo com eles nos últimos meses, realmente entendendo o negócio, suas partes positivas, suas partes negativas. Nos próximos 90 dias, nós vamos confirmar tudo isso. Isso significa ir para o Brasil, passar muito tempo no clube, trabalhar com o time lá.
– Assim que finalizarmos isso, e estamos muito confiantes de que isso vai acontecer, assim que finalizarmos isso, nós vamos nos concentrar no futuro do Vasco. E o futuro mais imediato é subir de divisão. Nossa esperança é que possamos subir nesta temporada e depois perpetuar isso por um longo tempo. Nós acreditamos que o Vasco é um dos maiores e mais históricos clubes do mundo. Acreditamos que ele pertence à Primeira Divisão. E nossa esperança é ficar nela e tentar levar o Vasco de volta a ser uma potência global do futebol.
Josh Wander diz: “O Vasco será o centro da nossa operação na América Latina, é uma joia da coroa”
– Hoje os torcedores estão preocupados com a venda do clube. E, também, a política no Vasco é “incrível”, vocês vão descobrir. A parte política é muito difícil. Então a principal pergunta agora é: por que o Vasco deveria ser vendido para a 777? E, se você estiver falando com o torcedor do Vasco e também com o associado, o que você diria a eles para que eles aprovem essa venda?
– Eu diria: acreditem em nós. Nós temos o melhor interesse para o Vasco e para os torcedores, de coração. Nós temos toda intenção de construir no Vasco uma potência de futebol global, que um dia já foi. Enquanto preservamos toda a história e as tradições, tanto dentro de campo quanto fora de campo. A ideia de fazer as coisas de um jeito social, que ajude a promover inclusão e diversidade, a quebrar barreiras raciais, isso é realmente importante para nós. É muito importante em outros negócios com esportes em que estamos focados. Tem sido assim na liga de basquete no Reino Unido, nos London Lions, um time de basquete. Nós estamos concentrados em esforços assim no mundo, socialmente, então esse tópico no Vasco é realmente importante.
– Eu acho que construir uma comunidade no Rio e no entorno do Vasco é realmente importante para nós, então estamos comprometidos em gastar dinheiro para a base, gastar dinheiro para ajudar a escola, a associação, outras áreas, esforços olímpicos e paralímpicos. Nós vamos ter o mesmo compromisso em todas as áreas em que estivemos no mundo. Em última instância, esses compromissos vão se consolidar, e esses clubes pelo mundo, que fazem parte da família 777 no futebol, vão se beneficiar dessa consolidação e estarão em vantagem nos recursos, não apenas no campo de futebol, também na comunidade. Nós acreditamos que o que estamos criando será melhor do que apenas um clube, que todo mundo vai se beneficiar de estar sob o mesmo guarda-chuva, seja na redução de custos, ou no melhor desenvolvimento de jogadores, ou simplesmente por prestar um serviço melhor à comunidade. Nós vamos aprender uns com os outros, e isso é realmente importante.
– O Vasco tem uma dívida enorme, 700 milhões de reais. Isso não assusta vocês? Como vocês planejam pagar essa dívida? Também gostaria de saber sobre novos modos de aumentar a receita. Pagar a dívida e aumentar a receita.
– 700 milhões é um número grande, mas a resposta, você sabe… Não nos assusta no contexto do negócio, considerando os próximos 40 ou 50 anos. Nós somos investidores de longo prazo. Não somos investidores de curto prazo. Nós olhamos para isso como um negócio de 30 anos, não de dois ou três, então temos que pensar no que vamos fazer para construir o lado das receitas do negócio, que possa ajudar a pagar a dívida e por último acabar com ela. Nós fizemos um compromisso de nos livrarmos de parte da dívida, ao completar nosso investimento, e nós vamos trabalhar para negociar com a parte restante. Mas esse não é nosso foco. Nosso foco é construir o lado das receitas do negócio, que é a segunda parte da sua pergunta. E eu acho que isso vem, realmente, com a melhora de todas as funções do negócio no Vasco.
– Nós vamos aprender mais sobre isso nos próximos dois ou três meses, mas isso começa com funções básicas, como contabilidade, operações, e passa para questões mais complexas, como jogadores, avaliação, desenvolvimento, seleção e transferências de atletas. E, com certeza, construir a marca do Vasco globalmente. Então, a possibilidade de ter torcedores do Vasco em todo o mundo, que não são necessariamente do Brasil, mas que vejam a marca que todos nós sabemos que é reconhecida como uma das melhores do mundo. Nós achamos que isso é atraente não só para torcedores no Brasil, mas pelo mundo. Essa exposição global vai ajudar o clube, e a liga, a desenvolver um modelo com maiores receitas.
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– E, então, conectar com os fãs localmente. Conectar com eles localmente deveria ser a fundação de quase todo clube no mundo, e a habilidade de se conectar com esses fãs e fazer isso de um jeito que seja muito mais progressista do que existe na maioria dos clubes pelo mundo. E isso significa conhecer esses fãs e onde eles estão, seja na rede social, ou em portais online. É importante, nós achamos, encontrar esses torcedores onde eles estão vivendo, e eles estão vivendo essencialmente no celular. Então, a habilidade para modernizar a infraestrutura no entorno de novas conexões com os fãs, eu acredito que seja importante. A ferramenta para em última instância alcançar receitas maiores.
– Hoje no Brasil nós temos alguns investidores entrando, podemos citar John Textor no Botafogo, Ronaldo no Cruzeiro e também a Red Bull, que comprou um clube antes. Qual foi o peso desses outros investimentos na sua decisão? Digo: suponho que uma coisa seja quando você é o único investidor chegando a um país como o Brasil, um país em que todos os clubes são associações, e outra coisa é você chegar a um país que está recebendo outros investidores.
– É. Eu não vou dizer que impactou nossa decisão. Eu acho que todos nós estamos olhando para esses clubes ao mesmo tempo, então não tenho certeza de que tomamos essa decisão porque eles tomaram, ou vice-versa. O que eu acho é que o investimento estrangeiro nessa incrível ferramenta, para ajudar a liga do futebol brasileiro a se desenvolver e progredir… Quanto mais donos estrangeiros chegarem, quanto mais capital as pessoas puderem prover para esses times, melhor será o que o time será do ponto de vista de governança, futebol, marketing e promoção. E isso permite não só os times, mas a liga a receber o tipo de notoriedade global que, em última instância, vai trazer mais capital para ela. Essa tem sido nossa visão, não apenas no Brasil, mas nas ligas no entorno do mundo.
– Quando você tem bons donos, que têm boas intenções, que querem o melhor para o clube, querem desenvolvê-lo, fazê-lo progredir e modernizar, e fazer coisas para o melhor pelo clube e pelos fãs, isso é muito bom para o esporte e seus agentes. Esse tem sido nosso interesse. Nós damos as boas-vindas a mais proprietários internacionais a entrar para a liga. Acreditamos que a marca do futebol brasileiro é excitante, é historicamente uma das melhores, se não a melhor, marcas de futebol do mundo. E nós achamos que ela merece estar em linha com o que outras ligas no mundo têm. Então, não pode haver um lado ruim em ter mais capital chegando e dando apoio a essas ligas do jeito certo.
– Você usou a palavra “global” algumas vezes. E ao mesmo tempo sabemos que o futebol brasileiro não tem uma liga, não tem um produto internacional. Digo: quase ninguém sabe sobre o Campeonato Brasileiro fora do Brasil. Eu posso estar me antecipando um pouco, mas quais são seus pensamentos sobre a liga? Nós precisamos de uma liga?
Absolutamente. Absolutamente.
– Indo para a Itália, vocês estão no Genoa há alguns meses, e os resultados ainda não apareceram. É o primeiro clube de futebol em que vocês estão no comando. Quando você chega a um clube, como é o caso do Vasco, como você recruta pessoas para gerir o clube? Não o treinador, necessariamente. Para administrar um clube de futebol, como você recruta pessoas para fazer isso?
– Nós temos recrutado nos últimos dois anos, conhecendo pessoas, desenvolvendo relações pelo mundo no futebol, e acho que é seguro dizer que nós temos uma fundação sólida entre pessoas que nos ajudam a gerir clubes de futebol individualmente e também uma multinacional. O grupo 777 foi construído com um time de gestão que administra clubes no mais alto nível, administradores independentes, obviamente, em cada clube, em cada jurisdição geográfica. A respeito da Itália, nós estamos na Itália há vários meses e, apesar dos resultados dos primeiros meses, eu não acho que poderíamos estar mais felizes com o progresso do negócio, com o progresso do time.
– Claro que é possível que, quando você compra um clube de futebol, você seja rebaixado e os resultados não sejam os que você espera. Mas esse não é exatamente nosso foco. Nosso foco é o projeto de longo prazo, construir o clube para ser sustentável na Série A pelos muitos anos que vêm pela frente. Nos últimos meses, além do capital que providenciamos para o negócio, nós mudamos a gestão, mudamos a estratégia, buscamos novas táticas, construímos as peças fundamentais do negócio, que não existiam antes, e esses blocos de construção vão nos ajudar no clube de futebol, na base de fãs, nos anos pela frente. O negócio estará em uma posição em que conseguirá se sustentar sem capital adicional, e isso é realmente o mais importante. Construir um modelo de negócio sustentável, no qual o time possa vencer. É isso, precisamente, que gostaríamos de fazer no Brasil.
Josh Wander com a bandeira do Genoa antes de jogo do clube — Foto: Getty Images
– Nós vimos na última janela de transferências o Genoa contratando basicamente jogadores jovens. O mais velho tinha 25 anos. Isso é uma estratégia do grupo ou só algo do Genoa, porque o elenco era mais velho?
– Veja, o Genoa tinha um elenco envelhecido, então era importante para nós reduzir a idade do elenco. Nós achamos que isso era crítico para o valor dos jogadores e para o desenvolvimento. Falando genericamente, a resposta é que nós gostamos da ideia de construir por meio da juventude, e não apenas no time principal, na base também. Vai ser importante para nós criar estruturas de base fortes no Vasco e em todos os clubes que temos. O desenvolvimento de jogadores, particularmente o local, deveria ser uma marca de todos esses clubes, em particular daqueles que estão em áreas de captação no mundo. Isso é absolutamente parte da nossa tese. Desenvolver a base é realmente importante, é também substancialmente mais barato.
– Quando olhamos para seus negócios no exterior, no futebol europeu, vemos o Sevilla. E no Sevilla vocês tiveram problemas com os sócios. Você pode explicar um pouco qual foi o problema e a situação lá?
– O Sevilla é uma situação infeliz. Nós temos 15% do Sevilla, quase 15% do Sevilla, e gostaríamos de ser donos de mais. Nós achamos que é um clube incrível, com uma história incrível, e nós estávamos realmente animados em estar envolvidos lá. Infelizmente, ao longo dos últimos anos, houve sócios do clube que inicialmente nos deram as boas-vindas, e de repente mudaram de ideia. Por causa disso, eles colocaram narrativas falsas sobre quem somos, no que estamos interessados. A realidade é que, o que acontece agora no Sevilla não é bom para o clube nem para os torcedores. Nós queremos o que for melhor para o clube e os fãs. Na medida em que poderíamos ter adquirido mais do Sevilla, e em última instância chegar ao ponto em que poderíamos ajudar, do jeito que poderemos ajudar o Vasco, assim como ajudamos o Genoa, isso seria ótimo. Mas agora estamos travados em um limbo.
– Vi na imprensa espanhola que vocês são chamados “the americans”, “los americanos”. Quais são as narrativas falsas que surgiram e o que vocês têm a dizer sobre elas?
– Eu não tenho certeza se faz sentido entrar nisso. Sendo transparente, estamos em litígio lá há alguns anos. O mais importante a dizer é que nós queríamos muito ser parte do Sevilla, nós queríamos nos conectarmos com o clube e os torcedores, nós tentamos fazer isso por três anos. Inicialmente, o cara que nos colocou para dentro, para fazer isso e para ajudá-lo, da noite para o dia decidiu que não queria mais (refere-se ao presidente José Castro). Ele tomou decisões naquele momento que refletiram isso. Mas nós estamos muito interessados em ser parte do Sevilla, e espero que um dia isso funcione.
– De novo me antecipando um pouco, vocês são uma empresa que investe em equity. Quero dizer, vocês pegam uma companhia, investem, compram uma parte minoritária ou majoritária, melhoram a administração, dão valor para essa companhia e um dia vocês vão vender essa empresa, porque na verdade é o seu negócio. Quando se fala do Vasco, isso pode acontecer. E você já nos falou sobre a visão de longo prazo. O que é longo prazo? Vocês pretendem revender o Vasco para outro dono em cinco anos? Dez anos? 50 anos?
– A 777 é uma companhia multinacional, não é um fundo. Nós não temos terceiros como financiadores, que requerem que vendamos algo em um período específico. Somos apenas eu e meu sócio, Steven Pasko, e nós temos um olhar de longo prazo para todos os investimentos que fazemos. Então não compramos um negócio pra vendê-lo. Você está certo que o propósito do nosso negócio é ter lucro, e algumas vezes para ter lucro você tem que vender alguma coisa, mas isso não significa que vamos vender. Só significa que, com o tempo, se alguma coisa for boa, é possível que venda, ou que gere lucro por meio de dividendos.
– Acho que o mais importante a saber é que nós queremos construir o máximo de valor que for possível no Vasco. E, se em algum momento alguém aparecer e nos oferecer algo que a gente ache que faz sentido, ou que é maior do que o valor que estimamos, é claro que vamos conversar. Seria desonesto dizer que, se alguém nos oferecesse uma quantia maluca de dinheiro por algo que nós possuímos, que não venderíamos, porque esse é o propósito do que fazemos. Mas esse não é nosso plano. Nosso plano é comprar um negócio e dar o máximo de valor a esse negócio enquanto formos os donos. É isso que pretendemos fazer e eu te diria que, ao longo dos últimos seis anos, a 777 está em negócios e ainda não vendemos nenhum. Nós temos cerca de 50 deles. Nós não queremos vender num futuro próximo.
– É seguro dizer que vocês acreditam que o Vasco possa gerar lucros sem que vocês precisem vendê-lo?
– Sim. Nosso objetivo é construir um negócio que possa gerar lucros. E esse deveria ser o objetivo de qualquer negócio. Só recentemente que o valor de clubes de futebol pelo mundo, relativamente, se valorizou do jeito que valorizaram. Todos os negócios buscam lucro, e essa seria nossa meta no Vasco.
– Eu queria terminar com uma pergunta engraçada. Quando olhamos para seu acordo, vocês são a 777, vocês estão investindo 700 milhões de reais, vocês estão comprando 70% da companhia. Vocês consideraram investir 777 milhões no Vasco?
– Nós consideramos. Mas era mais alto do que o preço que estávamos dispostos a pagar. [risos]
– Você tem ouvido os fãs do Vasco nas redes sociais? Qual é o sentimento nas últimas 24 horas?
– Tem sido incrível, na verdade. Eu acho que, quando você faz uma grande aquisição, você fica ansioso, nervoso, seja um clube de futebol ou uma empresa de seguros, para encontrar os funcionários, entender como os envolvidos se sentem em relação a você. Eu acho que todos no nosso escritório ficaram felizes e animados ao ver a resposta nas redes sociais. A imprensa. Nós estamos realmente animados por ficarmos próximos dos torcedores do Vasco, do time do Vasco, seus funcionários e agentes. Nós queremos saber mais sobre a história, imergir no clube.
– Posso dizer que vou passar muito tempo no Brasil, estou animado para conhecer os torcedores. Esse é um grande acordo para nós. Essas coisas podem ficar um pouco mundanas, conforme você continuamente compra negócios, neste caso clubes de futebol, mas a realidade é que nós temos a responsabilidade de preservar e promover um dos legados mais ricos de todo o esporte. Esse legado, como eu tenho dito sempre, não apenas está no campo, está fora do campo. Na história do Vasco, de quebrar barreiras sociais. Então é uma responsabilidade que levamos muito a sério, e é uma responsabilidade que estamos animados para seguir adiante.
– Você tem uma mensagem final para os torcedores do Vasco?
Acreditem em nós. Acreditem em nós. (GE)