Há 17 anos, Flaviane Ramalho dos Santos se dedica à advocacia em Mato Grosso. Com pós-graduação em Direito Agrário e Previdenciário, ela atua, em Sapezal, na área do agronegócio e no Direito Agrário. Trilhar esse caminho não foi nada fácil, mas os desafios nunca a abateram ou intimidaram. Pelo contrário. Destemida, apaixonada por Direito Agrário, agronegócio, escotismo e esportes, Dra. Flaviane traz valores aprendidos como escoteira e ao longo de sua trajetória ampliou ainda mais esses ensinamentos.

A advogada destaca que, no Brasil o agronegócio é essencial para nossa economia, uma vez que representa cerca de 27,4% do PIB[1] nacional. “Em Mato Grosso o agro é muito mais essencial para economia, pois representa mais de 50% do PIB[2]. A agricultura é importante e essencial na vida de todos e trata de interesse homogêneo e coletivo resguardado pela Constituição Federal do Brasil. Além disso, a agricultura é alicerce para existência dos povos, é basilar para alimentar as pessoas e erradicar a fome no mundo, sobretudo, para fortalecimento da economia”, ressalta.

Para falar um pouco mais sobre esse assunto, Doutora Flaviane Ramalho nos concedeu uma entrevista, na qual também fala sobre as mulheres no agronegócio, Direito Agrário, escotismo e outras questões.

CUIABANO NEWS –   Como a senhora avalia, atualmente, o papel das mulheres no Direito Agrário e no agronegócio?

FLAVIANE  RAMALHO –  No Brasil Colônia (1500 a 1820) apenas uma minúscula parcela da sociedade possuía direitos e deveres. Mesmo as mulheres livres eram marginalizadas de todo o processo político e econômico da sociedade. A mulher nessa época era submetida à dominação do homem, que centralizava o poder para si. Além disso, enquanto a mulher branca apenas estava destinada ao trabalho doméstico familiar e deveria ser submissa aos seus pais e marido, em contrapartida, a mulher negra servia de mão de obra escrava doméstica, nos campos e nas lavouras. Durante o Brasil Império, de 1822 a 1889, tivemos a promulgação da nossa primeira Carta Magna, a Constituição de 1824. No entanto, nenhum direito foi mencionado em relação às mulheres. Mesmo com a Proclamação da República as mulheres continuavam esquecidas na legislação. Apesar disso, com o início de industrialização, as mulheres passaram a ingressar no mercado de trabalho no Brasil e a ocupar espaços que jamais tinham ocupado antes. Um avanço foi em 1932 com a legislação nacional consagrando o direito ao voto e à participação política pelas mulheres. No entanto foi somente com a Constituição de 1934 que foram estabelecidos o direito à igualdade de salário, a proibição de trabalho das mulheres em local insalubre e a permissão de descanso pós-parto. Por outro lado, as Constituições subsequentes não apresentaram avanços significativos. Somente na segunda metade do século 20, que os direitos das mulheres no Brasil foram ampliados e consolidados por meio da Constituição Federal de 1988que até hoje ainda é o maior instrumento jurídico de proteção dos direitos das mulheres no Brasil, pois declara a igualdade nos direitos e obrigações entre homens e mulheres. Considerando esse panorama apresentado, de modo geral ainda há muitas conquistas para as mulheres e ainda acredito que o maior desafio da mulher que quer atuar no Direito Agrário é o preconceito. Há muitos homens com pensamento pré-histórico pensam que as mulheres são frágeis e que lavoura, campo e roça não são lugares para mulheres, com o preconceito que o agro é apenas “área dos homens”. Por essas razões, sinto que quebro, aos poucos, muitos preconceitos ainda existentes no agro, uma vez que aparentemente eu pareço uma mulher frágil e indefesa, mas aos poucos levo “assustar muitos homens”, pois, de frágil e indefesa nada tenho. Sou uma mulher destemida desde sempre, e que sempre busquei os direitos igualitários entre homens e mulheres, e nunca senti inferior a qualquer homem. Além disso, também acredito que aos poucos os preconceitos foram sendo quebrados. Sempre amei a natureza e trabalhar realizando a assessoria jurídica e advocacia em defesa do Direito Agrário é uma satisfação sem fim, pois meu trabalho é vocacionado. Assim, ao longo de 17 anos advogando, sempre procurei estar atualizada nos principais ramos do direito, tais como cível, criminal, ambiental, trabalhista e tributária, mas a grande paixão a qual sou especialista é o Direito Agrário.

CUIABANO NEWS –  Você teria algum conselho a dar para quem pretende se dedicar a essa área?

FLAVIANE  RAMALHO – Para quem pretende atuar no agro, tem que ter em mente, que o Direito Agrário está muito além dos livros didáticos, pois, tem que compreender toda complexidade do plantio, colheita e mercado financeiro internacional, sobretudo, conhecer o dia-dia dos agricultores e dos demais trabalhadores interligados no agronegócio e deve atuar com amor a causa.

CUIABANO NEWS –  Além do Direito Agrário, você se dedica a outros segmentos?

FLAVIANE  RAMALHO – Mesmo sendo especialista em Direito Agrário, também atuo em diversas outras áreas no direito, tais como cível, criminal, ambiental, trabalhista e tributária, para melhor atender o cliente, sendo parceira de FM CITTADINAZA, sediada na Itália, para processos administrativos e judiciais para aquisição de cidadania Italiana. Também realizo trabalho voluntário no movimento escoteiro, bem como trabalho ativamente como Membro da Comissão de Infância e Juventude da OAB-MT desde 2016 até o triênio de 2024, com diversos projetos sociais.

CUIABANO NEWS –  Como falou para atuar no Direito Agrário e no agronegócio, é necessário ter um perfil destemido. O que você considera que a ajudou a ser essa mulher determinada, ousada, que encara os desafios e abre caminhos?

FLAVIANE  RAMALHO – Sempre fui bastante disciplinada e intensa aos meus objetivos. Certamente fui lapidada ao estudar em escolas extremamente rígidas, ora Colégio Tiradentes da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso, e no internato Adventista no Chile CEALA – Centro Educacional Adventista de Los Angeles. Acredito também que conhecer o escotismo, aos meus 10 anos, com certeza foi essencial para tornar a mulher que sou hoje. Sei caçar, cozinhar, inclusive fazer comida sem panela, fazer fogo sem fósforos, enfim sobreviver na selva e, sobretudo, ser uma mulher que segue os princípios do escotismo, com premissas e alicerce: Deus, Pátria, Família e a grande fraternidade mundial do escotismo.

CUIABANO NEWS –  Poderia nos falar mais sobre essa sua dedicação e amor ao escotismo?

FLAVIANE  RAMALHO – Eu decidi me dedicar ao trabalho voluntário no movimento escoteiro como uma forma de agradecimento aos que fizeram por mim na minha infância e juventude e por acreditar no poder que o escotismo pode transformar a vida dos jovens. O Escotismo é o maior movimento infanto-juvenil do mundo. Foi criado em 1907, em Londres, por Lord Baden Powell, com os objetivos: educacional, voluntariado, apartidário e sem fins lucrativos. Os grupos escoteiros estão espalhadas por 223 países e territórios em todo o mundo. A pretensão do escotismo é o desenvolvimento das crianças, adolescentes e jovens, por meio de um sistema de valores que prioriza a honra, baseado na Promessa (ou Compromisso), na Leis escoteira (ou Lei do Escoteiro) e por meio da prática do trabalho em equipe e da vida ao ar livre, fazendo com que o jovem assuma seu próprio crescimento, tornando-se um exemplo de fraternidade, lealdade, altruísmo, responsabilidade, respeito, patriotismo e disciplina.

CUIABANO NEWS –  Então, o escotismo contribuiu muito para sua postura cidadã e valores profissionais?

FLAVIANE  RAMALHO – Sim. Acredito que, em virtude do trabalho socioeducativo do escotismo, as crianças criam princípios e se transformam em adultos seguros, independentes e com participação ativa na sociedade. Isso também se dá porque o escotismo promove valores como: honestidade, fraternidade, lealdade e altruísmo. O escotismo estimula atividades como trabalho voluntário; vida ao ar livre, serviço comunitário, patriotismo e desenvolvimento espiritual. Assim, o escotismo contribuí diretamente à formação de líderes confiantes, característica essencial para o sucesso no mercado de trabalho e na vida. Assim, estimulando as crianças e adolescentes a superarem seus desafios e testarem seus próprios limites.

CUIABANO NEWS –  Desde quando você atua no movimento escoteiro?

FLAVIANE  RAMALHO – Conheci o movimento escoteiro em 1990, quando tinha 10 anos, por intermédio de meu irmão Flavio Ramalho dos Santos que participava do Grupo Escoteiro Centro América (GECA – O1º MT). No início não havia meninas no grupo escoteiro. Mesmo assim, eu ia junto todos os sábados com meu irmão para ao menos assistir as atividades e com muita insistência eu sempre pedia para participar das atividades. Após vários “não”, veio o tão esperado “sim” e com isso foram aparecendo outras meninas, até formarmos a primeira patrulha de meninas no Grupo Escoteiro Centro América, a qual tive a felicidade e honra em ser a primeira monitora da primeira patrulha de meninas, no primeiro grupo escoteiro de Mato Grosso. Anos depois, fui a primeira mulher a ser presidente do Grupo Escoteiro Centro América. Além disso, em 2019, fui autora de um projeto para instalação da sede da Região Escoteira de Mato Grosso, em parceria com a Polícia Militar. Dessa maneira, após 15 anos sem sede, a Região Escoteira ganhou um espaço próprio na sala no prédio da 7ª Companhia, localizada no CPA.

CUIABANO NEWS –  Atualmente você está participando em algum cargo no movimento escoteiro?

FLAVIANE  RAMALHO – A minha grande paixão é atuar como escotista ensinando os adolescentes como forma de retribuir a Deus o que ele fez por mim. Mas, atualmente, estou trabalhando como voluntária no administrativo como Diretora na Região Escoteira de Mato Grosso, no cargo de Relações Institucionais dos Escoteiros do Brasil. Temos o grande desafio em realizar o crescimento do escotismo na pandemia mundial.

CUIABANO NEWS –  Além de você mais alguém de sua família participa dos escoteiros?

FLAVIANE  RAMALHO – Na minha casa, as minhas filhas também participam do movimento escoteiro, sendo elas Lais Ramalho Pannebecker (13 anos) no ramo escoteiro, a Gabriella Ramalho Pannebecker (09 anos) no ramo lobinho e o bebê Rafael Ramalho Tambara (04 anos), mesmo não participando do movimento escoteiro diretamente, já acampou na minha barriga algumas vezes em acampamentos escoteiros. Sou uma mãe que procura que os filhos tenham valores nas pessoas, na família e em Deus, e não nas coisas. Desejo que eles tenham valores nas pequenas coisas da vida e exerçam ativamente seu papel social, em especial com atividades solidárias.

CUIABANO NEWS –  Além do trabalho, voluntariado e família, você se dedica a esportes, certo?

FLAVIANE  RAMALHO – Sempre fui estudiosa, mas, sempre gostei muito de esportes de modo geral e, assim, pratiquei aos longos dos meus 42 anos de idade algum tipo de esporte, tais como: natação, ginastica olímpica, futebol, patinação, ciclismo, trilha, rapel, rafting etc. Mas, ao longo dos anos senti a necessidade de aprender arte marcial de defesa pessoal, pois recebi diversas ameaças relacionadas a processos com disputas de terras, que é um ramo temerário. Por isso, esse esporte tornou imprescindível para minha segurança. Por essas razões, aos 40 anos de idade decidi aprender lutar Muay Thai para defesa da minha integridade física e de minha família. Para minha surpresa, tornou-se uma paixão e uma forma de escape do estresse do dia-dia, afinal, ser mãe de três filhos, ser advogada e cidadã ativa socialmente não é fácil.

Gostaria de acrescentar algo?

FLAVIANE  RAMALHO – Finalizo com a eterna gratidão ao meu bom Deus por todas as bençãos e a toda minha família e amigos por serem meu alicerce. Por fim, agradeço e dedico meu sucesso profissional aos meus clientes agricultores, pois, eles foram a minha fonte de inspiração para luta incansável de aplicar a justiça.

 

MINI CURRÍCULO da advogada  FLAVIANE  RAMALHO:

Flaviane Ramalho dos Santos é advogada há 17 anos e desde 2005 atua no escritório de advocacia “Flaviane Ramalho – Advocacia e Assessoria Jurídica do Agronegócio” sediado em Sapezal, Mato Grosso. Formada pela Universidade de Cuiabá (Unic), em 2004, é pós-graduada em Direito Agrário pela Universidade de Araraquara (UNIARA), em Direito Previdenciário pela Faculdades Integradas Norte do Paraná (UNOPAR). Além disso, é associada da Academia Brasileira do Direito do Agronegócio (ABRADA), membro da Comissão de Infância e Juventude da OAB/MT desde 2016 até o triênio de 2024, Diretora de Relações Institucionais da Região Escoteira de Mato Grosso dos Escoteiros do Brasil até 2024 e membro da Equipe Nacional de Mensageiros da Paz. Foi a primeira mulher Presidente do Grupo Escoteiro Centro América (GECA – 01/MT). Também já foi membro da Associação Brasileira de Advogados (ABA), ex-membro da Comissão de Infância e Juventude (ABAMT); ex-coordenadora Regional Jurídica da Diretoria da Região Escoteira de Mato Grosso da UEB, ex-membro suplente do CMDCA – Conselho Municipal de Direitos das Crianças e Adolescentes de Cuiabá/MT pela UEB/MT. Foi membro do Suporte Jurídico dos Escoteiros do Brasil. É bilíngue (português e espanhol) em virtude de ter realizado o último ano do ensino médio em Centro Educacional Adventista de Los Angeles (CEALA), no Chile e é parceira de FM CITTADINAZA, sediada na Itália.

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[1] https://www.cnabrasil.org.br/assets/arquivos/boletins/Comun.Tec.PIB_Ed.5.2022.pdf .

[2]http://www.seplag.mt.gov.br/images/files/responsive/Planejamento/INFORMACOES_SOCIOECONOMICAS/PIB/PIB_dos_municipios_2019.pdf

(Publicado Originalmente no site Magazine ILUSTRE: Clique AQUI)