Está aberto o processo eleitoral para a presidência da CBF. Ronaldo Fenômeno anunciou nesta segunda-feira que deseja ser candidato para suceder Ednaldo Rodrigues em eleição que deve ocorrer entre março de 2025 e março de 2026. Para se lançar candidato, Ronaldo precisará do apoio de, no mínimo, quatro federações estaduais e quatro clubes. O ex-jogador disse que viajará pelo Brasil em campanha para convencimento destes parceiros.

Em entrevista ao ge, Ronaldo enumerou os motivos da candidatura e deixou claro que, além da preocupação com a gestão, se vê como figura capaz de reconectar a Seleção com o torcedor. Ex-dono do Cruzeiro e com negociação em andamento para vender também o Valladolid, da Espanha, ele promete se dedicar totalmente ao processo eleitoral que ainda não tem data para acontecer:

“Eu tenho centenas de motivações, mas a maior delas é voltar com o respeito do futebol brasileiro a nível mundial. O que mais acontece comigo nas ruas são as pessoas parando e pedindo para eu voltar a jogar, porque a situação da Seleção não é das melhores neste momento, tanto dentro de campo quanto fora”

– Ouvir os ex-atletas, os verdadeiros protagonistas vai ser importante no meu plano de gestão, trazer as lendas do futebol brasileiro de volta ao protagonismo. O meu objetivo é fazer com que a CBF seja a empresa mais amada do Brasil.

O mandato de Ednaldo Rodrigues vai até março de 2026, e ele tem uma janela que começa um ano antes (em março de 2025) para convocar as eleições. O colégio eleitoral é formado pelas 26 federações estaduais e a do Distrito Federal, que têm voto com peso três, pelos 20 clubes das Série A (peso dois) e pelos 20 clubes da Série B (peso 1). A indefinição sobre a data da eleição torna a campanha de Ronaldo uma corrida contra o tempo:

– Esse anúncio é justamente para isso, para mandar uma mensagem aos presidentes de federações de clubes de que eu sou um candidato à presidência da CBF, tenho planos incríveis, e antes de que qualquer um se comprometa com seu voto, eu gostaria de ter uma conversa pessoal com cada um. Vou rodar o Brasil para sentir isso de cada um.

A missão de Ronaldo não é das mais simples. Desde a primeira eleição de Ricardo Teixeira, em 1989, a CBF nunca teve um pleito com mais de um candidato, justamente por sua estrutura política. Responsáveis por 57,47% dos votos, as federações, neste período, acabaram optando pela aclamação do candidato da situação. O ex-jogador aposta no diálogo para entender os anseios do colégio eleitoral na busca por apoio.

– Estou 100% preparado, animado, motivado e com muita gente bacana querendo ajudar. Estou animado com a possibilidade de viajar o Brasil inteiro para falar com dirigentes de federações, de clubes, e acho que temos uma história bacana para escrever muito em breve.

Ronaldo citou ainda projetos que envolvem os problemas de calendário do futebol nacional, explicou como tem acompanhado o imbróglio jurídico no STF que mantém Ednaldo Rodrigues no comando da CBF através de liminar e detalhou o desejo de participação de ex-jogadores em sua gestão.

Procurado pela nossa reportagem, o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, respondeu em nota que o processo eleitoral da entidade ainda não teve início e prometeu que ele será feito “de forma democrática e transparente” (leia a íntegra da nota no fim desta reportagem).

Confira a entrevista com Ronaldo

Em um cenário no qual ainda é incomum que ex-jogadores assumam cargos de gestão no futebol brasileiro, o que te motiva a ser candidato na CBF?

– Eu tenho centenas de motivações, mas a maior delas é voltar com o respeito do futebol brasileiro a nível mundial. O que mais acontece comigo nas ruas são as pessoas parando e pedindo para eu voltar a jogar, porque a situação da Seleção não é das melhores neste momento, tanto dentro de campo quanto fora. Ouvir os ex-atletas, os verdadeiros protagonistas vai ser importante no meu plano de gestão, trazer as lendas do futebol brasileiro de volta ao protagonismo. O meu objetivo é fazer com que a CBF seja a empresa mais amada do Brasil, e é o potencial que a gente tem. Durante muitas décadas o futebol brasileiro sempre foi a via de escape do povo brasileiro quando enfrentava os problemas diários. Chegava o jogo da Seleção e o torcedor apoiava, vibrava e comemorava junto.

– Isso era o combustível do povo brasileiro e hoje vemos um total desinteresse da população com a Seleção. Entre centenas de coisas que me motivam a me tornar candidato a presidente da CBF, recuperar esse prestígio e esse respeito que a Seleção sempre teve e hoje ninguém mais tem. Temos sido maltratados nos campos, nas competições, e a Seleção tem que recuperar esse prestígio. Vou fazer de tudo para que os jogadores entendam a histórica importância que é jogar pela Seleção, o compromisso que é vestir aquela camisa, acho que tem muita coisa errada neste momento e vamos ter que discutir. Vou viajar o Brasil todo para fazer a campanha. Quero conversar com todos os presidentes de federações, entender as necessidades de cada um, conversar com todos os clubes. Vou fazer o que eu já estava querendo fazer por conta própria para ver o meu Brasil por perto, mas agora com esse objetivo de resgatar o prestígio do futebol brasileiro.

Ronaldo deseja ser candidato à presidência da CBF em 2026 — Foto: Cahê Mota / ge

Ronaldo deseja ser candidato à presidência da CBF em 2026 — Foto: Cahê Mota / ge

Para se candidatar, é preciso ter o apoio de quatro federações e de quatro clubes das Séries A e B, mas para vencer a eleição a demanda é bem maior. Como você pretende convencer esse colégio eleitoral?

– Quero que a CBF seja não só um produto amado como sempre foi, mas também valioso. Hoje, a indústria do futebol representa 0,7% do PIB brasileiro. É muito pouco comparado a outros países desenvolvidos e que têm o futebol como grande atividade econômica. Esses países têm 3%, 4% do PIB. Temos um potencial gigantesco de fazer mudanças no futebol brasileiro para essa subida de nível. O futebol brasileiro, por exemplo, não é transmitido internacionalmente. Para nenhum país são atrativas as nossa competições. Acho que vendemos por US$ 5 milhões, uma quantia irrisória para um campeonato da importância do Brasileiro. Tem muita coisa para ser feita, mas dependo realmente do apoio de muita gente, de federações, de clubes, e vou expor a necessidade de mudança para convencer a eles de que esse meu projeto é sério e de que quero deixar um legado como dirigente. Meu legado é indiscutível como jogador, mas sinto que tenho essa obrigação de continuar na indústria do futebol e ajudar o Brasil a sair do lugar onde estamos. Nós estamos parados há 20 anos. Todos os países evoluíram na gestão, na maneira de jogar, e nós estamos parados.

Qual sua posição sobre a questão do calendário, que é um problema notório do futebol brasileiro como ficou evidente na participação do Botafogo na Copa Intercontinental?

– É importantíssimo abrir esse diálogo entre todos os clubes e federações para encontrarmos uma maneira de essa situação não se repetir. O que fizeram com o Botafogo é criminoso. Jogou duas finais seguidas, pegou um voo para Doha e teve que jogar no dia seguinte. É desumano, é tudo por falta de planejamento. Agora, estamos aí com 15 dias sem futebol, sem nada acontecer. Com certeza, é uma pauta importante para conversar com clubes e federações. Vamos precisar de muito diálogo e espero poder aproximar todo mundo, sentar todo mundo na mesa e discutir o que é melhor para todos.

As eleições estão previstas para, no máximo, março de 2026, em um cenário de posse às vésperas da Copa do Mundo. Qual é o tamanho deste desafio?

– Temos muito trabalho ainda pela frente. Essa campanha vai ser maravilhosa, rodar o Brasil para conhecer os presidentes, conversar, debater futebol, mas, se eu tiver a possibilidade, eu acho que vai ser muito bacana já chegar em uma Copa do Mundo com ânimo novo, uma filosofia nova do que a gente quer. Tem muita coisa a ser feita, nossa situação hoje é muito crítica. Não vejo muito debate de futebol profundamente. Precisamos abrir um debate nacional sobre os problemas e buscar soluções. Estou vendo uma possibilidade de ajudar o futebol brasileiro efetivamente conseguindo a presidência da CBF. Eu realmente acho que a CBF tem que ser uma das melhores empresas do Brasil. Temos que aproximar o povo da CBF, da Seleção, o brasileiro tem uma relação muito forte com Copa do Mundo e estamos perdendo isso. A maneira como estamos perdendo os jogos, a maneira como estamos nas eliminatórias, o sofrimento que é, a gente não está vendo luz no fim do túnel. Eu sou uma alternativa de mudança importante para esse futebol brasileiro que vive um momento de crise profunda.

Neste cenário, é certo falar que sua candidatura é de oposição à gestão atual?

– Meu problema não é o Ednaldo, é muito mais profundo do que somente ele. Logicamente que tem a parcela dele na gestão e nos problemas do futebol brasileiro, mas tenho zero problema com ele. Meu objetivo é de aproximar o povo da Seleção. Hoje, a Seleção vai jogar e o povo está indiferente. Isso nunca aconteceu com a gente, temos que resgatar isso. A Seleção é patrimônio do nosso povo e temos que devolver isso.

Você, como torcedor, está insatisfeito com o futebol da Seleção. Dá para falar em análise do trabalho da comissão técnica e nomes para o futuro ou ainda é prematuro?

– Acho prematuro citar nomes que vão participar, mas a Seleção merece os melhores profissionais do mundo. Nós temos os melhores jogadores, temos Vini, Neymar, Rodrygo, Estêvão, Endrick… Temos muito talento, como a gente não joga bem? Acho que o problema não está só na escalação e no treinador, ele vem de cima para baixo, no formato de uma pirâmide, e vem se arrastando. Temos que mudar essa dinâmica. O Brasil tem que ser protagonista em Copa do Mundo, em Copa América, não pode deixar de participar de uma Olimpíada. É inaceitável para o talento que temos. É preciso rever os erros cometidos e acertar. Por isso, vai ser bacana esse tour pelo país todo conversando com as pessoas, presidentes de federações para entender as necessidades, entender como é possível buscar soluções… Tem muita coisa a ser feita, estou com energia, com vontade e acho que posso ajudar.

Você é dono de um clube na Espanha, o Valladolid, e para ser presidente de uma confederação será necessário abrir mão. Como você está lidando com essa situação?

– É muito fácil. A minha intenção já vinha de algum tempo. Fiz um trabalho espetacular no Cruzeiro, reestruturamos o clube em uma oportunidade que, sinceramente, foi muito irresponsável da minha parte. Pegar um clube na Série B, com uma dívida bilionária, ganhar a Série B, recuperar o prestígio, sanar a dívida, controlar e montar uma equipe competitiva na Série A. Acho que foi um trabalho espetacular e, quando entendi que não podia ir além porque precisava de mais investimento, fiz a operação com o Pedrinho Lourenço. Com relação ao Valladolid, é a mesma coisa. Estamos negociando uma possível venda muito em breve e devemos fechar a operação. Não vai ser empecilho para minha candidatura.

Você já tem sinalizações positivas de clubes ou federações de apoio para a candidatura?

– Tenho. Tenho sinalizações incríveis, pessoas incríveis, presidentes de clubes, de federações sinalizando positivamente e tenho certeza de que vou conseguir os apoios que preciso para ser presidente da CBF. Mas muito mais do que isso, são as pessoas nas ruas que estão pedindo ajuda, o futebol brasileiro pede ajuda, isso toca meu coração. Estamos parados há 20 anos e sem perspectiva. Isso me motiva demais, sentir as pessoas pedindo ajuda. Isso me motiva para entrar de cabeça neste projeto e devolver ao futebol tudo aquilo que ele me proporcionou.

O quanto esse clamor popular pode ser determinante nesta campanha, neste processo político?

– O público de modo geral, os amantes do futebol vão mostrar a força que eles têm. Eles vão fazer o barulho que precisa para me ajudar a convencer os presidentes de federação, presidentes de clubes… Está todo mundo insatisfeito. Não passa pela minha cabeça que as pessoas estejam satisfeitas com o momento do futebol brasileiro. O futebol brasileiro está pedindo ajuda e precisa de mudança. Com a ajuda do povo e dos apoios que vou conseguir, vamos mudar a história do futebol brasileiro.

Você comentou que as lendas do futebol precisam ser ouvidas. Isso faz parte deste processo de reconexão necessário que você comentou entre Seleção e torcedor?

– Com certeza no meu programa vamos ter uma participação muito importante dos campeões mundiais. Vamos ouvir os campeões, os jogadores. Os protagonistas são os jogadores e temos que ouvi-los, entendê-los… O jogador também pede ajuda em relação ao calendário, que é desumano. O Botafogo jogou 75 partidas no ano e acho que temos que ouvir muita gente da indústria do futebol para tomar as decisões certas para cada problema.

A CBF atualmente vive um momento político e jurídico no mandato atual do presidente Ednaldo Rodrigues, que está sustentado por uma liminar no STF. Como você tem acompanhado essa movimentação?

– Acompanho de perto, atentamente e vigilante. Agora mesmo, estive em Miami para o sorteio do Mundial de Clubes e fui informar a minha intenção de ser candidato ao presidente Infantino, da Fifa, e ao Alejandro Domínguez, da Conmebol. Os dois demonstraram claramente a necessidade de recuperarmos uma CBF forte. Esses escândalos administrativos, a situação da liminar, nada disso ajuda o futebol brasileiro. Temos que acompanhar vigilantes, ver o que está acontecendo, o que pode acontecer, e estar preparados para a situação. Estou 100% preparado, animado, motivado e com muita gente bacana querendo ajudar. Estou animado com a possibilidade de viajar o Brasil inteiro para falar com dirigentes de federações, de clubes, e acho que temos uma história bacana para escrever muito em breve.

As eleições podem ser convocadas entre março de 2025 e março de 2026. Você também é vigilante neste processo, já que um pleito abreviado pode impactar nesta campanha para conseguir os apoios necessários?

– Esse anúncio é justamente para isso, para mandar uma mensagem aos presidentes de federações de clubes de que eu sou um candidato à presidência da CBF, tenho planos incríveis, e antes de que qualquer um se comprometa com seu voto, eu gostaria de ter uma conversa pessoal com cada um. Vou rodar o Brasil para sentir isso de cada um.

Por fim, em caso de vitória, o Brasil receberá uma Copa do Mundo Feminina em 2027 na sua gestão. Quais seus planos para o futebol feminino?

– É uma oportunidade maravilhosa que teremos para desenvolver ainda mais o futebol feminino. Ainda estamos muito atrás de outras seleções e neste encontro em Miami muitas pessoas, inclusive o presidente da Fifa, comentaram a preocupação que elas têm para ter o investimento e um compromisso certo para a Copa do Mundo feminina. Tenho certeza de que vai ser uma prioridade para mim. Vamos dar toda a atenção que o futebol feminino merece e fazer a festa que o brasileiro sabe fazer.

Veja a nota de Ednaldo Rodrigues:

“O presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, informa que o processo eleitoral ainda não teve início e, quando for realizado, será feito de forma democrática e transparente. Atualmente, Ednaldo Rodrigues está trabalhando de forma incansável em fazer da temporada 2025 ainda melhor do que a atual. Em 2024, a CBF investiu no fortalecimento das competições organizadas pela entidade, o Campeonato Brasileiro registrou pelo segundo ano consecutivo a média histórica de 25 mil torcedores por partida, conseguiu trazer para o Brasil a Copa do Mundo Feminina de 2027 e celebrou contratos bilionários, como a renovação da parceria com a Nike, que trará recursos para o fomento de toda a cadeia produtiva do futebol nacional.” (GE)