Quase 28 anos após deixar o Cruzeiro rumo à Europa como jogador promissor, Ronaldo voltou a responder a perguntas de jornalistas como representante do clube nesta terça-feira. Em um cenário totalmente diferente, para ele e para o clube. O Cruzeiro, nas palavras do atual dono de 90% das ações da SAF, é um “paciente na UTI”.

E para ajudar no tratamento, a atual gestão entende que é necessário muito esforço, e a compreensão de que nenhum atleta (nem mesmo um dos maiores ídolos da história do clube) é maior do que a instituição. Já na primeira resposta aos jornalistas, o Fenômeno falou sobre Fábio e a situação financeira catastrófica do clube.

– Fábio foi e vai ser sempre um ídolo pro Cruzeiro e pra torcida cruzeirense. Nós diante do cenário atual fizemos um esforço muito grande para oferecer uma proposta decente a ele, respeitando a sua história no clube, a sua trajetória. E infelizmente durante a negociação, houve uma negativa por parte dele, o que também nos pegou de surpresa. Mas entendemos que todo o sacrifício que deveríamos ter feito, foi feito. E temos que virar a página, seguir adiante – disse.

“Todo esforço que a gente podia ter feito para manter o Fábio e oferecer a ele um período para ele se despedir da torcida, da casa que foi sua durante tantos anos, foi feito. Uma pena que não chegamos a um acordo. Mas temos que seguir adiante. O Cruzeiro é maior do que qualquer atleta, qualquer nome que você possa imaginar. O Cruzeiro tem sempre de ser o protagonista.”

 

Primeira entrevista coletiva de Ronaldo à frente do Cruzeiro — Foto: Reprodução

Primeira entrevista coletiva de Ronaldo à frente do Cruzeiro — Foto: Reprodução

Segundo Ronaldo, a dívida encontrada no cruzeiro já ultrapassa a casa do bilhão, com boa parte das receitas para os próximos dois anos já antecipadas. “Cada dia que abrimos uma gaveta encontramos alguma surpresa negativa”, lamenta. Neste cenário, o Fenômeno diz que o clube não pode se dar ao luxo de gastar mais do que arrecada.

– Infelizmente o cenário hoje é bem complicado, com receitas até o próximos dois anos já antecipadas, inclusive já gastas. Nós encontramos um cenário realmente trágico no clube, mas temos que estancar o sangramento.

“Diria que o Cruzeiro é um paciente em estado grave, na UTI, e nós estamos oferecendo o tratamento necessário para que ele saia dessa condição. Que possamos fazer o máximo pra que seja o clube grande que merece ser.”

Pensa em desistir?

Diante a enormidade de desafios e das dificuldades que vem sendo apresentadas à nova gestão, Ronaldo foi perguntado se pensa em desistir da compra de 90% da SAF. Como o acordo assinado ainda fala em “intenção de compra”, o Fenômeno disse que até existe a previsão de desistência no contrato, mas que não pensa em fazer isso.

– Tecnicamente, sim. No contrato, há essa saída. Mas está longe da minha cabeça, do meu pensamento desistir do projeto. No momento estamos no processo de análise do clube, entender o tamanho do buraco, o tamanho da dívida, entender os credores.

“Meu desejo é continuar e ficar aqui até fazer com que o clube volte a ser grande como era antes.”

Transfer Ban: prioridade e R$ 140 milhões

Dentre todas as prioridades de Ronaldo no Cruzeiro, a resolução das dívidas com clubes que já culminaram (e ainda podem culminar) em punições com transfer ban é a principal. Só neste mês de janeiro, o Fenômeno esclareceu que o clube precisa pagar R$ 23 milhões. Os débitos são referentes às compras de Arrascaeta (Defensor-URU) e Riascos (Mazatlán).

Isso para pagamento já agora. A projeção é que, só entre 2022 e 2023, a dívida global com clubes pela aquisição de jogadores totalize R$ 140 milhões.

“De imediato, para ainda o fim deste mês de janeiro, temos uma obrigatoriedade de pagar R$ 23 milhões. E durante este ano e o próximo alcançando esse valor total de R$ 140 milhões.”

– Esta é uma dívida que dificilmente poderá ser negociada, mas vamos tentar negociá-las, entender um pouco das outras dívidas também. Enfim, nosso compromisso é cumprir com todas as dívidas que nos corresponde – completou.

Corte brusco: de R$ 90 milhões para R$ 35 milhões

A notícia de que a gestão atual pretendia realizar um corte brusco na folha do Cruzeiro orçada antes da compra da SAF não é de agora, mas pela primeira vez, Ronaldo abriu os valores à imprensa.

– Assim que anunciamos a compra da SAF, começamos a mergulhar no que era o orçamento do ano do clube. E a primeira coisa que encontrei foi um orçamento de R$ 90 milhões, com uma receita de R$ 60 milhões que inclusive já estavam gastos – disse.

“É realmente um valor que não bate. Não entra na minha cabeça o funcionamento de um clube assim.”

Com a renegociação de contratos e alguns cortes bruscos (como a própria saída de Fábio), Ronaldo diz que a folha atual caiu para R$ 35 milhões, quase um terço do valor inicial. O dirigente fez questão de agradecer aos atletas que aceitaram renegociar as condições do contrato, mas disse que ainda há trabalho a fazer.

– Aqui eu deixo já meu agradecimento especial a esses atletas que aceitaram renegociar o contrato entendendo a situação gravíssima do clube, e decidiram permanecer no clube para conseguir o objetivo maior. Hoje conseguimos abaixar o orçamento para R$ 35 milhões, quase três vezes menos. Mas ainda temos muito trabalho a fazer, muitos cortes a fazer ainda – reiterou.

“É um momento realmente de ações impopulares, mas que são extremamente necessárias para que o clube volte a ser grande como não deveria ter deixado de ser.”

Mais respostas

“Exemplo Fábio” e busca por time competitivo

– O que vamos buscar é realmente sanear o clube. Encontrar esse equilíbrio de receita e custo. Esse é o nosso primeiro desafio. Logicamente encontramos um cenário onde as receitas já estão antecipadas e gastas. Vamos ter que buscar novas receitas para fazer com que o clube tenha o seu funcionamento adequado. Isso não quer dizer que não vamos ter uma equipe competitiva. Muito pelo contrário, estamos trabalhando para ter uma equipe competitiva, através do Pedro Martins, Paulo André e Paulo Pezzolano. Encontraremos jogadores com o custo que se encaixa na realidade atual do clube, mas que sejam realmente competitivos e que possamos durante o ano ter a possibilidade de voltar à primeira divisão, que é o nosso principal objetivo.

Planejamento

– Ainda estamos no processo de análise do clube. Temos uma oferta de compra, no qual a gente ainda está nesse processo de análise do clube. Estamos descobrindo ainda, abrindo todas as gavetas do clube para entender a real situação. Posso adiantar que a situação é muito dura, muito difícil. Vamos precisar de um período longe de no mínimo um ano a dois anos para encontrarmos um certo equilíbrio no clube. Mas de qualquer maneira, estou muito animado, sou entusiasta de que podemos fazer um time competitivo para buscar os resultados esportivos que a gente espera para este ano.

Aporte de R$ 400 milhões

Não existe ainda um planejamento de aporte financeira ao clube. Primeiro nós estamos criando um novo padrão de gestão, que eu acho que é o mais importante. É a maior ajuda que podemos dar nesse momento ao clube, é criar esse novo padrão de gestão, um padrão eficiente, sustentável. Acho que essa é a principal mensagem que posso deixar ao torcedor. Aqui faremos uma gestão totalmente eficiente. Não gastaremos um centavo a mais do que arrecadaremos. Logicamente que vou cumprir com meus compromissos contratuais de acordo com a aquisição da SAF. Portanto quando tiver um planejamento ou cronograma em relação a isso voltaremos a falar e deixar isso um pouco mais claro e transparente para vocês.

Planejamento a médio e longo prazo

– Este é o nosso objetivo: fazer com que o clube dispute grandes títulos, grandes competições, e que seja protagonista tanto no Brasil como na América do Sul. Esse é o nosso objetivo a médio e longo prazo. Mas a curto prazo temos um objetivo principal e único que temos que pensar, que é voltar à Série A do Campeonato Brasileiro. Para isso, o nosso planejamento é realmente reduzir custos em todas as esferas do clube. Transmitir esse novo padrão de gestão a todos os funcionários, atletas e colaboradores do clube. E a partir daí, com a gestão eficiente e sustentável, a gente pensa logicamente a médio e longo prazo em disputar todos os títulos da grandeza que o clube merece.

– Nós estamos trabalhando com muitos nomes. O Pedro Martins, o Paulo André e o Pezzolano estão trabalhando dia e noite pensando no melhor para o clube. Com certeza encontraremos nomes que estão à altura do clube.

Dá para sonhar com acesso neste cenário?

– Este é, sem dúvida, o nosso principal objetivo, voltar a elite do Campeonato Brasileiro. Nós vamos ter sim uma equipe competitiva. Nós temos sim que pensar nesse acesso à Primeira Divisão. É nossa obrigação buscar esse objetivo. Um clube da grandeza do Cruzeiro e da grandeza dos seus torcedores merece estar na elite do Campeonato Brasileiro e é esse objetivo que vamos buscar.

Papel do torcedor

– É o nosso principal pilar. É a nossa fundação e é para quem nós vamos fazer todo sacrífico para que o clube volte a ser grande, e que o torcedor volte ao estádio, volte a fazer parte dos nossos programas de sócios. Nós encontramos o clube com apenas 10 mil sócios, um número muito pequeno para a grandeza do Cruzeiro. Hoje, já estamos com 15 mil sócios, o que ainda é baixo. Mas logicamente o torcedor espera uma reação nossa, e a reação chegou. A gestão eficiente vai ter resultado, e obviamente contamos muito com o nosso torcedor para que a gente possa dar essa virada juntos. Quero pedir quer esse torcedor nos dê esse voto de confiança, apoie nosso time e apoie nossa gestão, porque só assim entendemos que vamos voltar a ser grande como erámos antes. (GE)