A votação por cédulas de papel terminou no Brasil no ano 2000quando a urna eletrônica foi usada pela primeira vez em todas as cidades do país. Antes disso, em uma eleição municipal, por exemplo, era preciso assinalar o nome de um dos candidatos a prefeito entre as opções disponíveis.

Já para o cargo de vereador, o eleitor votava em quem quisesse: bastava escrever o nome do seu candidato no papel. Foi assim que, em 1959, a rinoceronte fêmea Cacareco recebeu cerca de 100 mil votos para ser vereadora na cidade de São Paulo.

Sua insólita participação nas eleições foi relembrada em um vídeo no Instagram, que viralizou nesta semana, somando mais de 11,8 mil visualizações, no perfil do historiador de arte Rodrigo Ramos (@rodrigosramos). Veja a publicação a seguir:

Cacareco para vereadora

Hoje, o esqueleto da rinoceronte está exposto no Museu de Anatomia Veterinária (MAV) da Universidade de São Paulo (USP), para onde foi levado em 1984. Abaixo, explicamos a história da “ex-candidata” a vereadora.

A fêmea de rinoceronte-branco foi a primeira de sua espécie a nascer no Brasil, em 1954. Criada no Zoológico do Rio de Janeiro, ela foi emprestada da capital carioca a São Paulo para marcar a inauguração do zoológico paulista quatro anos depois de seu nascimento, em 1958.

Em pouco tempo, o animal ganhou fama, traçando seu caminho até a política. Conforme lembra uma matéria do g1, o então governador do estado Jânio Quadros brincou com a situação: “Com o cartaz que está, Cacareco seria um forte candidato aos Campos Elíseos”, disse durante a cerimônia de inauguração do zoo, fazendo referência à localização da sede do governo de São Paulo na época.

Segundo detalha o site da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), no ano eleitoral de 1959, o jornalista Itaboraí Martins lançou um voto de protesto em publicação no jornal Estadão. De forma cômica, ele sugeriu que a população votasse na rinoceronte Cacareco para demonstrar a insatisfação com os 540 candidatos a vereador.

Dito e feito. Os números oficiais não foram divulgados, já que os votos para o animal contaram como nulos, mas estima-se que Cacareco teve cerca de 100 mil eleitores em São Paulo – e seu nome chegou a figurar em cédulas de outros municípios. Em comparação, o partido mais votado naquele ano obteve menos de 95 mil votos.

Em 1959, Cacareco foi precursora do voto de protesto do Macaco Tião no Rio em 1988 — Foto: Wikimedia Commons
Em 1959, Cacareco foi precursora do voto de protesto do Macaco Tião no Rio em 1988 — Foto: Wikimedia Commons

Até mesmo um jingle eleitoral o animal recebeu: “Cansados de tanto sofrer, e de levar peteleco, vamos agora responder, votando no Cacareco”, dizia a canção.

A morte de Cacareco

Dias antes da eleição, a rinoceronte já havia retornado ao Rio de Janeiro. Devido a uma inflamação dos rins, ela morreu em 1962. A morte, aos 8 anos de idade, veio muito antes do que o esperado para a sua espécie, que tem uma expectativa de vida de 50 anos em cativeiro.

Anos mais tarde, em 1988, outro animal seria usado para o chamado “voto de protesto”. Na década de 80, foi a vez do famoso “Macaco Tião”. O primata, que, na verdade, era um chimpanzé, foi o terceiro candidato mais votado para a prefeitura do Rio de Janeiro, após o jornal de humor Casseta Popular ter sugerido sua candidatura pelo fictício Partido Bananista Brasileiro (PBB).

Ao deixar de assinalar uma das opções e anular o voto, cerca de 400 mil eleitores escreveram o nome do animal na cédula de papel naquele ano. Tião até entrou para o Guinness World Records pelo recorde de maior número de votos para um chimpanzé em uma campanha política.

(Por Beatriz Herminio)