Em sintonia com as expectativas da maioria dos economistas, bancos, instituições de pesquisa econômica e analistas do mercado de capitais, o Banco Central anunciou na noite de ontem a elevação da taxa básica de juros em 0,75 pontos percentuais, subindo a Selic para 2,75% ao ano. O objetivo é conter a escalada da inflação que já atingiu 5,20% em dados anualizados. Bem acima da meta estabelecida pelo próprio Banco Central para 2021 que é de 3,75%.
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Até a reunião de ontem (17), a diretoria do Banco Central considerou que a inflação, que já havia atingido 4,52% em 2020, vinha sendo pressionada por fatores conjunturais que seriam amenizados ao longo dos primeiros meses de 2021.Entendiam que o consumo sinalizava queda e o fim do auxílio emergencial ajudaria a reduzir ainda mais o consumo das famílias.A resiliência da alta de preços e a permanência de outros fatores impulsionadores dainflação,como a desvalorização do real frente ao dólar, desequilíbrio fiscal e as incertezas políticas no combate à pandemia foram razões decisivas para a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de iniciar a trajetória de elevação dos juros.Desde 2015 o Copom somente fez movimentos para reduzir os juros básicos de 14,25%para 2% ao ano.
A situação macroeconômica do Brasil é paradoxal. Vemos o aumento da inflação ao mesmo tempo que o país convive com forte retração da atividade econômica. O PIB teve queda de 4,1% em 2020 e o desemprego atingiu índices jamais vistos em nossa história econômica. A literatura econômica denomina isso de estagflação: elevação da inflação com estagnação ou retração do crescimento econômico. Os mais relevantes fatores que levaram o país a esta condição são a alta do câmbio, elevação dos preços das commodities agrícolas e o desarranjo das cadeias de oferta com as paralisações exigidas no combate à pandemia.
Para ficar apenas em um exemplo, os preços dos itens de alimentação tiveram alta de 15% em 2020. O isolamento social fez as famílias consumirem mais em casa, mas o fator que mais influenciou a elevação dos preços da alimentação foram a alta do dólar, o aumento das exportações de produtos agropecuários e as incertezas sobre o tempo que o país levará para controlar a covid-19. No caso do arroz, 35 países aumentaram importações desse produto brasileiro e outros 25 países passaram a comprá-lo. Resultado: segundo o IBGE, o preço do arroz subiu 69% nos últimos 12 meses. Outro componente decisivo para a elevação da inflação foram os contínuos e exagerados aumento dos preços dos combustíveis. Nos últimos doze meses a gasolina subiu 54% e o diesel 41%, afetando várias cadeias produtivas e pressionando a inflação. O mesmo movimento se deu com a soja, milho, carnes de frango, suína e bovina. O dólar alto e a demanda internacional aquecida tornaram mais atrativo aos produtores exportar do que vender no mercado doméstico. Como o país não tem política de estoques reguladores, o resultado aparece sob a forma de elevação de custos nas indústrias processadoras de alimentos e, finalmente, no aumento dos preços nas gôndolas dos supermercados.
Trabalho com o cenário de que a estagflação poderá ficar restrita à primeira metade do ano. No segundo semestre poderemos ter uma confluência positiva que pode levar à retomada gradual da atividade econômica e a inflação voltar a ficar mais comportada. Dependemos, naturalmente, de boas medidas proativas por parte do Banco Central na questão cambial, do avanço na vacinação e aprovação de algumas das reformas econômicas e administrativas,pelo congresso nacional, que sinalizem aos investidores que a questão fiscal não está fora de controle.
A mais importante medida econômica atualmente é a vacinação em massa da população. A administração federal precisa purgar seus erros, alinhar-se aos governadores, prefeitos, líderes empresariais e intensificar uma campanha nacional de vacinação.É condição essencial para a atividade econômica voltar a funcionar no segundo semestre já que o primeiro está praticamente perdido, diante do desorganizado “fecha e abre” que tem sido utilizado para enfrentar o recrudescimento das contaminações e aumento de mortes vistos nos primeiros meses do ano.
*VIVALDO LOPES DIAS é economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia. É pós-graduado em MBA Gestão Financeira Empresarial-FIA/USP
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