Atualmente, estamos vivenciando um grande obstáculo a ser combatido pelas empresas em recuperação judicial perante a Justiça do Trabalho, pois a Magistratura Trabalhista vem banalizando o instituto da Recuperação Judicial com a aplicação das multas previstas nos artigos 467 (pagamento de verbas incontroversas em audiência) e 477, § 8º (pagamento dos valores da rescisão contratual), ambas da CLT, mesmo diante das provas de que a empresa encontra-se sob os efeitos concedidos pelo processamento da recuperação judicial, submetendo-se, a rigor, aos ditames da legislação específica, consubstanciada na Lei 11.101/2005.
É certo que, todos os créditos existentes à data do pedido, ainda que não vencidos, sujeitam-se, exclusivamente, à recuperação judicial da devedora, conforme previsão no art. 49 da Lei 11.101/2005.
Além disso, concedida a recuperação judicial, fica expressamente proibido qualquer ato de disposição ou oneração patrimonial ou gerador de obrigação, inclusive os pagamentos referentes à rescisão contratual, por força do artigo 172 da Lei 11.101/2005, sob pena de configuração de crime de favorecimento de credores, com pena de reclusão de 2 (dois) a 5(cinco) anos e multa, o que impede a empresa de efetuar pagamento das verbas rescisórias que estão sujeitas ao plano de recuperação judicial por força do citado art. 49 da Lei 11.101/05.
Assim, ao seguir os ditames da Lei recuperacional, não haveria que se falar em aplicação das penalidades previstas nos artigos 467 e 477, § 8º ambos da CLT. Todavia, a Justiça do Trabalho, banalizando a Lei 11.101/2005, aplica-as, e condena teratologicamente ao pagamento, as empresas em recuperação judicial
Com isso, o Juízo Trabalhista desconsidera a legislação específica da recuperação judicial, e fere o seu principal objetivo, que consiste em viabilizar a superação da situação de crise econômica financeira da empresa devedora, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, e, consequentemente, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica, surgindo a problemática.
Em suma, caso a empresa realize o pagamento da rescisão contratual, terá cometido crime de favorecimento de credores, com aplicação de pena de detenção e multa, prevista na Lei de Recuperação Judicial, podendo ainda levar a empresa à falência.
Por outro lado, caso não haja o pagamento dos haveres rescisórios e incontroversos, a Justiça do Trabalho condena a empresa ao pagamento das referidas multas, haveres estes que, por sua vez, não foram pagos pela sujeição ao Plano e proibição previstos na Lei recuperacional, cuja recuperação judicial foi concedida pelo próprio Poder Judiciário, e, ao final, a Especializada reconhece a sujeição do crédito e das multas e expede a Certidão de Habilitação de Crédito para que o credor receba por via da recuperação judicial.
Este subterfúgio da Justiça Laboral banaliza a Lei de Recuperação Judicial (11.101/05), ora seguindo e ora ignorando a Lei Federal, frustra a intenção do legislador, que sem dúvida, é a de inspirar o soerguimento de um negócio que atravessa uma dificuldade financeira e, com isso, evitar o fechamento da empresa com a quebra.
Admitir a aplicação das multas previstas na CLT por falta de pagamento dos créditos sujeitos à recuperação judicial, foge totalmente à lógica jurídica, posto que a empresa teve o processamento da Recuperação Judicial concedido e viabilizado pelo Poder Judiciário, com amparo na Lei 11.101/2005.
Assim, arcar com multas que visam punir àqueles, que deixam voluntariamente (e não por força de lei) de adimplir verbas rescisórias e incontroversas nos autos, é totalmente incompatível com a recuperação judicial, uma vez que as empresas em recuperação judicial estão expressamente impedidas por Lei Federal de adimplir as verbas rescisórias e incontroversas.
Dessa forma, deve a Justiça do Trabalho evoluir nos debates para aplicação correta das leis e evolução jurisprudencial, visando a aplicação dos direitos garantidos pela Lei de Recuperação judicial.
*FERNANDA FERREIRA MODESTO e ERICA AMORIM são advogadas do Escritório Mestre Medeiros.
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