A Polícia Civil de Mato Grosso concluiu, nesta sexta-feira (16), o inquérito sobre a morte de Benedito Cardoso dos Santos, de 42 anos, e indiciou o bolsonarista Rafael Silva de Oliveira, de 22 anos, por homicídio qualificado por motivo fútil e meio cruel. O assassinato aconteceu em Confresa, a 1.161 quilômetros a nordeste de Cuiabá, no dia 7 de setembro, depois de uma discussão entre os dois por política, em que a vítima defendia o candidato à presidência Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o investigado apoiava o presidente Jair Bolsonaro (PL).
O delegado Victor Oliveira informou ao g1 que aguarda o laudo da necropsia da vítima, que deve ficar pronto na segunda-feira (19). O documento deve apontar, inclusive, por quantas facadas Benedito foi atingido.
“Eram 15 perfurações, mas devem ser mais do que 15. Não tenho o número exato devido ao laudo não ter sido concluído ainda”, disse o delegado.
Em nota enviada ao g1, o advogado Matheus Roos, que representa Rafael, disse aguarda o envio do inquérito à Justiça e que mantém a linha de defesa.
“A dinâmica do crime não era objeto de especulação e, sim, as motivações”, informou.
O crime aconteceu em uma chácara em Agrovila, zona rural de Confresa, cidade a 1.161 quilômetros ao nordeste de Cuiabá. (Foto: Policia Civil-MT)
Entenda o caso
Benedito, de 42 anos, foi assassinado com golpes de faca e machado, durante uma discussão por questões políticas. O crime aconteceu em uma chácara em Agrovila, zona rural de Confresa. Segundo o delegado, os dois homens trabalhavam juntos no corte de lenha na propriedade.
A Polícia Judiciária Civil registrou que Benedito deu um soco no rosto de Rafael, apoiador do presidente Jair Bolsonaro, e, em seguida, pegou uma faca. O autor do crime, então, partiu para cima da vítima e tomou para si a arma branca.
Ainda, segundo a versão apresentada pelo delegado, Benedito teria corrido e Rafael o perseguiu e começou a golpeá-lo pelas costas. A vítima teria ficado caída no chão, momento em que o autor aproveitou para acertá-la com golpes no olho, no pescoço e na testa.
De acordo com o delegado, Rafael foi até um barracão pegar um machado, foi até Benedito, que ainda estava vivo, e o acertou no pescoço, na tentativa de decapitá-lo.
O autor escondeu as armas do crime e foi andando até a cidade de Confresa, chegou ao hospital e solicitou atendimento médico, pois estava com um corte na mão e outro na testa. Ele alegou que tinha sido vítima de uma tentativa de roubo.
O suspeito foi encaminhado para a delegacia para prestar depoimento e confessou o crime.
Os policiais encontraram a faca, o machado e outros elementos que apontavam para o suspeito no local do crime.
Gravação
Segundo a Polícia Civil, Rafael gravou um vídeo do corpo da vítima e formatou o celular antes de entregar o aparelho para um amigo.
“Ele [Rafael] falou que tinha praticado uma besteira, mostrou o vídeo e deixou o celular com essa testemunha. O celular foi apreendido só que ele estava formatado e não tinha mais nada. Vamos tentar com a perícia para ver se recupera alguma coisa mas, até então, não tivemos acesso ao vídeo”, disse Oliveira.
O amigo disse para a polícia que o vídeo mostra o corpo da vítima no chão, informou a polícia.
De acordo com o delegado, além da testemunha que informou sobre o vídeo e que estava com o celular de Rafael, outras seis pessoas também foram ouvidas.
“Para nós, ele estava lúcido e ciente do que estava fazendo, então foi autuado como uma pessoa normal”, disse o delegado.
O que já disse a defesa?
O advogado de defesa de Rafael, Matheus Ross, disse, há três dias, que iria apresentar à Justiça um requerimento de incidente de insanidade mental para comprovar que o autor sofre de esquizofrenia.
De acordo com o advogado, se a solicitação for aceita, o investigado deve passar por equipe médica especializada, que deve apontar os problemas psiquiátricos que ele possui.
“O objetivo, em um primeiro momento, é que o acusado passe por perícia judicial, para que possa ser atestada a higidez mental, haja vista já haver laudo alegando seus graves problemas psiquiátricos. Se for comprovada doença mental, poderá substituir eventual pena por medida de segurança”, disse ao g1, apontando a possibilidade de que o autor seja internado em clínica especializada.
Ross cita o pedido de internação por esquizofrenia apresentado pela Defensoria Pública, acionada pela família de Rafael. A sentença que negou a internação compulsória – ou seja, contra a vontade da pessoa – foi proferida pelo juiz José Luiz Leite Lindote, da Vara Especializada da Saúde da Comarca de Várzea Grande, em abril de 2022. Contudo, a ação teve início em 2020.
No processo, consta um laudo assinado por médico psiquiatra e cita que os tratamentos aos quais Rafael foi submetido na rede pública não alcançou os resultados esperados.
“A doença nunca foi tratada adequadamente e não se cura sozinha”, citou.
Em um trecho da ação de internação, cedida pelo advogado, consta a doença de Rafael e o pedido de urgência pela internação.
“Rafael Silva de Oliveira, que é portador de transtornos mentais, como esquizofrenia (CID F 20) e apresenta quadro de surto psicótico grave – psicose não-orgânica não especificada (CID F 29), com delírio preventivo e ideias homicidas. Ademais, nos últimos tempos tem se comportado de forma agressiva, apresentando agitação psicomotora [excitação mental e atividade motora aumentadas]. O quadro coloca o risco de vida o próprio e terceiros, necessitando internação hospitalar urgente, conforme laudo médico”, consta no laudo.
A defesa descarta que a motivação do crime tenha sido política. “Toda a apuração foi feita muito preliminarmente e cada nova informação traz mudanças na versão apresentada pela polícia”, disse o advogado.
Repercussão
Pelas redes sociais, o candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, lamentou o assassinato, a facadas, de um simpatizante petista durante discussão com um bolsonarista.
“É com muita tristeza que soube da notícia do assassinato de Benedito Cardoso dos Santos, na zona Rural de Confresa. A intolerância tirou mais uma vida. O Brasil não merece o ódio que se instaurou nesse país. Meus sentimentos à família e amigos de Benedito”, disse Lula por meio de uma rede social.
O candidato à reeleição pelo PL, Jair Bolsonaro, não se manifestou sobre o crime.
Já a diretora para as Américas da ONG Human Rights Watch, Juanita Goebertus Estrada, declarou que “todos os candidatos deveriam condenar energicamente o assassinato de Benedito Cardoso dos Santos e quaisquer atos de violência política, intimidação ou ameaça no período eleitoral”.