A compreensão atual acerca do poder geral de cautela dos tribunais de contas é a de que ele se estabelece implicitamente, com clara referência à Teoria dos Poderes Implícitos, cuja origem remonta ao caso McCulloch v. Maryland, julgado pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América no ano de 1819.
Segundo a referida teoria, a Constituição, quando confere atribuição a determinado órgão estatal, assegura, correlatamente, ainda que de modo não expresso, os meios necessários para o seu efetivo cumprimento. É o que se extrai, por exemplo, do art. 71, X, da Carta Magna, ao prever que o Tribunal de Contas da União, no exercício das suas competências, pode sustar a execução do ato impugnado, comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal.
Aliás, no âmbito do TCE-MT, o poder geral de cautela encontra respaldo no art. 297, caput, e 298 do seu Regimento Interno, prevendo, inclusive a possibilidade de se determinar medidas cautelares inominadas de caráter urgente (art. 298, IV).
Sucede que, embora a matéria esteja aparentemente sedimentada, ela não está, em absoluto, indene a críticas, sobretudo porque a ideia de competências constitucionais implícitas só faz sentido se for compatível com o sistema de competências atribuído explicitamente pela Constituição.
Registre-se, como acentua Eduardo Jordão, que a Constituição não foi silente sobre a existência de poder cautelar ao TCU; ao contrário, ela o previu expressamente no supramencionado art. 71, X, que disciplinou o seu exercício, máxime a partir de uma leitura combinada dos arts, 71, IX e X, pois deixa claro que a sustação dos efeitos de atos irregulares pelo TCU (i) será precedida do esgotamento de prazo que o próprio TCU assinar para que as autoridades pertinentes adotem as soluções cabíveis e (ii) será seguida da comunicação da decisão de sustação à Câmara e ao Senado.
Nesse contexto, ressai temerário reivindicar poder geral de cautela que permita ao TCU aplicar outras medidas cautelares ou suspender atos administrativos sem seguir este procedimento, expressamente previsto no texto constitucional, sob pena de subverter a teoria em questão e malferir frontalmente a previsão constitucional.
E tal perspectiva pode e deve, ainda que em última análise, nortear o exercício do poder cautelar nas Cortes Estaduais de Contas, sobretudo nas hipóteses inominadas, em ordem a garantir a legitimidade das decisões.
*DOUGLAS DE BARROS IBARRA PAPA é advogado em Cuiabá-MT, Mestre em Direito pelo Largo de São Francisco (USP) e Professor Universitário (UNIC e UFMT).E-MAIL: douglas@ibarrapapa.com.br