Andando pela Cuiabá do século XIX percebemos que o abastecimento de água de beber era, ainda, feito de forma explicita por carroceiros, pipeiros, aguadeiros, latas, potes, etc. Procuramos elaborar um “Roteiro das Águas” para que sirva de inspiração para fazer nascer dentro do Turismo Municipal e Estadual, um “Caminho das Águas”, com o objetivo de dar conhecimento a professores, pesquisadores, alunos, turismólogo, autoridades, cujo objetivo fim é o respeito as águas, ao meio ambiente, a preservação das nascentes, uma vez que a cidade de Cuiabá precisa dessas águas, principalmente, nos períodos de altas temperaturas. Cuidar, arborizar, tratar, preservar é tarefa de todos nós.
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Em 1852 casas humildes de Cuiabá possuíam mobílias modestas como redes e, ao canto um pote de água potável fresca. Até o ano de 1882 o abastecimento de água da capital mato-grossense era feito em pipas colocadas em carroças, que passavam pelas ruas da cidade, vendendo água ao preço de Cr$ 0,05 e Cr 0,10 (cinco e dez centavos) a lata, bem como, por fontes, chafarizes e poços. No livro Água: gota da vida – abastecimento e uso no espaço urbano de Cuiabá (1790-1886), UFMT, Cuiabá, 2005), a historiadora Neila Barreto nos informa esses lugares que serviam como fontes de água potável, tais como:
CHAFARIZ DO MUNDÉU – antigo Chafariz do Largo da Conceição, situado na Praça Bispo D. José, construído em 1871, pelo Presidente da Província – Dr. Francisco José Cardoso Júnior, com um reservatório de água no antigo quintal do Maranhão, bem como, de um aqueduto para alimentação do chafariz, cujas obras foram orçadas por 7:989$630 e, executadas pelo engenheiro militar Francisco Nunes da Cunha. Edificado em alvenaria, a forma de um sólido octogonal de base circular, de vértice rematado em cone reto, tendo aos lados em chanfraduras entalhadas nas paredes, com colunatas ornamentais, bicas de jorravam filetes de água, jorrando constantemente em bacias semi-circulares, feitas também de alvenaria. Peça colonial com quatro sacadas abobadas artisticamente dispostas, tendo no seu interior torneiras de bronze que não permitiam o vazamento ou desperdício do precioso líquido.
BICA DE FERRO “BORNE FONTAINE” – Bicas cilíndricas de ferro, conhecidas como Boca de Leão. Foram instaladas nas seguintes ruas em Cuiabá em 1882: Travessas Voluntários da Pátria, da Justiça, atual Travessa Francisco Ferreira Mendes, Costa Campos, atual Rua Thogo da Silva Pereira, no Largo do Arsenal de Guerra, atual Praça Benjamim Constant, nas ruas da Caridade, atual Rua Miranda Reis e Ricardo Franco, Ponte do Rosário, Largo da Boa Morte, atual Rua Cândido Mariano, Largo da Mandioca, atual Praça Conde de Azambuja Rua Marechal Deodoro. Essas bicas forneciam água para a população que não tinha recursos para instalar em suas casas as penas de água. (Pp. 104 e 111). Cada uma dessas 14 fontes conteria duas Borne Fontaines. Mas os empreiteiros podiam derivar “por sua conta e sem ônus para a Província, até oito penas de água para serviço particular”, – ou, em outros termos, para ligações domiciliares.
AQUEDUTO SOBRE O CÓRREGO PRAINHA – Beirando o final do século, em 1790, possíveis pressões de moradores abastados das ruas de Baixo, atual Galdino Pimentel e Oratório, atual 7 de setembro, é que levaram à construção do primeiro chafariz, ao pé da ponte da Igreja do Rosário, alimentado pelas águas da Fonte do Ernesto trazidas por meio de tecnologia gravitacional para dentro da cidade, num Aqueduto feito de madeira, apoiado em muro de taipa coberto de telhas, sobre o córrego Prainha. O aqueduto acompanhava a fralda do morro da Prainha, no fundo do quintal das casas da Rua Cel. Peixoto e da praça Bispo D. José que atravessa junto ao Reservatório. (P. 77). Hoje desaparecido, poderia ser ali construído um marco para visitação e contemplação, em miniatura.
BICA DA PRAINHA – Conhecida como Fonte de Maria Corrêa, na Paragem chamada a Prainha, em 1781, referida como Bica. Era uma torneira ajustada ao pé do morro da Prainha, por onde jorrava uma água pura do manancial existente. Na prainha havia três mananciais de água denominadas bicas. (P. 77).
GALERIA DO INTERIOR DA CAIXA D´água VELHA – reservatório de distribuição de água com capacidade para 1.000m³ (1 milhão de litros) de água situado na antiga Travessa da Caixa d`Água, hoje Rua Comandante Costa. Foi construída em 1882, no espigão do taboleiro da Boa Morte, em areia lavada e tijolinhos, no governo do Presidente de Província Cel. José Maria de Alencastro pelos empreiteiros João Frick e Carlos Zanota. Foi inaugurada em 30 de novembro de 1882, atual Museu do Morro da Caixa d´Água Velha).
CHAFARIZ DO JARDIM ALENCASTRO – Foi construído um Chafariz de Repuxo composto por uma bacia de pedra, em 1882, canteiros de flores, cercado por muretas e gradil confeccionado com os canos de 2000 espingardas velhas do arsenal de Guerra, por José Maria de Alencastro. Em 1903, o prefeito de Cuiabá, Avelino Siqueira, inaugurou um novo Chafariz na Praça Alencastro. Esse chafariz foi demolido na administração do Prefeito Vicente Emílio Vuolo para construir a Fonte Luminosa inaugurada em 11 de julho de 1965 (p. 120).
CHAFARIZ DO JARDIM IPIRANGA – Em 1868 o governo provincial – Barão de Aguapehy – Vice-Presidente da Província de Mato Grosso autorizou por meio da Lei n° 5 a construção de um chafariz no Largo Ipiranga, a ser alimentado pelas águas de manancial existente na “parte superior da Travessa do Vilas Boas”, atual Avenida Generoso Ponce, atual Praça Ipiranga, na capital (p. 94).
CHAFARIZ DA PRAÇA DA BANDEIRA – PORTO – Construída em 1928, no governo do Dr. Mário Corrêa da Costa e na administração do prefeito de Cuiabá – Engenheiro Fenelon Muller, o chafariz ficava no bairro do Porto. No contorno do Chafariz, quase tocando na água, casais de namorados admiravam a paisagem do bairro do Porto. O chafariz e a Praça da Bandeira desapareceram para dar lugar ao alagamento da Avenida 15 de Novembro.
TANQUE DO BAÚ – Em 1874, pressionado pela população, o presidente da Província – Manoel Albino de Carvalho tomou a decisão de construir um açude próximo à igreja do Rosário, no final da Rua Corumbá, mais conhecido como Tanque do Bahú, para suprir as necessidades de água potável. Custou o valor de 3:200$000 reis advindos do Ministério da Agricultura. Era um reservatório de água potável e aprazível local de passeio. Teve arborização em seu entorno, com bancos de madeira à sombra. (P. 92).
CHAFARIZ DO JARDIM LUÍS DE ALBUQUERQUE – PORTO – Ali dois chafarizes amenizavam o calor cuiabano com seus borrifos confortantes d`água. Foi construído em 1928, no governo do Dr. Mário Corrêa da Costa. Foi local de muitas animações nas décadas de trinta, quarenta e cinqüenta, não apenas por acolher os observadores das partidas de lanchas, porém, pelas costumeiras noites de retretas nos domingos e feriados.
HIDRÁULICA DO PORTO – Instalada em Cuiabá em 1878. Conforme Lei n° 735, de 03 de março de 1887, foi promulgada em 19 de junho desse ano, regulamento para o funcionamento da Hidráulica. A usina, além da sala das bombas (uma horizontal e uma vertical) com capacidade de 75 m.c. e da sala das caldeiras tinha um local para a oficina de reparação, de um depósito e dependências para pessoal. Uma galeria de cerca de 30 metros liga o poço donde as bombas aspiram a água – ao rio. O combustível (lenhas) para a usina até o ano de 1924 era fornecido pelo Bel. Amarílio Calhao e depois pelo senhor Athanagildo Barreto, vindo as achas da chácara do Pary. A Hidráulica foi extinta em função da criação da EFLA – Empresa de Força, Luz e Água criada pela Lei n° 419 de 18 de setembro de 1951. p. 115). Sobre as adutoras o prefeito Chico Galindo construiu um camelódromo. Um espanto!
MACHINA A VAPOR – Machina Hydráulica adquirida em 1882 pelo valor de 595#320 reis para o abastecimento de água da Capital, conforme Lei 610 de 26 de maio de 1883, pelo presidente da província Thomaz Antônio de Miranda Rodrigues. O serviço hidráulico a vapor ficava instalado à margem esquerda do rio Cuiabá, a montante do Mercado Público do segundo distrito, hoje Museu do rio, no bairro do Porto. Um motor se encontra preservado no Memorial da Água Engº José Luiz de Borges Garcia, no bairro Quilombo, entre as duas estações de tratamento de água.
CACIMBA DO SOLDADO – situado no Largo de Santa Rita, atual Praça Rachid Jaudy, antiga Cacimba do Soldado, onde Antônio Luis Patrício da Silva Manso idealizou fundar um Jardim Botânico, em 1823. O pequeno córrego descia do morrote do “Pai-Hu”, onde havia um minadouro, que deixava correr débil fio de água, que alimentava mais abaixo, na Travessa do Villas Boas (hoje Avenida Ponce), a Cacimba do Soldado. Foi urbanizado em 1909, pelos Intendentes Municipais Avelino de Siqueira e Amarílio de Almeida, com as obras de canalização do Córrego Cruz das Almas até a Prainha, realizada pelos irmãos italianos João e José Sardi, época em que foi construído o mercado municipal, local que se encontra até hoje, cercado com pilastras intercaladas com elegantes grades de ferro vindas da Inglaterra.
Além desses espaços, córregos, ribeirões, poços, rios também compõem o roteiro das águas e suas belezas turísticas. Rogamos que o Planejamento Urbano da cidade faça valer, por meio de Leis e Decretos, a preservação dessas nascentes e, se possível, o retorno em forma de monumentos, em forma de fonte pública ou chafariz.
*NEILA MARIA DE SOUZA BARRETO é jornalista, escritora, historiadora e Mestre em História. É membro da Academia Mato-Grossense de Letras (AML) e do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso (IHGMT).
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