A perseguição do Bolsonaro aos jornais, principalmente à Folha de São Paulo, é inócua, inocente e infantil, mas também é perigosa. Acho que ele compromete a liturgia do cargo colocando-se contra uma empresa e perseguindo-a em flagrante ato de vingança. 

Não que eu defenda a Folha, mas porque o jornalismo, considerado o quarto poder da República, precisa ser preservado como uma defesa imprescindível da democracia. Devo dizer aqui que acho que a Folha passou do ponto na frequência e contundência de algumas críticas contra o Presidente, mas não ultrapassou o limite ético.

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Entretanto a reação do mandatário, que agradou a alguns grupos de seguidores mais fervorosos, foi precipitada e ineficiente. Primeiro no caso de desobrigar as empresas de publicarem seus balanços nos Jornais, visando secar uma das boas fontes de renda dessas empresas. Jair Bolsonaro disse no dia seguinte à edição da MP 892/2019, “ontem, retribuí parte daquilo (com) que grande parte da mídia me atacou”.  Mas o Congresso não aprovou, malogrando a vingança do Presidente.

Nessa sexta (06/12) o Presidente, em mais um dos incontáveis recuos que a intempestividade e o fígado lhe impõem, foi obrigado a cancelar o edital que excluía a Folha de São Paulo da concorrência pública do Governo Federal.  Esses lances de idas e vindas, faz/desfaz, diz/desdiz mostram que o Presidente não tem assessores eficientes, ou, se os têm, não os ouve.

Mas nesse episódio Bolsonaro/Folha de São Paulo chamou-me a atenção a ‘não-ação dos demais órgãos de imprensa no tempo oportuno para defender não da empresa, mas do jornalismo como um todo. Não percebi nos grandes jornais uma posição enfática em defesa da categoria.

Só depois que a medida provisória dos balanços caducou e que comentários do Poder indicavam que o Presidente ia recuar da exclusão da Folha na licitação, articulistas de alguns jornais – não de todos – se manifestam sobre os dois episódios.

Na ocasião da declaração do Presidente que o governo não compraria mais jornais do grupo em questão nenhum concorrente reclamou, e quando o mesmo mandatário pediu aos anunciantes da Folha que deixassem de usar esse jornal para seus comerciais, tacitamente ficaram felizes por ganhar aqueles clientes, esquecendo-se que para ter anunciantes antes precisa conquistar e manter leitores.

Diante desta desunião dos grandes grupos de comunicação não custa lembrar os versos de Bertolt Brecht:

Primeiro levaram os negros/Mas não me importei com isso/Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários/Mas não me importei com isso/Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis/Mas não me importei com isso/Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados/Mas como tenho meu emprego/Também não me importei

Agora estão me levando/Mas já é tarde./Como eu não me importei com ninguém/Ninguém se importa comigo.

Nossa tradição mostra gosto pela censura: o Lula já disse que se arrepende de não ter limitado o poder da imprensa em seu governo; o Bispo Crivella tenta censurar O Globo no Rio de Janeiro e o Bolsonaro se empenha – felizmente sem sucesso – em censurar a Folha.

*RENATO DE PAIVA PEREIRA é empresário e escritor em Mato Grosso.

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A perseguição de Jair Bolsonaro aos jornais, principalmente à Folha de São Paulo, é inócua, inocente e infantil, mas também é perigosa