JOSÉ RICARDO COSTA MARQUES CORBELINO
Estamos acompanhando diariamente nas mídias locais, que o sistema prisional é um dos setores mais debatidos no contexto da justiça e no que se refere ao papel do Estado em garantir a dignidade dos detentos e a eficácia do sistema. A necessidade de um sistema prisional mais cuidado por parte do Estado pode ser abordada sob várias perspectivas, que envolvem desde a infraestrutura até a reintegração social.
No cenário atual, há um grande ‘debate’ envolvendo a permanência ou não dos chamados “mercadinhos” que atendem aos presos.
O supervisor do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário de Mato Grosso (GMF-MT), sob a responsabilidade do ilustre Desembargador Orlando de Almeida Perri, recentemente em entrevista ao Midiajur datado de 09/02 elogiou a decisão do Juiz Anderson Candiotto, da 4ª Vara Cível da comarca de Sorriso ( 420 km de Cuiabá), que impediu a interdição do “mercadinho” que atende aos presos do Centro de Ressocialização de Sorriso (CRS). A sentença contraria a Lei nº 12.792/2025, assinada em 20 de janeiro pelo governador Mauro Mendes, que enrijece os procedimentos de segurança nas penitenciárias de Mato Grosso.
Orlando Perri disse que a manutenção dos “mercadinhos” é uma previsão da Lei de Execução Penal. ” (…) Absolutamente correta a decisão do juiz. É preciso que a sociedade compreenda, e nós procuramos mostrar isso ao governo e aos nossos parlamentares, que o mercadinho tem previsão legal. Não é algo ilegal, imoral. Tem previsão no artigo 13 da Lei de Execução Penal. A lei diz que os estabelecimentos penais podem criar seus mercadinhos para aqueles produtos que não são fornecidos pelo Estado, desde que não sejam proibidos (…)”, explicou o supervisor do GMF.
O decano do TJMT endureceu as críticas ao governo e disse que o estado não tem moral para proibir os “mercadinhos”, pois não tem fornecido o mínimo para que os detentos cumpram as penas com dignidade.
“(…) A verdade é que o Estado não está cumprindo com a sua obrigação de fornecer o mínimo, do mínimo, para que os presos cumpram com dignidade as suas penas. Estão faltando produtos de higiene dentro das unidades. E como é que o estado tem autoridade moral para não permitir a existência de mercadinhos, quando ele não fornece nem quantidade e qualidade suficiente para que os presos possam ter o mínimo de dignidade? Hoje faltam sabonetes, creme dental, aparelho de barbear, produtos de higiene íntimo, como absorventes para as reeducandas, declarou.
Sobre as denúncias de que existem “mercadinhos” paralelos dentro das unidades prisionais, especialmente na Penitenciária Central do Estado (PCE), mantidos pelas faccões criminosas, Orlando Perri disse que se isto acabou desde a operação ‘Agente Elison Douglas’, desencadeada em 2019, mas que se está acontecendo é porque há conivência ou cumplicidade da policia penal.
“Se a polícia penal não permitir, não existe mercado paralelo dentro das unidades prisionais, só se tiver conveniência ou cumplicidade”. De acordo com a legislação, os “mercadinhos” podem ser mantidos por associações de policiais penais ou dos conselhos da comunidade (..)”
A par disso, o sistema prisional deve focar não apenas na punição, mas também na reabilitação. Isso significa fornecer programas de educação, capacitação profissional, e apoio psicológico para os presos. Isso aumenta as chances de reintegração bem-sucedida ao convívio social, reduzindo a reincidência criminal.
A Constituição de muitos países estabelece que os direitos humanos devem ser respeitados em qualquer circunstância. O Estado deve garantir condições mínimas de higiene, saúde e alimentação, além de respeito à integridade física e psicológica dos presos. A superlotação e a violência dentro das prisões frequentemente violam esses direitos e devem ser combatidas.
Sabemos que a superlotação é um problema crônico em muitas prisões. O Estado deve trabalhar para melhorar as condições de encarceramento, seja através da criação de mais unidades prisionais, da utilização de penas alternativas ou da melhoria na aplicação de medidas cautelares (prisão preventiva) para evitar o encarceramento desnecessário.
No mesmo sentido, entendemos que os profissionais responsáveis pela administração das prisões precisam de formação especializada, incluindo em gestão de conflitos, direitos humanos, e atendimento psicológico. Um sistema de prisões bem estruturado também depende de um corpo de agentes bem preparados para lidar com as complexidades do ambiente carcerário.
A transformação de um sistema prisional em algo mais humano e eficiente requer uma abordagem integrada entre políticas públicas, investimentos em infraestrutura, e foco na promoção dos direitos fundamentais de todos os cidadãos, incluindo os encarcerados. Em muitos lugares, as prisões são incapazes de oferecer o mínimo de dignidade, com detentos vivendo em condições insalubres e sem acesso adequado à saúde, educação ou trabalho.
Para se ilustrar, durante o lançamento do Pena Justa, o Presidente do CNJ e do STF, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou “(…) que o sistema prisional necessita de mudanças. Para Barroso, “os presos perderam a liberdade, mas não a dignidade… que as pessoas no sistema prisional não foram condenadas a comer comida estragada, sofrer violências físicas e sexuais, a conviver com todo tipo de doença contagiosa. Se não zelarmos para que voltem melhor do que entraram, vão voltar mais danosas. Não adianta lidar com raiva ou falta de empatia(..)”, disse o presidente da Corte.
Não há dúvida, que a falta de assistência social e psicológica também é um desafio significativo. Muitas vezes, os presos não recebem o apoio necessário para sua reabilitação, seja por falta de recursos do Estado ou pela inexistência de políticas públicas voltadas para a recuperação do detento. Portanto, a falta de programas educativos e de apoio psicossocial impede que muitos detentos consigam sair do ciclo de criminalidade após o cumprimento da pena.
Além disso, a violência dentro das prisões e o controle de possíveis facções criminosas tornam a situação ainda mais crítica. Esses problemas não afetam apenas os detentos, mas têm um impacto na sociedade como um todo, uma vez que a falta de um sistema prisional eficaz não contribui para a redução da criminalidade e dificulta a reintegração social dos ex-presidiários.
Recentemente, a nova Diretoria eleita da OAB-MT, sob a presidência da doutora Gisela Cardoso editou a Resolução nº 034/2025 dispondo da Criação de uma nova Comissão cuja nomenclatura será “Direito Penitenciário, Sistema Prisional e Execução Penal”, o que sem dúvida, estará voltada plenamente a esses temas tão complacentes juntamente com as autoridades competentes e a sociedade em geral, com o cortejo do combativo Vice-Presidente Giovane Santin.
JOSÉ RICARDO COSTA MARQUES CORBELINO – Advogado em Cuiabá e vice-presidente da Comissão de Direito Penitenciário Sistema Prisional e Execução Penal da OAB-MT.
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