Ana Cleide Milhomem é de São Félix do Araguaia (1.209 quilômetros a nordeste de Cuiabá), cidade às margens do belo rio que banha a região leste do estado. Há 13 anos entrou para a Polícia Civil após passar no concurso público para o cargo de escrivã. Sonhava com estabilidade, mas não conhecia nada da profissão e o que a aguardava. Nos primeiros anos pensou por diversas vezes em desistir, diante de problemas como baixo salário, infraestrutura, riscos da profissão e a pouca afinidade com a carreira. Mas, logo de início percebeu o quão nobre é a carreira policial, pois a profissão permite ir além do trabalho burocrático de um cartório da delegacia e exercer uma função social, ajudar a diminuir os problemas das pessoas e contribuir para o bem-estar da sociedade.Em homenagem às quase mil mulheres que fazem parte dos quadros da Polícia Civil – delegadas, escrivãs, investigadoras, psicólogas, advogadas, arquitetas, jornalista, publicitárias, assistentes sociais – conversamos com três delas, que contam a seguir um pouco das suas histórias e relatam o que as fez ingressar em uma carreira repleta de muita adrenalina, emoções e perigo.
“A gente projeta tanta coisa não é?! Mas depois voltei meu pensamento às possibilidades que a profissão nos permite para exercermos cidadania. Lidamos com pessoas em vulnerabilidade social, carentes não somente de segurança, mas de atenção. E não há nada mais gratificante do que podermos ajudar o próximo”, relata a servidora, que faz parte de um quadro composto por 393 mulheres escrivãs, em atuação na instituição em Mato Grosso.
A profissão trouxe muitos momento de emoção, bons e ruins. Se recorda que logo no início atendeu seu primeiro caso de violência doméstica – uma mulher bastante fragilizada com um histórico de violência que havia afetado sua saúde mental. Ana Cleide conta que durante a oitiva, chorou mais que a própria vítima. “Lidamos com pessoas sem amor algum ao próximo, isso me assustava bastante no começo. Mas a Polícia Civil já me proporcionou muitas alegrias, recebi muita demonstração de carinho de pessoas que atendi. Certa vez, uma criança, vítima de abuso, pediu a mãe para levá-la novamente na delegacia apenas para me visitar. Com o tempo fui aprendendo a lidar com essas aflições, hoje me considero mais forte para lidar com o que vivencio no dia a dia da profissão, até mesmo para preservar minha saúde física e mental”, disse.
Ana Cleide destaca ainda que nunca se colocou em posição minorizada por ser mulher. “Já enfrentei situações machistas no trabalho, ouvi piadinhas diversas de colegas, me julgavam muito delicada e associavam isso à fragilidade, mas sempre busquei lidar com sabedoria diante dessas situações. Não é preciso perder a feminilidade para ser uma boa policial, pelo contrário, essa visão feminina é que nós tornam diferentes e melhores. Certas situações no serviço policial requer sutileza, que muitas vezes, só a mulheres possuem, características que superam o uso da força”, pontua a escrivã.
Fascinada por investigação, a cuiabana Ana Carla de Souza Figueiredo afirma que, mesmo diante de situações de discriminação em um ambiente predominado por homens, a mulher sabe se impor e mostrar a que veio. Há 13 anos na Polícia Civil, a investigadora conta que cursava direito quando se identificou com a carreira policial.
Atualmente lotada na Delegacia Especializada de Crimes Fazendários, a policial afirma que a atividade tem momentos marcantes e destaca entre eles a participação em uma investigação de sequestro. “Você acaba vivenciado a aflição da família em querer encontrar seu familiar e é muito gratificante e emocionante ter êxito na investigação. E mesmo diante de todas as dificuldades, limitações e perigos que temos no dia a dia da nossa profissão, nunca pensei em desistir de ser uma policial, porque é uma satisfação fazer o que você gosta. Sou apaixonada pela carreira policial”, afirma Ana Carla, que integra o efetivo junto com mais 493 investigadoras da instituição.
Há um ano e dois meses como delegada, Juliana Rado, 37 anos, cresceu em um ambiente policial. Atualmente exercendo a atividade na Delegacia de Matupá, no norte do estado, ela ingressou na instituição no último concurso público e afirma que papel social da Polícia, especialmente como primeira garantidora dos direitos das vítimas, é um dos estímulos para que seguisse a profissão.
“Estou colhendo frutos de muita dedicação e estudo e me sinto plenamente realizada profissionalmente. A decisão de me tornar Delegada de Polícia foi amadurecida ao longo de anos, mesmo porque cresci no ambiente policial, em razão do meu pai também ser delegado. Portanto, sempre tive ciência das dificuldades da profissão, as quais considero inerentes ao cargo e, assim, procuro manter um ambiente otimista perante a minha equipe”.
Juliana frequentou as aulas do curso na Academia de Polícia aliando os estudos e a gestação e guarda com emoção o momento em foi empossada como delegada, além, é claro, da primeira diligência que conduziu, quando fez a primeira prisão em flagrante. “Na ocasião, compreendi a responsabilidade e a importância da atuação de uma Delegada de Polícia. Considero um privilégio exercermos nosso papel na sociedade!”, finaliza ela, que junto a mais 37 mulheres formam o efetivo feminino de delegadas em atuação na Polícia Civil de Mato Grosso.