Algumas histórias de amor não acabam, mesmo que leve 55 anos para que os enamorados se reencontrem. A artista plástica Mary Porto sabe muito bem disso. Após três casamentos, três filhos e oito netos, aos 74 anos, ela recebeu uma carta de um antigo amor, eles se reencontraram e se casaram.
Mary conheceu Raymond Widmer em Lausanne, na Suiça. Um tinha 18 anos, o outro estava com 19. Após algumas trocas de olhares pelos corredores da escola de artes, começaram a sair.
“Nesse primeiro encontro, falamos sobre minha viagem, o Brasil, arte e música. Ele me perguntou se poderia me chamar de Mitsouko, que era o perfume da Guerlain que eu usava na época. Claro que sim. O passeio virou nossa rotina nas duas semanas que se seguiram”, relembrou Mary à revista Marie Claire.
Todos os dias, segundo ela, Raymond a esperava na porta da classe e, de mãos dadas, descíam as ladeiras da cidade. “Tomávamos um café, ele me levava para a pensão onde eu morava e pegava o trem de volta para casa. Sem tempo a perder, resolvi fazer logo o teste do beijo. Roubei um selinho dele enquanto nos despedíamos. Uma delícia.”
A experiência é descrita por Mary como um sonho, que durou seis meses. “Ele era romântico, atencioso. Um lorde. Mas a comissão brasileira da qual meu pai fazia parte estava voltando ao Brasil e eu precisava acordar. Nunca vou me esquecer do dia em que Raymond me deixou na estação. Parecia cena de filme. O trem seguindo, e eu vendo sua imagem diminuir de tamanho até sumir de vez”,
De volta ao Brasil, a dificuldade em manter a comunição esfriou a relação e o pai Mary a fez terminar com o suíço. Pouco tempo depois, ela reencontrou um amigo de infância, com quem se casou. Já divorciada do terceiro marido, por volta de 2014, Mary recebeu em seu ateliêr uma carta amarela.
“Demorei alguns minutos para abrir a carta. Quando o fiz, o choque: era de Raymond, o suíço com quem havia namorado 55 anos antes. Eu poderia esperar tudo, menos uma carta do Raymond. Durante todos aqueles anos, me perguntava o que teria sido de sua vida”, lembra a artista plástica, que usou o endereço de e-mail descrito no fim da carta para manter a comunicação.
“Estava nervosa demais para escrever qualquer coisa. Mas respirei fundo. Comecei dizendo que, sim, a carta na garrafa havia chegado à praia certa. Depois, questionei o porquê daquele contato após 55 anos. No dia seguinte, recebi a resposta: ‘Porque nunca te esqueci!’. Meu coração disparou. Começamos a conversar virtualmente”, relembrou.
Mary descobriu que Raymond foi casado uma única vez, por 40 anos, e que sua mulher havia morrido de câncer. Um belo dia, enquanto ele arrumava as gavetas, encontrou um insqueiro que a artista plástica brasileira havia lhe dado de presente, em 1958, junto com uma foto. Ele decidiu procurá-la. Por sorte, Mary voltou a usar o nome de solteira, o que facilitou a sua busca. Após um mês de conversa diária, por e-mail e Skype, Raymond “tomou a atitude” que Mary sempre esperou e disse que viria ao Brasil.
Mas o passaporte vencido atrapalhou os planos. “Me ofereci para visitá-lo nas férias de julho. Ele adorou a ideia e disse que poderia me hospedar na casa dele, em um quarto separado, para me deixar confortável. Uma semana antes de embarcar, no entanto, resolvi contar a novidade para meus outros filhos e netos, que acharam aquilo absurdo.”
Apesar do medo, a brasileira seguiu seu coração e voou para a Suíça. “Cheguei ao aeroporto de Zurique e lá estava ele. Casaco preto de couro, cabelo branco… Bonitão, como sempre. Nos abraçamos longamente. Antes de dirigir duas horas para casa, paramos para comer e conversar. Dez dias depois, estávamos na cama e, como um raio, ele se levantou. Nu, sacou um anel e o colocou no meu dedo. Aos 74, eu me casava pela quarta vez”, contou Mary que escreveu junto com Raymond o livro ‘A Carta Amarela’, onde retratam a sua história de amor.