Moradores da comunidade Altos do Ubirajara, em Cuiabá, foram acordados na madrugada desta quinta-feira (7), por viaturas da Polícia Militar. O objetivo era o cumprimento do mandado de reintegração de posse do terreno ocupado por 159 famílias desde 2018. Trata-se de uma área de 9 ha da antiga Gleba Quarta-Feira, que era do Incra, e hoje é reclamada na justiça por um suposto proprietário.

A ordem foi emitida pela juíza da 4ª Vara Cível de Cuiabá, Vandymara Paiva Zanolo e contraria determinação do ministro Luís Roberto Barroso que proíbe despejos e desapropriações no Brasil até o dia 31 de outubro, em razão da pandemia de Covid-19.

A decisão foi tomada no dia 30 de junho na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828. Nela, o ministro ressalta que a nova data determinada evita qualquer superposição com o período eleitoral. Além disso, se baseia nos critérios previstos na Lei Federal 14.216/2021.

Para Barroso, diante do cenário de aumento nos casos de covid-19, em atenção aos princípios da cautela e precaução, é recomendável a prorrogação da medida cautelar, que já havia sido deferida, pela segunda vez, em março deste ano. Ainda segundo ele, com a progressiva superação da crise sanitária, os limites da sua jurisdição se esgotarão e, por isso, é necessário estabelecer um regime de transição para o tema.

O deputado estadual Wilson Santos que acompanha o drama dessas famílias desde a primeira desocupação, em abril deste ano, esteve no local desde às 6h. Cobrou do oficial de justiça, José Wilson, encarregado da ação que todos os protocolos oficiais para este tipo de intervenção fossem cumpridos.

“Não se pode fazer uma desocupação sem que haja um plano de retirada destas pessoas. É preciso que assistentes sociais estejam presentes, que façam o cadastro das famílias com o devido encaminhamento para local seguro, bem como a remoção de seus bens para o local por elas escolhido. Também todo um aparato de segurança e de apoio médico para preservar a integridade de todos os envolvidos: agentes públicos e moradores. O protocolo não foi cumprido à risca”, explicou o deputado.

“Estou com o mandado de revigoramento, o que indica que não é a primeira vez que sai esse mandado. Já havia saído anteriormente e as famílias voltaram para área, por uma decisão que foi revogada e logo após foi desconsiderada. Esse mandado já está comigo há um mês, essa ordem é para ser cumprida e qualquer reversão será feita judicialmente”, explicou o oficial de justiça.

Monique Ângela, que mora no local com o esposo e o filho de três filhos desde o início da ocupação, estava desolada.

“Como vocês estão vendo a minha casa é metade de lona, metade de madeira. Para estar aqui, cada morador teve que suar, carpir, rastelar e fazer o barraco. Isso é muito triste, revoltante, porque se tirar nós aqui eu não tenho para onde ir”, explicou.

Já a moradora Aparecida de Jesus precisou ligar para a filha que ainda estava dormindo para evitar que ela fosse surpreendida com a derrubada do ‘barraco’.

“Ainda de madrugada foi entrando um monte de carro de polícia. Aí eu liguei para minha filha, que estava até dormindo e não estava sabendo do que estava acontecendo. Mandei ela levantar rápido com medo que derrubassem o barraco com ela dentro”, contou.

O presidente da Associação dos moradores da Altos Ubirajara, Valderi Nunes, disse ter sido surpreendido com a decisão, já que a ordem federal os acolhia até 31 de outubro.

“Estamos vendo aqui que a Justiça de Mato Grosso está passando por cima de uma ordem federal, o ministro Barroso determinou que até 31 de outubro não era para haver nenhum tipo de reintegração de posse, então estamos sem entender”, pontuou.

Por volta das 10h20, o comandante da Polícia Militar presente na operação, Cel. Dias decidiu retirar a PM do local e pôs fim a operação. Ele atendeu as indicações do deputado Wilson Santos quanto ao não cumprimento de todos os protocolos. A ação foi encerrada temporariamente, mas pode ser novamente determinada pela justiça a qualquer tempo.

“O grande problema de Mato Grosso é a falta de políticas habitacionais por parte dos governos estadual e municipais. Por isso, estas famílias que não tem onde morar ocupam áreas abandonadas. Apresentei um projeto de lei na Assembleia Legislativa para que o estado desapropriasse esta área, com a devida indenização do suposto proprietário, se confirmada a propriedade, para construir um conjunto habitacional. Não houve sensibilidade por parte dos colegas parlamentares e o projeto foi arquivado”, explicou.

“Não vou desistir desta luta até que o governo ou a prefeitura de Cuiabá tome providências e estas pessoas tenham onde viver com suas famílias. Como parlamentar, esta é minha é minha obrigação”, completou.