GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO

Numa aldeia à beira-mar, havia um pescador sábio chamado Alonso. Em seu rosto vincado pelos ventos do oceano, lia-se a história de anos dedicados ao mar. Mas a sabedoria de Alonso não se limitava a lançar redes e a enfrentar tempestades; sua mente inquiridora ansiava por desvendar os mistérios do mundo e da existência.

Em uma noite de lua cheia, Alonso, contemplando as estrelas, teve uma epifania. Decidiu desvendar o enigma da vida através da experiência única de ser um peixe. Nada o prendia à aldeia senão sua própria curiosidade. Com um suspiro profundo, lançou-se ao mar, abandonando a segurança da terra firme.

Ao mergulhar nas águas salgadas, Alonso sentiu uma metamorfose. Sua forma humana se desfez, dando lugar a escamas cintilantes e nadadeiras delicadas. Tornou-se parte do vasto reino submarino que, até então, apenas vislumbrara de sua embarcação. Era agora um peixe sábio, imerso nos segredos do oceano.

Nadando entre recifes de corais e cardumes coloridos, Alonso absorvia conhecimento como uma esponja. Conversava com golfinhos sobre os mares longínquos e com tartarugas anciãs sobre a passagem do tempo. As profundezas oceânicas eram sua biblioteca, e cada onda um capítulo novo da sabedoria do universo.

Certo dia, durante uma conversa com uma baleia, Alonso indagou sobre o propósito da existência. A baleia, com sua voz profunda e melódica, sussurrou segredos ancestrais.

Contou-lhe que a existência era um ciclo, uma dança eterna entre o ser e o não ser, entre a luz e as profundezas escuras do abismo.

Inspirado por essas palavras, Alonso mergulhou ainda mais fundo, explorando as fendas mais obscuras do oceano. Lá, encontrou criaturas que viviam nas sombras, distantes da luz solar. Questionou-as sobre a natureza do desconhecido, e suas respostas eram como enigmas sussurrados pelo vento submarino.

Contudo, após anos sob as ondas, uma melancolia começou a envolver Alonso. Sentia falta do sol beijando sua pele e do cheiro do sal misturado com o perfume das flores da sua aldeia. A saudade da terra firme tornou-se um canto suave em seu coração de peixe.

Em uma noite estrelada, Alonso decidiu voltar à aldeia. Emergindo das profundezas, sentiu a água escorrendo de suas escamas e, com um sopro, recuperou sua forma humana. A aldeia, que uma vez fora seu mundo, recebeu-o de braços abertos. As rugas em seu rosto agora contavam a história de dois mundos, duas existências entrelaçadas.

Alonso, o pescador transformado em peixe e de volta a homem, tornou-se um sábio ainda mais reverenciado. Compartilhava suas experiências com os habitantes da aldeia, e suas palavras eram como conchas trazidas do fundo do oceano, guardando a música das profundezas.

Assim, Alonso descobriu que o entendimento do mundo não é uma jornada única, mas uma dança incessante entre os elementos da vida. O pescador que se tornou peixe e regressou à sua humanidade ensinou à sua aldeia que a busca pelo conhecimento é tão infinita quanto os mares que abraçam nossas vidas.

Agora, de volta à sua aldeia, sentiu o pulsar da vida ao seu redor e uma inspiração profunda borbulhando em seu peito. Sob o luar que acariciava as águas, ele recitou uma poesia em homenagem à existência, uma canção que reverberava tanto nas profundezas do oceano quanto nas alturas do céu estrelado: Ode à Existência.

Em um barco de pele e ossos lançados,/Nas ondas, mistérios buscava desvendar./Fui pescador, humano, pelo mundo a sonhar,/Mas o oceano sussurrou um chamado./Transformei-me em peixe, escamas a brilhar,/Nos recifes, nos abismos, saberes a encontrar./Com golfinhos e baleias a dialogar,/O segredo da vida fui a desvendar./Nas profundezas, a sabedoria a brotar,/O ser e o não ser a dançar sem cessar./Um ciclo eterno, uma dança a ecoar,/Entre luz e trevas, o universo a pulsar./Mas a saudade da terra começou a soar,/Dos raios de sol, do perfume a flutuar./Decidi emergir, meu destino a mudar,/De peixe a homem, ao lar a retornar./A aldeia, meu porto, a me esperar,/Com sorrisos, com lágrimas a rolar./As rugas, testemunhas, histórias a contar,/Do pescador que ao oceano foi se entregar./A existência, poema que nunca cessa,/Entre as ondas e as estrelas a se entrelaçar./Cantarei, em versos, a vida a celebrar,/No eterno balé da existência, a realidade a considerar.

(*) GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO tem formação em Filosofia, Sociologia e Direito, e escreve em A Gazeta.

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