Paulo Mariano, massagista do Náutico, passou os últimos 23 dias no Centro de Triagem Professor Everardo Luna (Cotel), presídio de Abreu e Lima, Região Metropolitana do Recife. Durante esse período, seu contato com o mundo exterior era mediado apenas pelos advogados.
Ele não pôde ver a esposa, os pais e os filhos pequenos, já que as visitas presenciais de parentes estão suspensas em Pernambuco, como forma de evitar o avanço da Covid-19. Paulo classifica o tempo preso como uma “humilhação”.
E tudo isso aconteceu sem que ele soubesse por que estava preso.
— Nunca imaginei (ser preso). Desde os 17 anos que eu trabalho. Nunca sonhei pisar nesse lugar. É um sofrimento que só Deus sabe, diz.
O massagista volta ao trabalho no Náutico na segunda-feira diferente do que era quando deixou o mesmo local no dia 24 de fevereiro. Agora, Paulinho tem lembranças ruins que nunca vai esquecer. Mas recuperou a liberdade e tem o desejo de provar sua inocência e conseguir a absolvição.
A prisão
O massagista afirma ter sido pego de surpresa quando, no último dia 24 de fevereiro, soube que havia policiais à sua procura. Antes de ir ao CT do Náutico, os agentes foram ao Sport, onde ele já trabalhou, para encontrá-lo. Lá, foram informados que Paulo havia mudado de clube e passado do Leão para o Timbu. Amigos dele da época rubro-negra ligaram para Paulinho, que estranhou, mas decidiu permanecer onde estava.
Afinal – ele jura – não tinha nada a esconder.
Mas, uma vez que os policias chegaram ao CT alvirrubro, Paulinho foi preso, acusado de participar de um assalto a ônibus em 25 de dezembro de 2018, e levado ao Cotel.
Libertado depois de 23 dias, ele garante que nem sabia a razão de ter sido preso. Além disso, o massagista sustenta que não tem nenhuma relação com o crime, versão defendida também pelos amigos e pela família. Nas redes sociais de Paulinho, há fotos postadas no natal de 2018 que reforçam a tese de que ele estava em casa, com parentes e colegas, no dia do crime.
Em nota, a Polícia Civil informou que a investigação foi conduzida de forma imparcial, observando critérios técnicos e elementos probatórios e que a identificação da autoria do crime foi feita por meio de depoimentos, reconhecimento por parte de envolvidos e vítimas. Após a conclusão, o inquérito policial foi remetido ao Ministério Público de Pernambuco, que se posicionou e o encaminhou ao Poder Judiciário, responsável por determinar a prisão preventiva de Paulo.
Paulo Mariano é massagista do Náutico — Foto: Arquivo pessoal
A defesa do massagista, no entanto, aponta que a investigação cometeu sérios erros e que, por conta deles, cometeu uma injustiça e prendeu a pessoa errada.
Segundo os advogados de Paulo Mariano, ele foi confundindo com outro homem, de nome Mariano, este sim o autor do crime, apontado por um menor de idade que também participou do assalto na comunidade de Joana Bezerra, Região Central do Recife.
— Quando o menor, praticante do crime, foi preso falou de Mariano. O que diz o relatório policial é que, através de rede social, se viu que Paulo Mariano teria amizade com pessoas da comunidade de Joana Bezerra. Então, logo, o relatório concluiu que o Mariano que o menino citava seria o Paulo Mariano — explicou a advogada Virgínia Kelle, uma das defensoras do massagista.
Para a defesa, a confusão do nome não foi a única da investigação. A Polícia também teria comparado as imagens do assalto ao ônibus com fotos das redes sociais de Paulo. Na visão dos advogados, a pessoa que aparece no vídeo fazendo o assalto não é Paulinho, nem parece com ele.
— (O Assalto) Foi em dezembro de 2018. No ano seguinte, o delegado, que nada produziu de provas, chegou até um DVD que foi fornecido pela própria empresa. As imagens do circuito interno do ônibus mostram que nenhuma das quatro pessoas que efetuam esse roubo se trata de Paulo. Isso está muito claro na imagem, que é pública e está nos autos do processo. A pessoa que aparece na imagem como sendo ele em nada tem a ver com Paulo, que estava com sua família. Existem registros fotográficos em redes sociais.
O relatório policial, a que a reportagem do ge teve acesso, menciona que Paulo foi identificado como um dos assaltantes pelas vítimas. Para obter essa resposta, a Polícia Civil mostrou às pessoas uma foto do RG do massagista, que constava nos sistemas da Secretaria de Segurança do estado.
Mas representantes da Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco (OAB-PE) questionam acusações sustentadas em reconhecimento fotográfico.
— O reconhecimento facial, da forma que vem acontecendo é inválida, é ilegal. Precisa ser retirada do processo. Nenhuma prova desse tipo pode ser induzida a integrar um processo criminal, diz Anna Beatriz Silva, vice-presidente da comissão de advocacia popular da OAB-PE.
Paulo Mariano diz ter sido confundido — Foto: Arquivo pessoal
— (Reconhecimento por foto) É até perigoso, porque ele depende do tempo do fato. Se o fato ocorreu há muito tempo, a pessoa não tem mais memória sobre o ocorrido. Se a pessoa da foto é parecida, ela não está vendo pessoalmente, a pessoa é levada a crer que foi aquele que cometeu o crime contra si. Há a possibilidade de o criminoso estar disfarçado. Isso também interfere, além do próprio nervosismo da vítima submetida a um assalto. A memória é falha. Por isso a lei exige esse reconhecimento descritivo, depois presencial e por último a lavratura com testemunhas. Nada disso foi feito nesse caso que estamos analisando.
Luta agora é para provar inocência
A prisão de Paulinho mobilizou os clubes de Pernambuco na última semana. Não só o Náutico. É que a família dele é toda envolvida com o esporte: o pai é massagista no Santa Cruz. O irmão faz a mesma função nas categorias de base do Sport.
Jogadores do Leão, da Cobra Coral e, claro, do Timbu, foram às redes sociais pedir a liberdade de Paulinho, assim como torcedores das equipes.
Coincidentemente ou não, na última quinta-feira, a Justiça aceitou o habeas corpus da defesa e revogou a prisão preventiva. Paulinho foi solto, no dia seguinte, a sexta, recebido pela esposa, Amanda Araújo, e foi direto para casa, onde reencontrou amigos e o pai, Paulo Fernando, em fase de recuperação de uma cirurgia no coração. (Globo Esporte)