O celular cismava em não marcar os dois tracinhos na mensagem. Naquele dia, Luisa Stefani dormia tranquila, sem imaginar o desespero de outra tenista no outro lado do mundo. Àquela altura, Laura Pigossi já sabia que o improvável havia acontecido e que as duas iriam às Olimpíadas de Tóquio. Mas faltava a amiga dizer sim…
– Soube antes dela, e ela estava dormindo e não acordava. Eu tentando ligar, ela não acordava, e eu tinha que jogar semifinal. E esse aqui (Eduardo Frick, gerente da Confederação Brasileira de Tênis) me ligando. Eu falava: “Não, vou jogar a semifinal e depois te ligo”. E ele falou “Não, é agora, é urgente”. Pensei que tivesse algum torneio novo no Brasil. Nem sabia que a gente estava inscrita, não sabia que ia ter chance de a gente entrar. Fiquei sem chão.
– Nada me tira do sono – devolveu Luisa, rindo.
Luisa Stefani e Laura Pigossi vão buscar uma medalha nas Olimpíadas de Tóquio — Foto: REUTERS
No fim das contas, tudo se ajeitou. No limite do tempo, Luisa e Laura ficaram com a vaga na chave de duplas femininas nas Olimpíadas de Tóquio. Agora, as duas têm a chance de um feito histórico. As brasileiras estão nas semifinais dos Jogos. Nesta quinta-feira, vão encarar as suíças Belinda Bencic e Viktorija Golubic. Uma vitória garante a medalha e a colocam na briga pelo ouro em Tóquio.
Há pouco mais de 15 dias, porém, elas sequer imaginavam estar em Tóquio. A história da vaga beira o acaso. Eduardo Frick inscreveu as duas na lista de espera por um lugar na chave olímpica. Luisa é a 23ª do ranking mundial de duplas, a melhor brasileira da lista. À época da inscrição, Laura era apenas a 190ª, mas já era a segunda melhor do país. Para que fossem a Tóquio, só com muita sorte. Mas o gerente da CBT quis arriscar. E a sorte bateu…
– A gente é do tênis, sabe que para jogar um torneio tem que estar inscrito, esse é o básico. Se não está inscrito, não joga. Foi o que fizemos. O que dizia quando a gente fez a inscrição: nós tínhamos que juntar nossas duas melhores jogadoras, com melhor ranking. E as nossas duas melhores jogadoras eram a Luisa, 23ª, e a Laura, 190ª. Essa foi a inscrição feita no dia 22 de junho. E eu sabia que o último dia que a lista poderia ter uma alteração era 16 de julho. E foi o que ocorreu. No dia 16 de julho, a ITF me liga pela manhã e diz que, com as realocações, as meninas tinham entrado. Esse foi o grande “X” da questão. Teve uma dupla da Geórgia que reclamou. Elas tinham um ranking melhor que as meninas, mas não fizeram a inscrição. Paciência, nós que entramos e deu tudo certo – diz Frick.
À época, Luisa estava nos Estados Unidos, onde mora. Laura, no Cazaquistão, jogando um torneio. No meio do caminho entre elas, Frick não saiu do celular na tentativa de fazer a ponte. Tinha poucas horas para confirmar a inscrição nos Jogos.
– Eu estava em casa, já tinha deixado para lá das Olimpíadas. Queria muito ir, mas era o último dia para se retirarem. A gente estava fora na lista, e eu já tinha aceitado, estava torcendo para os outros brasileiros. Só que a lista rodou. Foi um sentimento incrível. Uma das primeiras pessoas que eu liguei foi a Laura, e a gente estava gritando no telefone. E o resto é história – disse Luisa, que, ao contrário de Laura, já sabia que havia sido inscrita para os Jogos.
Luisa e Laura não formam uma dupla constante no circuito, mas se conhecem desde meninas. De memória, apenas três torneios juntas. O entrosamento, mesmo assim, não demorou a vir. Em Tóquio, passaram por candidatas ao ouro, como as americanas Bethanie Mattek-Sands e Jessica Pegula. Para irem à semifinal, precisaram de uma virada contra as rivais, depois de perderem o primeiro set por 6/1.
– Entrosamento a gente sempre teve, conheço a Lu desde os meus 12 anos. A gente sempre foi muito amiga fora da quadra. Vira e mexe ela vai para Barcelona ficar na minha casa e ficamos a semana treinando juntas, então acho que isso é um pouco relativo. A gente chegando aqui teve que sentar e conversar o que cada uma faz de melhor para tentar coordenar melhor. Dessa vez, a gente conseguiu se encaixar um pouco mais, cada uma aceitar o seu papel, e tentar sempre puxar, trazer o melhor da outra no seu próprio jogo. É uma tentar jogar de uma maneira para trazer a outra para o jogo, esse é mais ou menos o nosso lema. Em alguns dias aqui a gente conseguiu treinar, ajeitar isso – afirmou Laura.
Agora, estão a dois passos de um objetivo que parecia improvável, mas que a sorte tratou de tornar possível.
– É sempre uma honra jogar pelo Brasil, acho que a gente joga com alma e coração. Desde o começo estamos falando queremos levar essa medalha para o Brasil. E é não qualquer medalha, a gente quer a de ouro – disse Laura.