Com a necessidade de inclusão e do reconhecimento da neurodivresidade foram alguns dos temas debatidos nesta terça-feira (5), último dia II Simpósio Estadual de Autismo, no Teatro do Cerrado Zulmira Canavarros, na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT).
“Infelizmente a inclusão ainda não é uma realidade em Mato Grosso”, disse a representante da ONG Ação Azul, em Cuiabá, Juliana Fortes. No foco, a falta de assistência médica hospitalar para portadores do Transtorno do Espectro Autista (TEA).
“Quase não há neurologista e psiquiatras suficientes na rede público do estado de Mato Grosso. As mães estão em desespero, quando conseguem uma consulta é um retorno dado a cada seis meses. Para as famílias de baixa renda que não tem condições de pagarem por um plano de saúde a situação é trágica”, pontuou Juliana.
No Brasil ainda não há um estudo detalhado e oficial que mostre a quantidade de pessoas com TEA. Pesquisas americanas dizem que a cada 44 nascimentos, uma traz uma pessoas com TEA. Baseado nesta realizada, supõe-se que em Mato Grosso vivam cerca de 100 mil autistas.
Maria Auxiliadora é mãe de um autista, de 32 anos. Ela conta que descobriu o autismo quando o rapaz tinha 23 anos e que ainda luta para que o filho tenha acesso à saúde e educação especializada na rede pública.
“Nossa sociedade precisa ser alertada sobre o autismo e dos direitos destas pessoas. O simpósio tem papel fundamental neste sentido, já que muita gente não sabe o que é o TEA e por isso mesmo não tem condições de identificar casos dentro de suas famílias ou em grupos sociais. Precisamos desmistificar o tema e mostrar que pessoas com TEA podem sim ter uma vida social”, disse.
Independência na vida adulta
A psiquiatra Aline Quintal, professora da UFMT, falou sobre os desafios da vida adulta para este grupo.
Segundo ela, muitas pessoas mascaram sintomas para tentar se enquadrar a padrões sociais por medo do Bullying. Além disso, a falta de oportunidades de trabalho na vida adulta, ansiedade, depressão, isolamento são apontados como aspectos provocados pela falta de políticas públicas que garantam qualidade de vida aos portadores do TEA.
A cantora Kátia Alencar descobriu o TEA já na fase adulta. Depois de sofrer muita pressão em vários aspectos, chegou a ingressar na faculdade, mas abandonou o ensino superior quando descobriu na música uma nova oportunidade de vida.
“Tive o diagnóstico tardio, mas por mais que tenha sido tardio, quando o recebi foi um grande alívio para mim. Eu tenho orgulho de ser autista porque se eu não fosse não seria quem eu sou hoje. Não acredito que ser autista seja um problema. Deus não errou comigo, ele sabia que me trazer para esse mundo na forma como eu sou era um jeito de me fazer contribuir de muitas maneiras”, afirmou.
Dimitri é um outro exemplo. O rapaz é o primeiro autista brasileiro piloto de kart. O transtorno não o impede de conquistar seus sonhos. Realidade confirmada pela mãe que sempre acreditou e apoiou o filho em suas escolhas.
“Precisamos que a sociedade, legisladores e gestores públicos conheçam o autismo. Isso é fundamental porque cada vez mais autistas diagnosticados precisam ser inseridos na educação, na saúde e no mercado de trabalho. Este seminário tem papel fundamental nesta discussão. Lugar de autista é em todo lugar”, disse Eliane Fernandes, conhecida como Branca.
Dimitri convite os participantes para sua próxima corrida que será pela bandeira da inclusão, no dia 24 de abril, às 9h, no kartódromo de Várzea Grande.
O evento
O II Simpósio sobre Autismo em Mato Grosso foi realizado nos dias 4 e 5 de abril, na Assembleia Legislativa. É uma ação do mandato do deputado estadual Wilson Santos (PSD) que contou com o apoio do presidente da casa de Leis, Eduardo Botelho (UB) e da primeira vice-presidente, a deputada estadual Janaina Riva (MDB).
O tema deste ano foi “A interseção entre a Saúde e Educação e o reconhecimento da Neurodiversidade no processo de inclusão”. Entre os palestrantes, Marta Relvas, doutora e mestre em psicopedagogia e especialista em psicanálise e em bioética; Eugênio Cunha, doutor em educação, psicopedagogo e jornalista; e Adilson Souza, psicólogo clínico e escritor.
O Simpósio teve como ponto de partida o princípio constitucional de assegurar a todos e a todas a igualdade de condições de acesso à saúde e à educação; o que ainda não é realidade para milhares de crianças, jovens e adultos do TEA no Brasil.
“A inclusão social tem sido uma das bandeiras do meu mandato. No ano passado, realizamos o 1º Simpósio sobre Autismo e agora a segunda edição. Estudos do CDC (Center of Deseases Control and Prevention), órgão ligado ao governo dos Estados Unidos, mostram que há um caso de autismo entre cada 110 pessoas. Portanto, estima-se que no Brasil existam cerca de 2 milhões de autistas. Precisamos discutir políticas públicas para que estas pessoas sejam tratadas com dignidade e respeito e que tenham seus direitos garantidos. Este é o papel do Simpósio”, disse o deputado Wilson Santos.
Transtorno do Espectro Autista
Transtorno do espectro autista (TEA) se refere a uma série de condições caracterizadas por algum grau de comprometimento no comportamento social, na comunicação e na linguagem, e por uma gama estreita de interesses e atividades que são únicas para o indivíduo e realizadas de forma repetitiva.
O TEA começa na infância e tende a persistir na adolescência e na idade adulta. Na maioria dos casos, as condições são aparentes durante os primeiros cinco anos de vida.
Indivíduos com transtorno do espectro autista frequentemente apresentam outras condições concomitantes, incluindo epilepsia, depressão, ansiedade e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).
O nível de funcionamento intelectual em indivíduos com TEA é extremamente variável, estendendo-se de comprometimento profundo até níveis superiores.
Principais fatos
De acordo com a Opas (Organização Pan-Americana de Saúde), embora algumas pessoas com transtorno do espectro autista possam viver de forma independente, outras têm graves incapacidades e necessitam de cuidados e apoio ao longo da vida.
Intervenções psicossociais baseadas em evidências, como o tratamento comportamental e os programas de treinamento de habilidades para os pais, podem reduzir as dificuldades de comunicação e comportamento social, com impacto positivo no bem-estar e qualidade de vida das pessoas com TEA e seus cuidadores.
Em todo o mundo, as pessoas com transtorno do espectro autista são frequentemente sujeitas à estigmatização, discriminação e violações de direitos humanos. Globalmente, o acesso aos serviços e apoio para essas pessoas é inadequado.