Uma companhia aérea brasileira foi condenada a indenizar em R$ 34 mil um atleta que teve seus equipamentos de competição internacional extraviados. Por unanimidade, a Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) considerou que a falha na prestação de serviços da empresa ocasionou abalo psicológico e gastos extras.
O julgamento do Recurso Apelação Cível feito pela empresa ocorreu no último dia 16 de julho, com publicação do acórdão nessa segunda-feira (23).
O atleta mato-grossense tinha planos de participar da competição internacional de ciclismo,‘L’Etape du Tour de France 2022’, em Milão. Ele acabou tendo que adquirir novos materiais e equipamentos.
Com passagens de ida (26 de junho) e volta (16 de julho) compradas, o atleta foi surpreendido com a notícia de extravio de sua bagagem ao chegar ao destino, no dia 30 de junho de 2022. Nas malas estavam todos os acessórios e vestimentas indispensáveis para o evento, que só foram devolvidas em 8 de agosto do mesmo ano, após o seu retorno ao Brasil. Ao todo, foram 39 dias sem bagagem.
O transtorno deu origem a uma ação civil, com pedido de indenização por danos moral e material, que foi julgada parcialmente procedente pela 5ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá. No julgamento, ficou determinado que a companhia aérea deveria ressarcir o atleta por danos materiais em R$ 14.562 e pagar R$ 20 mil a título de indenização por danos morais.
Na ação, o atleta também havia solicitado indenização pela perda de uma chance, pois não teve um bom desempenho na prova devido aos equipamentos comprados emergencialmente, o que foi negado pelo magistrado.
A companhia aérea recorreu da sentença em recurso de Apelação Cível, analisado pelo desembargador João Ferreira Filho, relator do caso.
No pedido, a defesa da empresa apontou controvérsia na aplicabilidade da Convenção de Montreal. Isso, porque conforme a Constituição, as normas e os tratados internacionais, como a Convenção de Montreal, limitam a responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros e têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor.
Para o magistrado, o pedido de condenação em dano material não foi fundamentado no extravio da bagagem em si, mas na necessidade de o autor adquirir roupas e acessórios para participar da competição de ciclismo. “O que afasta a aplicação da Convenção de Varsóvia e de Montreal”.
A defesa também alegou que o extravio da bagagem ocorreu durante voo operado pela Air France. Dessa forma, não poderia ser responsabilizada pelos danos causados de falha no serviço prestado por outra companhia aérea.
O argumento foi invalidado pelo relator do recurso, que destacou que a empresa aérea era a transportadora contratual, e que, nos termos dos arts. 41 e 45 da Convenção de Montreal, ela é parte legitima e solidariamente responsável pelos danos sofridos pelo passageiro durante todo o trajeto da viagem contratada.
“O fato de a falha na prestação do serviço danoso ter ocorrido em voo operado por outra companhia aérea é absolutamente irrelevante, não afasta a sua responsabilidade. Na qualidade de parceira na operação de voo internacional, a Air France integrou o contrato de transporte por ela firmado com o autor/apelado. Por esse motivo, eventuais danos causados a este em qualquer trecho implicam na responsabilidade solidária da empresa, eis que integrante da cadeia de fornecimento do serviço”.
No pedido final, a empresa requisitou a reforma da sentença ou, ao menos, que fosse afastada a condenação indenizatória por danos morais, ou, no mínimo, reduzido o valor indenizatório.
Ao analisar o recurso, o desembargador ficou convencido de que não havia dúvida quanto à caraterização do dever indenizar por danos morais. “A situação discutida na lide importou em aflição, ansiedade, frustração, raiva e revolta, enfim, em abalo psicológico ao autor, ultrapassando o mero contratempo aceitável nesse tipo de relação comercial”.
Já quanto ao valor da indenização, o magistrado lembrou que a quantificação do valor indenizatório é baseada na análise crítica e cuidadosa do conjunto de circunstâncias.
Segundo o relator, o valor indenizatório deve ser arbitrado em montante suficiente para desencorajar a reincidência de ofensas semelhantes.
“Sopesada a condição econômica e social dos envolvidos; a gravidade potencial da falta cometida, com especial enfoque no fato de que o conteúdo da bagagem diretamente relacionada ao objetivo da viagem; e o caráter coercitivo e pedagógico da condenação indenizatória, admito que mereça ser confirmada a quantia fixada na sentença (R$ 20,000,00), esta que se revela razoável e ajustada às particularidades e circunstancias do caso concreto, atendendo satisfatoriamente o caráter disciplinar e ressarcitório da condenação, além de ser compatível com valores normalmente arbitrados por este Tribunal para situações parecidas. Pelo exposto, desprovejo o recurso”.
fonte: GD