O Brasil é o país com o maior número de jogadores no futebol ucraniano, com 30 atletas só na primeira divisão. O Shakhtar, um dos principais times do país, tem 12 brasucas no elenco. E entre eles estava Junior Moraes, que foi fundamental para fuga de vários jogadores e seus familiares de Kiev em meio à guerra com a Rússia.
Em entrevista exclusiva ao Esporte Espetacular, Junior Moraes, que chegou ao futebol do país em 2012 e que se naturalizou ucraniano em 2019, fala sobre os momentos de tensão para deixar a capital ucraniana e a angústia pela invasão ao país que ele passou a amar.
Com o domínio da língua local, Junior Moraes tomou a frente das decisões do grupo de quarenta pessoas que estava em um bunker de um hotel em Kiev tentando deixar o país em meio à guerra.
– Eu tive a opção de sair sozinho. Um amigo muito influente do país me chamou e falou: “Junior você tem um carro, está disponível, está pronto, vai pegar você e vai levar para fronteira para você sair”. Mas, cara, agradeci e disse que iria continuar com todos até todo mundo sair – contou o santista Junior Moraes, de 34 anos e revelado para o futebol no Santos em 2007.
Importância da Ucrânia
A Ucrânia faz a maior parte da minha história, né? Meus filhos vivem a Ucrânia mais do que qualquer outro país. Os amigos, escola, relacionamento, tudo… A maior parte da minha vida profissional também, família, muitos amigos, muito próximos, então, a Ucrânia significa muito para mim.
Choque com a guerra
Eu na verdade eu ainda não consegui assimilar tudo que está acontecendo. Ainda parece que é um pesadelo. Qualquer hora eu vou acordar disso, porque teve muita coisa que eu vi sendo construída e depois destruída… Na minha cabeça, assim, tem um vídeo que é muito claro, foi um dos que mais me machucou. De uma praça em Harkovich – um prédio governamental – que quando eu ia jogar lá eu gostava de ir naquela praça para poder tomar um café, caminhar um pouco… E um míssil pegou ali no prédio e destruiu tudo. Cara, me vi andando ali um pouco antes do míssil chegar, sabe? Fiquei imaginando: eu poderia estar ali… É muito, muito estranho ainda. Eu não consigo explicar muito bem o que eu sinto.
Ajuda aos brasileiros
Acho que, na vida, o ser humano vale mais do que qualquer outra coisa, do que uma profissão, no caso o futebol ou qualquer parte de política, qualquer interesse, de qualquer outra coisa. E nessa guerra a gente vê muita morte, muita coisa feia. E quando você ajuda a salvar uma vida, você se sente melhor. Me dá um conforto, porque por outro lado a gente não consegue relaxar enquanto não parar essa guerra… Então isso (ajudar pessoas) me deu um alívio e meu coração se encheu de força para continuar.
Minha cabeça só focou em tirar as pessoas dali. Tinha recém-nascido de quatro meses com a gente, tinham três bebezinhos com a gente, tinham mais quatro crianças – entre três e cinco anos – tinha gente de idade, mãe de jogadores, babá, tinha gente de idade… A gente não poderia ir para qualquer estação de trem, qualquer lugar, passar frio, andar cinquenta quilômetros ou fazer qualquer loucura assim.
Jogadores brasileiros deixam bunker de hotel em Kiev — Foto: REPRODUÇÃO/INSTAGRAM
Momento tenso
Na madrugada de sábado – sexta para sábado – alguns jogadores, que já estavam começando a ficar em pânico – no caso os mais jovens – tentaram fugir, tentaram sair de manhã cedo. Eles foram para porta do hotel para ver como estava a situação, para ver se estava ok para eles poderem sair. Mas quando chegaram lá (suspiro) começaram algumas explosões e foi isso que os salvou. Acho que foi isso que salvou a vida deles. Porque eles ficaram assustados e voltaram para dentro.
Futuro
Meu presente hoje é ajudar as pessoas a parar essa guerra. é salvar vidas, tentar salvar vidas . é tentar dar suporte para as pessoas que estão lá. Não consigo pensar no futuro agora.
Junior Moraes comemora seu gol no empate entre Ucrânia e Finlândia — Foto: Stanislav Vedmid/Getty Images
(GE)