Em meio à crise financeira e à fase ruim do Cruzeiro em campo, o presidente Sérgio Santos Rodrigues encara também questionamentos internos. Nessa quarta-feira, pouco mais de 110 pessoas, entre conselheiros e associados do clube, protocolaram, junto ao conselho deliberativo, um pedido conjunto de impeachment do mandatário, que caracterizou o documento como “peça de comédia” e “ridículo”.
O ge apurou que, preliminarmente, o pedido não deverá ter prosseguimento, pois os elementos citados na peça são considerados “insuficientes”. A reportagem teve acesso ao documento, no qual o grupo cita que “atos irracionais” de Sérgio ocasionaram afastamento de apoiadores, patrocinadores, atletas, funcionários e torcedores. Nagib Simões, presidente do conselho deliberativo, confirmou à reportagem que já está com o pedido em mãos.
Entre os casos citados de atos estão: a demissão de Felipe Conceição, a qual o clube declarou ter sido em comum acordo, mas o profissional alegou ter sido demitido, o que impossibilitaria o Cruzeiro de contratar um novo treinador, caso Mozart seja desligado do cargo. A contratação do atual comandante foi caracterizada pelo grupo como um “impulso de imaturidade e inexperiência” de Sérgio.
As punições por dívidas em processos na Fifa também são citados pelo grupo. Um deles foi a proibição de realizar contratações, ano passado, pelo não pagamento da dívida pela compra do atacante Willian. À época, Sérgio Rodrigues chegou a anunciar que havia chegado a um acordo com o Zorya pelo acerto, o que não ocorreu. O clube celeste alegou má-fé por parte dos ucranianos.
O clube pagou a dívida em outubro de 2020, voltou a poder contratar, mas este ano foi punido novamente com o “transfer ban”, mas em função da dívida pela compra de Arrascaeta, em 2015. O caso também é citado. O grupo cita que o presidente não tem esboçado uma tentativa para solucionar os problemas financeiros do Cruzeiro.
Ano passado, ainda sob comando do conselho gestor, o Cruzeiro perdeu seis pontos na Série B por uma dívida referente ao empréstimo do volante Denilson, em 2016. A dívida ainda não foi paga, o processo segue transitando na Fifa.
A entidade vai dar novo prazo para pagamento e, se não ocorrer, há possibilidade de rebaixamento à Série C. Os conselheiros citam que Sérgio Rodrigues não mostra projetos para quitar o valor, com uma postura “absolutamente temerária”. Entretanto, o presidente já citou que aguarda a venda da sede Campestre II para quitar o débito.
Sergio Santos Rodrigues, presidente do Cruzeiro — Foto: Gustavo Aleixo/Cruzeiro
A interrupção no fornecimento de luz, em parte da Toca da Raposa I, a mudança da sede administrativa para um coworking, os atrasos salariais constantes, a falta de manutenção em sedes sociais e a contratação de Rodrigo Pastana também são citadas, no documento protocolado no conselho deliberativo, como motivo para aceitação da abertura de processo.
Para embasar o pedido de impeachment, o grupo também alega quebra de decoro por parte de Sérgio Santos Rodrigues, utilizando como exemplos os áudios vazados com ameaças a torcedores. O documento também cita descompromisso de Sérgio para analisar as contas de Gilvan de Pinho Tavares, ex-presidente do clube, ao qual o grupo cita que “há grandes indícios de proximidade e vínculo” com o atual mandatário.
O grupo também alega que Sérgio Rodrigues não está enviando as documentações necessárias para que o conselho fiscal realize o trabalho que lhe é de direito, além de citar a investigação da Corregedoria da Polícia Civil por possível influência de Sérgio na reabertura de inquérito com fins políticos.
O que diz o presidente?
Em entrevista à Rádio 98FM, na tarde desta quinta-feira, Sérgio Santos Rodrigues falou sobre o pedido de impeachment, ao qual tratou como “peça de comédia”
“Em relação ao pedido, eu acho que, sinceramente, é uma peça de comédia, não jurídica. Para não dizer outra palavra, além da má intenção e de querer tumultuar, foi feito de uma forma nada inteligente. Os tópicos que estão ali colocados… sinceramente, se não fosse o motivo, e eu acho que não temos motivos para rir, (o pedido) era de rir”
Sérgio disse que teve acesso ao documento e questiona todos os motivos citados como suficientes para um pedido de saída do presidente. Ele diz também que a assinatura dos conselheiros e associados não representam a torcida do Cruzeiro e nem sequer os frequentadores dos clubes sociais.
– Eu tive acesso. Demissão do Felipe Conceição. Isso é motivo? Sendo que não foi demissão, já foi explicado mil vezes. Mudança de sede para gerar economia? Isso é numericamente comprovado. Afastamento de patrocinador, que inclusive estava com a gente hoje? A gente tem batido papo. Corte de luz, que a CEMIG disse que fez errado? É ridículo, é movimento feito por poucos.
“(…) Agora, uma manifestação que me disseram ser de 200 pessoas, e eu acho que não deu isso… mesmo que sejam 200, o Cruzeiro tem nove milhões de torcedores. Só frequentadores de clube, se a gente for citar, são 12 mil. Va ser sempre isso. AÍ espalham faixas, tiram fotos e dizem que é a torcida, mas, sinceramente, não representa”
Felipe Conceição Cruzeiro — Foto: Bruno Haddad/Cruzeiro
Em relação aos questionamentos sobre as contas não entregues ao conselho fiscal, Sérgio Rodrigues cita o portal de transparência do Cruzeiro e diz que alguns documentos não estão prontos em função do que a gestão dele teve que ajustar em relação às gestões passadas.
– Sobre transparência, nós temos o portal da transparência que você pode comparar com outros clubes, e eu acho que não deixa nada a desejar. Algumas vezes têm reclamações sobre as doações que não estão sendo atualizadas, mas a gente pede para que sejam atualizadas diariamente. Todos os documentos estão lá. Não vejo uma vírgula sobre transparência para dizerem hoje que a gente não faz, que a gente não mostra.
“Nosso conselho fiscal está aqui pedindo documentos. Há algumas coisas que não estão prontas, diante de ajustar a bagunça que tivemos que ajustar de muito tempo. Balancete acho que estamos fechando o de março agora, mas estamos disponibilizando tudo. Tudo a gente explica. Acho que é muito mais o recalque de quem queria estar aqui e não teve como chegar pelas vias legítimas”
Em relação às dívidas, citadas no documento, Sérgio Rodrigues questionou o fato de os culpados pela origem dos débitos não serem cobrados no pedido de impeachment.
– Sobre dívidas, então o culpado porque não pagou sou eu? Mas, e quem contraiu a dívida? Não tem manifestação contra? Vi alguns comentários sobre pessoas que trouxeram os jogadores que hoje trazem esse problema, então a culpa é minha? Eu herdo R$ 50 milhões em dívidas, não consigo pagar porque não há arrecadação, aí a culpa é de quem contrai ou de quem não paga? Coincidente, quem contraiu não aparece nesse manifesto. A culpa é sempre nossa depois. (…) Eu não tenho medo das porradas que a gente toma, mas sim dos tapinhas que a gente tomou no começo, quando estava tudo bem. Agora que não está tudo bem, está todo mundo correndo, a gente não presta, mas no final a gente vai prosperar. Mas, graças a Deus, nós identificamos quem são essas pessoas e eles nunca mais voltam e vão ter que trabalhar o mesmo caminho que eu trabalhei. (…) Que conquistem seu espaço, porque na briga, na porrada e na gritaria não vão vir não. (Globo Esporte)