No dia em que a Ponte Preta, que se considera a primeira democracia racial do futebol brasileiro, publicou um manifesto contra o racismo, o presidente da Macaca, Sebastião Arcanjo, o Tiãozinho, destacou a importância de os clubes se posicionarem neste momento por enxergar o futebol como “fator de construção de identidade” do país. Ele é o único mandatário negro entre os times das Séries A e B do Campeonato Brasileiro.

– Durante muito tempo se cultivou uma ideia equivocada no Brasil de que não poderíamos tratar desses assuntos nos espaços do futebol, da arte, da música. Era uma forma de esconder o problema. O futebol é fator de construção de identidade, um dos principais patrimônios do Brasil. Imagino e sonho que o futebol pode nos ajudar a construir um mundo melhor, sem nenhum tipo de preconceito e discriminação, onde possamos conviver com as pessoas independentemente da cor da sua pele.

E continuou:

– O futebol pode ajudar nisso. Se a gente conseguir passar uma mensagem, se os atletas conseguirem isso, conseguiremos derrotar o racismo mais rápido do que a gente imagina – disse Tiãozinho em entrevista à EPTV, afiliada da Rede Globo, nesta terça-feira.

Tiãozinho durante entrevista nesta terça-feira  — Foto: Reprodução EPTV

Tiãozinho durante entrevista nesta terça-feira — Foto: Reprodução EPTV

A relação da Ponte com a democracia racial é de longa data. O clube pleiteia há anos o reconhecimento junto à Fifa por ter tido negros entre os fundadores, em 1900, e ter tido um jogador titular negro no primeiro time: Miguel do Carmo.

Outra situação é a origem do apelido Macaca, que foi a apropriação de um termo usado para ataques preconceituosos e acabou transformado em motivo de orgulho entre os torcedores. Ainda assim, o clube levou 119 anos para ter o primeiro presidente negro, na figura de Tiãozinho, que assumiu em novembro de 2019 após a renúncia de José Armando Abdalla. Para ele, a ausência de negros em cargos de direção no futebol brasileiro é um reflexo da sociedade brasileira.

– Passamos por um processo de 350 anos de escravidão. Os negros sempre foram condicionados a ocupar posições subalternas na sociedade. Quando você olha para a hierarquia das instituições, a presença expressiva de negros em campo não se reflete fora das quatro linhas, seja nas comissões técnicas, nas diretorias, nas áreas administrativas. Essa ausência e invisibilidade dos negros nos quadros de direção é reflexo da história marcada por preconceito e discriminação por entender de maneira equivocada que à população negra brasileira está reservada papel de secunda categoria na sociedade.

As campanhas anti-racismo estão ganhando cada vez mais voz após a morte de George Floyd em Minneapolis. A revolta pela atuação no caso tirou os americanos do isolamento social juntou multidões em 15 estados e mais de 140 cidades e tem movimentado as redes sociais.

Na última segunda, os clubes brasileiros fizeram uma corrente nas redes sociais homenageando os ídolos negros, com a participação da Ponte e do Guarani.

Já nesta terça, por exemplo, a iniciativa #BlackOutTuesday, com manifestações de diversos astros do esporte nas redes sociais, prega um momento de reflexão contra o racismo e a desigualdade. Além de Ponte e Guarani, a Inter de Limeira, o XV de Piracicaba e os times de vôlei masculino e basquete feminino de Campinas também aderiram ao movimento em seus canais oficiais.

– Campinas foi a última cidade do país a abolir a escravidão no Brasil, mas teve o primeiro time a praticar a democracia racial no futebol nacional – completou Tiãozinho. (Globo Esporte)