Graças a uma explosão gigante liberada por uma estrela supermagnetizada, astrônomos descobriram na imensidão do Universo um local de nascimento para alguns dos elementos mais raros do universo: o ouro, a platina e o urânio. De acordo com os cálculos dos especialistas, tais explosões poderiam ser responsáveis pela formação de até 10% de todos esses compostos pesados.
O achado foi apresentado pelo Centro de Astrofísica Computacional (CCA) do Instituto Flatiron, nos Estados Unidos. Seus detalhes foram descritos em artigo publicado na terça-feira (29) no periódico The Astrophysical Journal Letters.
Por 20 anos, esse pequeno alerta permaneceu sem explicação. Agora, com o novo estudo, tal sinal pôde ser interpretado como o marco de surgimento dos elementos raros. Mais do que só confirmar essa fonte, os astrônomos estimaram que a explosão de 2004, sozinha, produziu o equivalente a um terço da massa da Terra em metais pesados.
“Esta é realmente apenas a segunda vez que vemos provas diretas de onde esses elementos pesados se formam, sendo a primeira a fusão de estrelas de nêutrons”, afirma Brian Metzger, o coautor do estudo, em comunicado. “É um avanço substancial em nossa compreensão da produção de elementos pesados”.
Nascimento dos metais preciosos
A maioria dos elementos que conhecemos e amamos hoje nem sempre existiu. Hidrogênio, hélio e uma pitada de lítio foram formados no Big Bang, mas quase todo o resto foi fabricado por estrelas ao longo de suas vidas ou durante suas mortes violentas. Embora os cientistas entendam onde e como os elementos mais leves são formados, os locais de muitos dos elementos mais pesados, ricos em nêutrons seguem em processo de compreensão.
Os elementos pesados, que incluem urânio e estrôncio, são produzidos em um conjunto de reações nucleares conhecido como “processo de captura rápida de nêutrons”, ou “processo-r”. Esse processo requer um excesso de nêutrons livres, o que só pode ser encontrado em ambientes extremos.
Os astrônomos, portanto, esperavam que os ambientes extremos criados por supernovas ou fusões de estrelas de nêutrons fossem os locais mais promissores para o processo-r. Foi somente em 2017 que eles conseguiram confirmar um sítio de processo-r ao observarem a colisão de duas estrelas de nêutrons.
Essas estrelas são remanescentes do colapso de antigas estrelas gigantes estelares e são compostas por uma sopa de nêutrons tão densa que uma única colher de sopa pesaria mais de 1 bilhão de toneladas. As observações de 2017 mostraram que a colisão cataclísmica de duas dessas estrelas cria o ambiente rico em nêutrons necessário para a formação de elementos do processo-r.
Novas evidências do processo
No entanto, os astrônomos perceberam que essas colisões raras por si só não são suficientes para explicar todos os elementos produzidos pelo processo-r que vemos hoje. Alguns suspeitaram que magnetares, estrelas de nêutrons altamente magnetizadas, também poderiam ser uma fonte.
Nesse sentido, Metzger e seus colegas calcularam em 2024 que erupções gigantes poderiam ejetar material de um magnetar para o espaço, onde elementos do processo poderiam se formar. Veja infográfico:
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“É incrível pensar que alguns dos elementos pesados ao nosso redor, como os metais preciosos em nossos telefones e computadores, são produzidos nesses ambientes extremamente loucos”, reitera Anirudh Patel, principal autor da nova pesquisa.
Os cálculos do grupo mostram que essas erupções gigantes criam núcleos radioativos pesados e instáveis, os quais decaem em elementos estáveis, como o ouro. À medida que os elementos radioativos decaem, eles emitem um brilho luminoso, além de cunhar novos elementos.
Também em 2024, os especialistas calcularam que o brilho dos decaimentos radioativos seria visível como uma explosão de raios gama, uma forma de luz altamente energizada. Ao discutirem suas descobertas com astrônomos observacionais de raios gama, o grupo descobriu que, de fato, um sinal desse tipo já havia sido observado décadas antes, sem nunca ter sido explicado.
Como há pouca sobreposição entre o estudo da atividade magnetar e a ciência da síntese de elementos pesados, ninguém havia proposto anteriormente a produção de elementos como causa do sinal. “O evento ficou meio esquecido, mas rapidamente percebemos que nosso modelo era perfeito para ele”, lembra Metzger.
Projeções a partir da descoberta
No novo artigo, os astrônomos usaram as observações do evento de 2004 para estimar que a explosão produziu 2 trilhões de bilhões de bilhões de quilogramas de elementos pesados. Assim, eles estimam que de 1% a 10% de todos os elementos do processo-r em nossa galáxia hoje foram criados nessas erupções gigantes.
É possível que o restante desses compostos tenha sido proveniente de fusões de estrelas de nêutrons. Mas, com apenas uma explosão e uma fusão de estrelas magnetares já documentadas, é difícil saber as porcentagens exatas.
Essa história poderá ser aprofundada por telescópios como os da missão Compton Spectrometer and Imager da Nasa, com lançamento previsto para 2027.
“O interessante sobre essas erupções gigantes é que elas podem ocorrer bem no início da história galáctica”, observa Patel. “Erupções gigantes de magnetar podem ser a solução para um problema que enfrentamos, em que há mais elementos pesados observados em galáxias jovens do que poderiam ser criados apenas por colisões de estrelas de nêutrons”.
(Por Arthur Almeida)