Quase nove meses depois, os clubes voltaram a se reunir na sede da CBF para discutir a criação de uma liga para organizar o Campeonato Brasileiro. A primeira foi em 15 de junho de 2021, na esteira da crise que derrubou o então presidente Rogério Caboclo por causa de denúncias de assédio moral e sexual. A segunda foi na última segunda-feira, quando uma Assembleia Geral definiu novas regras para a próxima eleição na CBF, que terá como candidato único Ednaldo Rodrigues, atual presidente interino.
O acordo costurado foi o seguinte: os clubes aceitaram a manutenção da distribuição do peso dos votos de cada categoria nas eleições – os votos das federações têm peso 3, os votos dos clubes da Série A têm peso 2, e os da Série B têm peso 1.
Em troca, a CBF se comprometeu a apoiar a criação de uma liga. Outro ponto considerado pelos clubes como uma vitória foi a redução da cláusula de barreira: até então, quem quisesse concorrer a presidente da CBF precisava ter o apoio de oito federações e cinco clubes da Série A. Agora, bastam quatro federações e quatro clubes – que podem ser da Série A ou da Série B.
Assembleia Geral da CBF — Foto: Lucas Figueiredo/CBF
Como os clubes não pretendem articular uma candidatura própria, o que importa aqui é a liga.
Na avaliação de dirigentes ouvidos pela reportagem – de clubes, de federações e da própria CBF – a vitória de Ednaldo Rodrigues na guerra política que estava em curso na entidade também foi importante para fazer as conversas sobre liga avançarem. Seu rival na disputa era Gustavo Feijó, outro vice-presidente, e que sempre se posicionou frontalmente contra a criação de uma liga para organizar o Campeonato Brasileiro. Ednaldo Rodrigues pensa diferente:
– A liga está prevista nos estatutos de Fifa, Conmebol e CBF. Desde que atenda o ordenamento desportivo, respeitando calendários de CBF, Conmebol e Fifa, a CBF não vai se colocar contrária. Vai ser parceira até – afirmou em entrevista coletiva.
Os presidentes de clubes aproveitaram que estavam na CBF para discutir as eleições da entidade e fizeram uma reunião para tratar exclusivamente dos assuntos da liga.
O encontro não produziu nenhum documento formal, mas quem participou dele saiu com a sensação de que as discussões avançaram. Sobretudo na redução de distâncias entre os dois grupos que, até aqui, às vezes pareciam antagonistas. De um lado, o “Forte Futebol”, com dez clubes que se apresentam como “emergantes”. Do outro lado, o grupo formado por Corinthians, Palmeiras, Santos, São Paulo, Red Bull Bragantino e Flamengo.
Pelo menos no discurso, os dois lados deixaram claro que estão aparando arestas.
– Sempre houve diálogo, nunca teve isso de “fulano não fala com fulano”. Os clubes maiores entendem que precisam, sim, dividir melhor os recursos, como acontece nas grandes ligas do mundo. Não precisamos inventar a roda, a roda já existe. É seguir o que acontece na Inglaterra – disse o presidente do Fortaleza, Marcelo Paz, que faz parte do “Forte Futebol”.
Do outro lado, Duilio Monteiro Alves, do Corinthians, concordou, com uma expressão que foi repetida por quase todos os dirigentes.
– O bolo precisa crescer, e quando crescer, precisa ser mais bem dividido. O produto fica ruim quando as disparidades são muito grandes. É claro que não tem como ser totalmente igualitária a divisão, que alguns vão ganhar um pouco mais, outros poucos menos, mas é possível diminuir as distâncias. E o diálogo hoje teve um grande avanço.
Os presidentes dos clubes da Série A esperam que a liga tenha alguma formatação ainda em 2022 – não para organizar a competição, mas para começar a atuar comercialmente. A ideia é evitar a situação hipotética descrita à reportagem por um executivo de um banco de investimento:
– Temos um cheque aqui para investir na liga. Para quem entregar? – disse um dos envolvidos nas negociações.
Executivos de empresas envolvidas nas conversas sobre liga também gostaram de saber que os clubes de grupos diferentes se aproximaram. Os nós continuam sendo os mesmos: como vai se dar a divisão do dinheiro e como encontrar espaço no calendário lotado do futebol brasileiro.
É consenso que uma liga não tem como ser atrativa comercialmente se for espremida nos mesmos seis ou sete meses do Campeonato Brasileiro. Duílio, presidente do Corinthians, acredita que esse obstáculo será superado gradativamente.
– Não adianta tentar resolver de maneira brusca. Tem que ser com diálogo. (GE)