Crânio e mandíbula encontrados em Dmanisi - Gerbil/Museu de História Natural Senckenberg

Pesquisadores brasileiros, em colaboração internacional, defenderam recentemente uma nova interpretação para os fósseis encontrados no sítio de Dmanisi, na atual República da Geórgia.

Tradicionalmente esses restos — crânios e mandíbulas humanas datados de cerca de 1,8 milhão de anos — eram atribuídos a uma forma primitiva de Homo erectus, independente de variações anatômicas entre os indivíduos. A nova pesquisa questiona esse consenso, argumentando que os achados revelam evidências de duas espécies humanas distintas vivendo no mesmo lugar e tempo.

O estudo baseou-se em uma extensa análise comparativa de medidas referentes à dentição de mais de 500 hominíneos fósseis, desde espécies mais antigas até representantes posteriores do gênero Homo. Ao comparar a área da coroa dos dentes pós-caninos (pré-molares e molares) dos indivíduos de Dmanisi com esse grande conjunto, os cientistas observaram que um dos fósseis — identificado como D4500–D2600 — se aproxima mais de características atribuídas a hominíneos primitivos ou mesmo a australopitecos.

Espéscies humanas

Já outros dois — D2282–D211 e D2700–D2735 — apresentaram padrões compatíveis com espécies primitivas do Homo. Com base nesses dados, argumenta-se que seria possível distinguir pelo menos duas espécies entre os restos de Dmanisi: uma próxima a uma fase de transição entre os primeiros Homo e o Homo erectus, e outra que já representaria um Homo mais tardio ou clássico.

Os autores propõem batizar a espécie intermediária de Homo caucasi, distinta da Homo georgicus, nome já usado para designar os fósseis de Dmanisi em algumas classificações anteriores.

Caso a proposta seja aceita, isso implica que a saída dos humanos primitivos da África teria envolvido não apenas uma migração de um grupo homogêneo, mas múltiplas linhagens, com diferentes graus de proximidade evolutiva entre si. Isso reabre debates sobre quando e quantas vezes hominíneos deixaram o continente africano — e sobre a complexidade da história evolutiva humana em suas primeiras expansões.

Se confirmada, essa nova classificação implicará em uma reescrita da narrativa da evolução. O que antes era interpretado como uma dispersão linear e única de Homo erectus para fora da África passaria a refletir uma migração multirracial e multifacetada, com pelo menos duas espécies habitando regiões do Causaso ao mesmo tempo.

A proposta também destaca a necessidade de reexaminar fósseis atribuídos a espécies humanas primitivas, usando métodos atualizados de morfologia e estatística para reavaliar sua identidade.

*Sob supervisão de Fabio Previdelli

(POR FELIPE SALES GOMES)