A paralisação das competições devido à pandemia do novo Coronavírus traz um impacto financeiro de dimensão ainda incalculável para os clubes de futebol no Brasil. Uma semana após a suspensão das disputas, as equipes organizam medidas extraordinárias para enfrentar o período de crise.
Na Série A, maior parte das diretorias pretendem se concentrar em ações conjuntas, atuando com propostas junto à Confederação Brasileira de Futebol e aos sindicatos que representam os atletas. Além de uma tentativa de fazer com que o pagamento das parcelas do Profut seja adiado pelo Governo Federal. Mas o cenário preocupa.
Para o presidente do Bahia, Guilherme Bellintani, a depender da composição de receita dos clubes, a projeção é de que suportem o máximo de três meses sem jogos.
“Se considerar que a TV vai manter contratos, que o campeonato será adiado, mas não cancelado, nem reduzido, considerando que não teria evasão de sócios, de patrocinadores, diria que um clube aguenta dois ou três meses, no máximo. Se essa rede que sustenta o clube for mais frágil, tem clube que não suporta 30 dias” – disse, em entrevista ao Faixa Especial SporTV.
Guilherme Bellintani presidente do Bahia fala sobre situação dos clubes — Foto: Felipe Oliveira / Divulgação / E C Bahia
Uma das tentativas para amenizar este cenário é a proposta apresentada aos representantes dos atletas, pela Comissão Nacional de Clubes (Fluminense, Atlético-MG, Grêmio, Palmeiras e Bahia na Série A). Os jogadores recebem férias até o dia 21 de abril. Caso os torneios não retornem após esse período, a remuneração seria reduzida em 50% por 30 dias. Sem mudança de cenário no mês seguinte, o contrato de trabalho ficaria suspenso até o retorno das atividades, com os vínculos prorrogados pelo tempo de suspensão.
Em momento de diálogo, o Sindicato fará uma contraproposta. A redução salarial não foi vista com bons olhos pelos atletas, pois a CLT prevê o desconto máximo de 25%. Advogado trabalhista e integrante da Comissão, o presidente do Fluminense, Mário Bittencourt, detalha a ideia dos clubes.
“A ideia é tentar manter o maior número de empregos possível. Importante esclarecer: tem se ouvido muito que os clubes estão impondo, mas não é isso, vamos ter dificuldade de acabar o ano, cumprir o calendário.”
Na última semana, a Procuradoria-Geral da Fazenda suspendeu por 90 dias os atos de cobrança da dívida ativa da União. Com isso, ficam paralisados prazos e novos procedimentos na entidade para os 11 clubes que acumulam, juntos, mais de R$ 253 milhões em débitos com o órgão.
Para o vice-presidente de finanças do Botafogo, Luiz Felipe Novis, a medida ajuda. O dirigente, no entanto, pondera a questão dos patrocinadores. Por conta da Covid-19, o clube perdeu o investimento da Azeite Royal, que notificou a rescisão do contrato também ao Fluminense, Flamengo e Vasco, que recebiam da empresa.
– A medida da Procuradoria dá um fôlego e ajuda um pouco. Vamos ver as medidas que vão ser propostas. Acredito que elas venham para ajudar, mas não tenho ideia se vão resolver 100% dos problemas. Temos que negociar com os fornecedores. Se não estou exibindo a marca (dos patrocinadores) na camisa, em tese, poderiam dizer que não vão pagar. É muito preocupante. A curto prazo temos que sentar e ver o que fazer. Não é a estratégia de um ou outro clube. Não existe solução única.
Confira as ações dos clubes da Série A 2020
- Athletico
O Furacão liberou o elenco e mantém treinos à distância, mas ainda não anunciou outras medidas. Clube está entre os que buscam unidade neste momento.
- Atlético-GO
Dragão deu férias coletivas por 15 dias para amenizar o prejuízo. A medida envolve o departamento de futebol e o administrativo. O clube rescindiu contrato com um jogador da base que estava no profissional (atacante Cristhyan) e pode encaminhar a saída de mais jogadores. Alguns contratos têm validade apenas durante o Campeonato Goiano, que estava marcado para terminar ao fim de abril.
- Atlético-MG
Integrante da Comissão Nacional de Clubes, que apresentou proposta à Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol (FENAPAF) e para outros sindicatos de atletas profissionais, o Galo está entre os clubes que buscam unidade.
Sérgio Sette Câmara, presidente do Atlético-MG — Foto: Pedro Souza/Atlético-MG
- Bahia
Mesmo diante da indefinição das competições, o presidente Guilherme Bellintani garantiu a continuidade do projeto do time de aspirantes, previsto para durar uma temporada. O mandatário, que calculou o tempo de sobrevivência financeira dos clubes entre um a três meses neste período, acredita em uma queda de faturamento do Bahia este ano, que estava previsto para R$ 180 milhões.
- Botafogo
Com o clube em crise, ainda não há definição sobre a situação dos salários dos jogadores por parte do departamento financeiro. No entanto, neste momento, o Alvinegro não pensa em demitir funcionários. O vice-presidente de finanças do Botafogo, Luiz Felipe Novis, vê complicações com patrocinadores.
– Não tendo receitas não tem como cumprir com as obrigações. Quem fala que tem planejamento ou que sabe o que fazer está mentindo. Ninguém sabe. Não existe solução, porque ninguém vai criar receita do nada. A parte mais sensível dessa mudança que afeta o cenário econômico é provocar algum tipo de atraso no projeto da SA (clube-empresa). A fase da captação sempre torna-se mais incerta. Os trabalhos continuam, claro, mas a gente não sabe como vai ser o comportamento dos investidores. Nessa área traz alguns problemas.
- Ceará
O Vozão aguarda que a situação passe e, em conjunto com outros clubes da Série A, está em contato com a CBF e com o Governo Federal para entender o que os órgãos podem fazer em prol das equipes. Neste momento, não se pensa em redução salarial ou em demissão de atletas ou funcionários.
- Corinthians
Clube está entre os que buscam unidade neste momento. Com o objetivo de concentrar em ações conjuntas, está ao lado de equipes como Atlético Mineiro, Athletico, Santos, Bahia, Cruzeiro e Sport.
Corinthians x Ituano — Foto: Agência Corinthians
- Coritiba
Não se pronunciou sobre ações.
- Flamengo
O clube não fala oficialmente sobre finanças. Nos bastidores, no entanto, entende que entre perdas e ganhos, seguirá equilibrado neste quesito, sem a necessidade de cortes de mão de obra ou reajustes salariais. A equação é de que, se por um lado deixa de ganhar com receitas de bilheteria e afins, por outro, há uma economia natural pela redução de serviços básicos. Cotas a patrocinadores e outras receitas previstas em contrato seguem intactas, o que favorece o equilíbrio de caixa.
- Fluminense
O clube tinha uma reunião do Conselho Deliberativo marcada para o dia 27 de março, quando seria votada a proposta de orçamento do Fluminense para a temporada de 2020. A apresentação, que tinha um parecer positivo do Conselho Fiscal, foi cancelada devido à pandemia do novo Coronavírus. E deve sofrer alterações. Pois os possíveis prejuízos do Tricolor em função da paralisação das atividades, obrigam a diretoria a fazer novas projeções. O Fluminense, vale lembrar, perdeu um dos patrocinadores no ano.
- Fortaleza
A preocupação do clube, a princípio, é de ajudar nas medidas de prevenção. Ainda não houve conversa em outros sentidos.
- Goiás
Por enquanto, só liberou os jogadores e os funcionários por tempo indeterminado.
- Grêmio
Com mais de 50 funcionários em regime de trabalho remoto, sem precisar ir na estrutura do clube, o Tricolor espera por uma prorrogação nas obrigações tributárias para poder minimizar os danos. Diante da pandemia do Covid-19, o presidente, Romildo Bolzan, chegou a falar em “fazer esforço” para manter os salários em dia. O Grêmio aguarda por medidas compensatórias do Governo Federal e admite que, caso não haja, será preciso adotar ações internas para readequação.
Romildo Bolzan, presidente do Grêmio — Foto: Eduardo Deconto/GloboEsporte.com
- Internacional
O clube admite que atrasos no pagamento de salários e a fornecedores estão próximos de acontecer nos próximos dias. Diante deste cenário, a diretoria traçou um plano de redução de despesas nos departamentos do Colorado. Sem projeção do prejuízo, proibiu firmar novos contratos, seja de contratações, fornecedores e manutenção, até que a situação seja normalizada.
- Palmeiras
O Verdão é mais um dos clubes que tenta agir em bloco. Neste momento, está mais próximo de um movimento junto a CBF. Devido à crise, as negociações por jogadores estão em segundo plano, mas a diretoria mantém contato com as cúpulas de outras equipes.
- RB Bragantino-SP
O clube liberou o elenco após a paralisação do Paulista e o técnico Felipe Conceição trabalha à distância estudando os adversários do Estadual. Mas a diretoria ainda não se pronunciou sobre outras medidas.
- Santos
Está entre os clubes que buscam unidade, mas não anunciou medidas.
- Sport
O Rubro-negro é mais um que tenta agir em bloco com outros clubes. Neste primeiro momento, não pensa em demitir funcionários. Ações como férias coletivas, além de readaptação e redução de salário dos atletas, vai depender do desenrolar da proposta da Comissão Nacional dos Clubes.
- São Paulo
Mais próximo da CBF, também está entre os clubes que buscam unidade.
- Vasco
Está entre os clubes que buscam ação conjunta, trabalha mais próximo da CBF com equipes como Fluminense, Palmeiras e São Paulo, mas não anunciou medidas.
Recentemente, o clube anunciou a chegada de José Luiz Moreira para a vice-presidência de futebol e Leão como vice de finanças. Com os novos titulares da pasta, a tendência é de que o clube se movimente nesta semana. O Cruz-Maltino vive um clima turbulento, após o Conselho Fiscal emitir uma negativa de parecer sobre as contas de 2019 do presidente Alexandre Campello.
- Cruzeiro
Rebaixado à Série B, o Cruzeiro também espera tomar uma decisão conjunta com outros clubes brasileiros. Está representado na Comissão por Avaí e Paraná, com Oeste como suplente, na segunda divisão. Em grave crise financeira, com mais de R$ 800 milhões em dívidas, o clube terá uma reunião por videoconferência para tentar mensurar o prejuízo devido à parada. Ainda não tomou medidas econômicas.
Em crise, Cruzeiro disputa a Série B do Brasileiro este ano — Foto: Gustavo Aleixo / Cruzeiro
(Globo Esporte)