Tudo começou com a Fernanda. Ela passou mal, o que levou a uma internação angustiante de 13 dias. Torturante, porque ninguém descobria o que ela tinha. A equipe médica não chegava a um diagnóstico, não conseguia dizer por que ela estava ali, mesmo fazendo uma bateria de exames. A Fernanda era uma menina linda, cheia de saúde. Passou mal do nada, teve uma parada cardíaca e foi intubada. Mesmo assim, a gente não perdia a esperança. ( Adolescente que teria sido envenenado pela madrasta fala pela primeira vez sobre o crime : “Ela fazia tudo para o meu pai brigar comigo”)
Teve hipótese de um diabetes, teve hipótese de uso de anabolizante. Mas ela nunca tomou nada disso. Ela tinha começado a treinar há seis meses para ganhar corpo. A madrasta (Cíntia Mariano Dias Cabral) já chegou falando que ela tinha tomado um produto depois da academia, mas ela estava com um plano alimentar de uma nutricionista, com um personal trainer. E eu acreditava na minha filha.
No dia 15, dia da internação, a gente quase não se falou. Ela tinha vindo do aniversário da cunhada dela e estava com muito trabalho. Trocamos mensagem pelo Instagram, só. Bobagens, posts de moda, e pedi uma ajuda porque algumas postagens estavam indo sem som. E ela já não respondeu mais, já estava passando mal. Isso foi por volta das 20h da noite, quando começou a loucura lá.
Eu só fiquei sabendo por volta das 22h30, quando a Cíntia veio me dar a notícia. Ela mandou eu correr para o hospital, porque a Fernanda tinha passado mal. Na hora, achei que fosse um acidente, que ela tinha caído. Nunca imaginei na minha vida que a minha filha estivesse sofrendo uma parada cardíaca.
No segundo dia, ela internada daquela forma, sedada, intubada, eu questionei o pai dela: “A minha filha não foi envenenada não, né?”. E ele disse: “Pelo amor de Deus, Jane. Não fala isso. É isso que você está achando?”. Cheguei até a falar com o médico sobre isso, perguntei se tinham feito exame toxicológico. Já era o coração de mãe falando mesmo.
Mas já era o terceiro dia, e ele disse que não adiantava mais fazer o exame. Nós até oferecemos levar outro médico para lá, por nossa própria conta, para poder ter uma outra opinião, mas os médicos diziam que não era preciso, que “estavam no caminho”. Depois eu descobri que o hospital nem faz esse exame.
Devido à parada cardíaca, ela teve uma lesão no cérebro e foi isso que causou a morte dela, porque os órgãos foram parando. O atestado de óbito diz que foi parada cardíaca, falência múltipla dos órgãos, mas o que fez ela ter uma parada cardíaca? Ninguém descobriu. Chegou ao óbito, essa tristeza toda, e a gente em hipótese alguma imaginava o que tinha acontecido. Até, exatamente dois meses depois, o Bruno passar mal.
No último domingo, o Bruno foi almoçar na casa do pai, o que era raro de acontecer, até porque ele já tinha um pé atrás com a madrasta. Bruno já era desconfiado com algumas coisas que ela fazia, como sumir com a caderneta do colégio, com o dinheiro da passagem que ele tinha separado, apagar mensagem, só para causar intriga com o pai.
Ele achou muito estranho como as coisas aconteceram. Ela serviu o feijão, entregou o prato para ele, e pediu para que ele completasse com as outras coisas. Quando ele começou a comer, estranhou o gosto do feijão. Foi cutucar a comida para ver o que tinha e encontrou pedrinhas azuis, do tamanhinho de gergelim, como se tivessem sido trituradas num pilão. Ele perguntou o que era aquilo. Foi quando ela arrancou o prato da mão dele, nervosa, tirou a parte das bolinhas e colocou mais feijão, como se quisesse disfarçar o gosto.
Perguntei por que ele continuou comendo. Ele disse que não queria fazer desfeita, porque quase não ia lá, forçou comer mais do feijão amargo, até que não aguentou mais e perguntou novamente que bolinhas eram aquelas. Mais nervosa ainda, ela arrancou o prato do Bruno. Ela ainda chegou a apagar a luz da cozinha porque o Bruno foi atrás para saber o que era aquilo ali.
Ele já estava cabreiro, já estava incomodado com o que estava acontecendo. A situação foi tão estranha que até os filhos que estavam lá presentes teriam falado: “Deixa o garoto comer em paz”. Ela entregou a ele outro prato para ele cortar o bife, mas ele não comeu mais. Desconfortável, ele já queria ir embora de lá e me mandou mensagem e pediu que fosse buscá-lo. Ele chegou aqui apavorado, me perguntando o que fazia para vomitar. Quando perguntei o motivo, ele contou a história do feijão, me perguntou se eu sabia que tempero poderia ser aquele, azul. Na mesma hora eu pensei na Fernanda e sugeri que a gente fosse ao laboratório fazer um exame de sangue porque, se tivesse alguma coisa, iria acusar. Mas não fui capaz de imaginar o que estava por vir.
Ele tentou colocar o dedo na goela, não saiu nada. Quarenta minutos depois, começou com uma sonolência. Inicialmente, pensei que fosse porque ele tinha acordado muito cedo para ir ao simulado da escola. Mas o sono aumentou, virou tontura e ele não conseguia mais levantar. Começou a suar frio, arrancou a blusa, a língua começou a enrolar e a ter umas pequenas convulsões, começou a espumar, como se fosse um inseto morrendo depois de você colocar inseticida. Ele já estava com metade do corpo paralisada e começou a pedir água.
Quando vi os olhos dele revirando, pensei em envenenamento. Na mesma hora, liguei para o pai e fui descendo as escadas com ele. Na mesma hora, vieram os dois socorrer. Quando ela chegou aqui, gritei na mesma hora: “O que você colocou nesse feijão?”. Já não tinha mais dúvida de nada. Tudo o que o Bruno estava tendo foi o que eles falaram que a Fernanda teve lá. A língua enrolando, o corpo molhado de suor…
Lembro que ela falou que encontrou a Fernanda no banheiro, molhada de suor, babando, e que ainda jogou água nela. Tudo o que o Bruno estava tendo era o que eles falaram que a Fernanda teve lá. Passou um filme de terror na minha cabeça. Então, quando ela chegou, já gritei com ela para saber que pedrinha azul era aquela que ela tinha jogado no feijão. Quando o pai entrou, disse na hora que tinha sido ela e pedi para irmos correndo socorrer o Bruno. Ela foi dirigindo, o Bruno já estava andando como um robô, nós fomos atrás com ele. Com medo que a mente dele parasse, fui no caminho pedindo para que ele falasse o meu nome todo, o nome dele todo. Fui fazendo a mente dele trabalhar, porque o meu medo era que ele tivesse uma parada cardíaca ou perdesse o controle. E ele foi daqui até o hospital pedindo água, com a língua enrolada. Dizem que veneno resseca tudo, né?
Chegando ao hospital, eu já falei com os médicos de que havia uma suspeita de envenenamento por um feijão amargo com pedrinhas miudinhas, suspeitas, azuis. E os médicos fizeram uma lavagem. Na coleta, tinha as tais das pedrinhas azuis. O médico disse que era uma quantidade de chumbo muito grande para qualquer refeição, que não era normal.
Os médicos foram muito profissionais fazendo a lavagem, aplicando o antídoto. Mas o mais torturante para mim foi quando eles vieram dar a notícia de que ele tinha sido intubado. Ele tinha perdido a consciência e precisou ser sedado. Para mim, foi a pior parte, porque por mais que a gente não queria ter pensamento negativo, me veio de volta toda a agonia com a Fernanda. Em nome de Jesus, Salmo 91, ele não teve parada cardíaca. Mas, na minha cabeça, eu disse, pronto, vai ser outro. Foi o pior dia da minha vida.
Pensei, meu Deus do céu, você vai levar meu outro filho? Mas graças a Deus e a todos os santos, meu bebezinho está aqui hoje. Foram dois meses certinhos. A Fernanda foi 15 de março, domingo foi 15 de maio. Mas acredito que ela não premeditou isso, acredito que tenha sido o universo. Como todo hospital tem um policial, houve a suspeita e daí já teve de abrir um inquérito. De lá, já fomos para a delegacia, mas eu já não tinha mais dúvida. E eu sabia que tinha algo com o caso da Fernanda. Porque ninguém acreditava no que tinha acontecendo com a morte da Fernanda. Mas como ninguém fez a lavagem, o veneno ficou ali, nela.
Só Deus mesmo, porque é o que eu falo: isso não é um ser humano, isso é um monstro. E acredito que o próximo seria ele. Meus filhos são tão inteligentes, gentis e amorosos… Aqueles enteados que não dão trabalho para a madrasta.
Essa mulher entrou na nossa família porque eu a contratei para fazer a condução escolar do meu filho, quando ele tinha de 3 para 4 aninhos. Nossa relação era normal. Depois que me separei do pai dos meus filhos, fiquei sabendo que ela se envolvia com pais de alunos, que era amantezinha. Ela não foi pivô da nossa separação. Estamos separados há oito anos, e ela estava com ele há uns quatro. Mas, com certeza, a relação deles foi muito manipulada por ela.
A minha relação com ele sempre foi cordial. Desde o que aconteceu com a Fernanda, nós dois estávamos muito solidários um com o outro. Uma amizade boa, ele lá, eu cá. Não tinha intriga, até porque não foi ela que separou a gente. Não tinha nada contra ela. Para mim, ela era uma pessoa que nem existia. Mas ele é o pai dos meus filhos.
Nunca deixei ela desconfortável em relação a ele. Minha separação de homem e mulher sempre foi muito bem resolvida. Mas era um medo, um controle, que ela não deixava ele falar comigo. Até a notícia da morte da Fernanda foi ela quem me deu. Eram 3h da manhã.
Ela tinha acesso livre ao celular do pai dele, o que acho uma invasão de privacidade, por mais que as pessoas sejam casadas. Se passava por ele para responder ao Bruno e apagava as mensagens do filho. E isso já causou várias brigas entre os dois, porque o pai achava que o filho não tinha respondido.
Nos dias em que a Fernanda ficou internada, ela lá, postando oração. Era aquela redoma em cima dele, que ninguém podia chegar perto. E ele não enxergava um palmo na frente da mão dele. Mas o que ele faz da vida dele é problema dele. Tanto é que, se os meus filhos tivessem aqui vivos, ia continuar desse jeito, porque cada um vive da vida que quer. Ela já estava pegando todas as manhãs, já estava inserida no trabalho dele, acompanhando ele em tudo, dominando totalmente.
Mas já era algo estranho que a gente desconfiava lá atrás, e a gente estava certo. Essa autoproteção era como se fosse a galinha dos ovos de ouro. Até onde era conveniente para ela, ela era uma pessoa. Mas o que não servia mais, ela descartava. E acho que ele também ia nesse pacote, acho que o pai ia.
Acredito que tudo isso tenha sido por ganância, por dinheiro. Tirando os herdeiros, tudo ficaria só para ela e para os filhos dela. Houve um tempo que até cogitei se era ciúme dos filhos. Gente, mas como uma pessoa vai ter ciúme da outra se ela não ama? Ela não amava ele. Uma pessoa que ama não faz uma crueldade dessas. Mata uma filha e, com dois meses, tenta matar o outro? Isso não é amor. Que amor é esse? Acho que ela nunca amou ele.
Foi ganância por dinheiro, até porque ela veio do nada, da lama. Uma casa, um carro vale uma vida. Nem dinheiro ele tem assim. Ele tem uma casa, um carro, tem uma qualidade de vida boa. Ele trabalha com comércio de livros, faz feira. Nem imóveis ele tem.
A sorte é que meu filho é tranquilo e observador. Graças a ele, essa máscara caiu, graças a ele nós estamos fazendo justiça pela Fernanda e por ele próprio, que quase perdeu a vida. Só elogios ao meu filho, te amo muito. Muito mesmo, continue assim. Ele veio para mostrar quem era ela e, talvez, até salvar o pai dele também.
Hoje, ele nem está mais com ela. Ele não tem culpa. Como ex, estou dando o suporte que for. Não tenho o que reclamar, ele sempre foi um excelente pai. No segundo dia, quando as evidências vieram à tona, ele já meteu o pé de casa. Mas eles estavam construindo uma casa. Ela casou com ele no papel, depois que ela estivesse na casa, para que ele iria servir para ela? Talvez o Bruno tenha vindo para fazer justiça por ele, pela Fernanda e pelo pai. E salvado o pai.
Dizem que ela tentou se matar, que tomou vários calmantes. Mas, se ela quisesse se matar, teria tomado a dosagem que deu para a minha filha. Tomava chumbinho, botava lá no feijãozinho dela. Ela sabe como matar. Ainda no hospital, ela veio me afrontar, me segurou pelo braço e foi falando que era para ir todo mundo para a delegacia. Disse que não era para ela se precipitar porque, se descobrissem algo, a gente iria, sim, para a delegacia direto do hospital. Foi quando ela disse que era para levar o feijão lá, para ver se tinha alguma coisa. E eu falei que o problema nunca esteve na panela de feijão, estava no prato que ela deu para o meu filho porque ela não queria envenenar a família inteira. Quero ver trazer o lixo que você jogou fora para você comer. Se eu tivesse lá, eu fazia ela comer esse feijão. Agora, quero que ela fique na cadeia para o resto da vida, que ela saia de lá caquética. Ela tem uma energia horrível, uma energia ruim.
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