Meus amigos, meus inimigos: José Geraldo Riva, corrupto confesso, quer se livrar da cadeia antes que venham sobre ele as esperadas condenações na segunda instância. Riva não quer passar o resto da vida atrás das grades, vendo o sol nascer quadrado – e temendo o olhar faminto de algum taradão do Comando Vermelho. Quem tem cu tem medo. Mas quem planta ventos, colhe tempestades.

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Riva, imagino eu, no meu pobre imaginar, não quer ficar longe das mordomias, da vida de conforto e de delícias a que se acostumou, como um dos homens que mais tempo reinou sobre a política e sobre os negócios  e sobre os destinos deste trágico Estado de Mato Grosso – onde a riqueza abunda mas tantas e tantas pessoas vivem na mais sórdida miséria. Uns se divertem, uns enriquecem e a maioria continua com a bunda na janela para os poderosos passarem a mão nela.

Ex-deputado José Geraldo Riva, seis vezes presidente da AL MT

Só que está sendo difícil para esse corrupto tão conhecido, já exposto diante de Mato Grosso, do Brasil e do mundo, transfigurar-se em herói, um pecador arrependido que agora se dedicaria a expurgar o pecado. São tantas implicações que podem ser feitas a partir das revelações que ele tem condição de botar na mesa. Por isso, Riva enfrenta mais barreiras do que afagos quando fala em bater com a língua dos dentes. Sugerem que ele só quer escapulir do Inferno, sem entregar de fato provas consistentes. A delação seria então mais um tipo de golpe do sr. Riva.

É difícil tornar-se herói, avisara o poeta Aldir Blanc. Riva tá provando desta dificuldade e está vendo como dói.

Dominus dominium juros além
Todos esses anos agnus sei que sou também
Mas ovelha negra me desgarrei, o meu pastor não sabe que eu sei

                                                                                      (Aldir Blanc, Agnus Sei)

Como deve ser constrangedor para Riva ver os jornais amigos e os jornalistas amestrados de antigamente, aos quais garantiu tanto dinheiro e tanto poder por estes vinte anos afora, tratando-o agora como um desdentado, um porra louco, um pobre homem destituído do poder até mesmo para amedrontar seus antigos comensais. E as páginas da mídia se abrem para que os parceiros de ontem sugiram que Riva talvez esteja desmiolado, pisando impiedosamente na sua própria imagem de todo poderoso que ele, durante tanto tempo, conseguira cultivar.

Mas, tido como cristão, Riva devia saber muito bem o que acontece com aqueles que constroem seu castelo na areia.

Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.
Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitas maravilhas?
E então lhes direi abertament(e: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade.
Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras, e as pratica, assemelhá-lo-ei ao homem prudente, que edificou a sua casa sobre a rocha;
E desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e combateram aquela casa, e não caiu, porque estava edificada sobre a rocha.
E aquele que ouve estas minhas palavras, e não as cumpre, compará-lo-ei ao homem insensato, que edificou a sua casa sobre a areia;
E desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e combateram aquela casa, e caiu, e foi grande a sua queda.

(Jesus Cristo, no Evangelho Segundo Mateus, 7: 21-27)

O que tantos temem é que se Riva falar realmente tudo que viveu e que tramou, o castelo de cartas da política de Mato Grosso viria abaixo, desde aqueles tempos hoje imemoriais do governador Dante de Oliveira, quando o contador e deputado estadual José Geraldo Riva, do pequenino partido chamado PMN despontou na política de Mato Grosso.

Sim, o homem das Diretas Já talvez tenha tido pés de barro – e esse calcanhar de Aquiles talvez se chame José Geraldo Riva e não Antero Paes de Barros. Uma história que ainda precisa ser contada, mas pelo menos no rascunho que vazou esta semana, Riva se mantém silente sobre ela.

Seria bom que Riva contasse tudo para que se desmontasse os túmulos caiados que alguns, com grande maestria estilística, conseguiam transformar em suntuosas catedrais.

Pela que a imprensa vazou, nesses dias, já pudemos sentir no cangote o bafo putrefato de uma corrupção aparentemente incontrolável. Quem foi que ficou por fora da corrupção na Assembleia? Só o Pivetta. E aí a imprensa fala isso sem lembrar das reportagens do Romilson Dourado sobre a Cooperlucas. Ah, como é seletiva a nossa imprensa. Como é seletiva a nossa História.

À nudez sem véus diante da santa inquisição
Ah, o tribunal não recordará dos fugitivos de shangri-lá
O tempo vence toda a ilusão

                                                                          (Aldir Blanc – Agnus Sei)

O que Riva conta neste novo trecho de delação que, pelo que se especula, talvez esteja sendo vazado justamente para tentar impedir que Riva conte toda a sua história?!

Espantou a alguns saber que todas as Mesas Diretoras eleitas para comandar a Assembleia Legislativa de Mato Grosso talvez tenham sido escolhidas tendo como argumento principal por parte dos componentes da chapa vencedora, o uso de muita propina.

Poucos deputados teriam resistido a esta atração fatal.

Na pretensa delação, Riva relata como teria funcionado o pagamento de propina mensal aos deputados estaduais e chega a falar na apresentação de diversas provas como transferências bancárias, depósitos bancários, notas promissórias e testemunhas, que documentariam o repasse de dinheiro aos deputados para mantê-los na base do governo. Já os que não faziam parte da base, no caso, a  oposição, eram excluídos do esquema.

Os esquemas segundo Riva foram iniciados em 1995, com o até agora inatacado pela História e pelos historiadores Dante de Oliveira e teriam continuado nas gestões de Blairo Maggi e Silval Barbosa. Maggi teria encaminhado para os gulosos parlamentares a propina por meio de suplementação. Talvez tenha se tornado tudo legal mas certamente foi imoral.

Pelo que conta Riva, na gestão de Maggi, aquele governador que era tão rico que não precisaria roubar (sic), teriam sido pagos entre R$ 30 e 35 mil de propina aos deputados da Assembleia. Já na gestão Silval Barbosa, escolhido para o cargo por Maggi, o valor da propina teria chegado a R$ 50 mil. Tal padrinho, tal afilhado. E na vasta literatura sobre o crime organizado padrinho é sinônimo de chefe mafioso, como se pode conferir nos livros de Mario Puzo, nos filmes de Copolla, de Martin Scorsese.

Para melhor conhecimento de todos, a PAGINA DO E divulga no anexo a íntegra da pretensa delação premiada de José Geraldo Riva. A autenticidade da delação é questionada pelo próprio Riva. E o vazamento desta pretensa delação, alimentada pelos jornais amigos e pelos jornalistas amestrados, e que avança impunemente diante do silêncio do Ministério Público e da Justiça, talvez seja uma forma de impedir que Riva delate de fato tudo que sabe, dando concretude a suas revelações.

Ah, como é complicada a política de Mato Grosso! Um labirinto. Um saco de gato. Um beco sem saída. Um novelo sem fim. Um rolo tremendo.  Uma formação de quadrilha. Para sobreviver em meio a ela, talvez só sendo aquele herói impossível que o poeta Aldir almejara. Vencer Satã, por aqui, nem com orações, porque Satã quase sempre nos aparece com cara de anjo – e muito dinheiro para distribuir.

é jornalista e blogueiro, é editor do blogue PAGINA DO E desde 2006. Como jornalista responde, até hoje, a processos que lhe foram movidos por Riva como reação ao fato de que ousou questionar o trato de Riva com a coisa pública.