Sei que o caso do ator Will Smith e do comediante Chris Rock é assunto ultrapassado, mas tenho que relembrá-lo, em uma ou duas linhas, para contextualizar este artigo: o irascível e soberbo Will, achando que a fama lhe dá o direito de fazer o que bem entende, estapeou, no palco do Oscar, o surpreso Chris, um daqueles comediantes que acham-se no direito de fazer a piada que quiser, sobre quem entender.

O episódio terminou com a suspensão do valentão por 10 anos da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas e do Oscar.

Não me preocuparia com este caso, se ele tivesse terminado aí. Mas não parou: muitas pessoas levantaram a possibilidade de um viés racista na punição do destemperado Smith. Ou seja, a Academia condenou o ator por ele ser negro. O castigo não seria tão rigoroso -dizem alguns– diante de um agressor branco.

 

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Imaginem que, se no incidente em questão, o valentão fosse um homem branco e a vítima, negra. Nessa hipótese, nenhuma punição seria suficientemente rigorosa para apaziguar os ânimos dos defensores da igualdade racial.

O que quero dizer é que, embora as pessoas estejam absoluta e totalmente certas em defender a igualdade racial, de gênero, social, ou religiosa não dá para sair por aí procurando chifre em cabeça de cavalo, encontrando motivações racistas onde existem apenas e tão somente condenação do destempero, da agressividade e da barbárie.

Estou de acordo com o corretivo dado ao Smith e não o acho exagerado. Só não defendo igual pena para o comediante, porque seria pedir a punição de um procedimento comum (normalizado?) entre esses profissionais que costumam ridicularizar pessoas, valores e moral de alguns grupos ou religiões. Tudo para eles parece permitido, desde que consigam tirar algumas risadas da plateia que paga caro para ouvir insultos, vulgaridades e grosserias. Para eles só existe um valor intocável: a “sacralidade” da liberdade de expressão.

Creio que, se os dois “astros” fossem brancos, a Academia teria procedido da mesma forma e o assunto teria morrido rapidamente. Entretanto se a vítima fosse negra e o agressor branco, haveria tanta pressão dos extremistas, que os julgadores só não levariam o branco à forca, porque ela não existe mais. Mas, se o agressor fosse preto e o agredido branco, incontáveis discursos inundariam a mídia, referindo-se à centenária opressão e escravização dos negros e que este desfecho não passaria de um revide, justificável após tantos anos de opressão.

 Ali, naquele palco não estavam dois negros se desentendo, eram sim dois homens presunçosos, um levando a extremos o seu desrespeito ao semelhante, e outro achando que pode distribuir tapas, quando se sentir insultado.

É condenável essa atitude de alguns grupos e também da imprensa de ver racismo em lugares onde só existe incivilidade. Esta sim, vigorosamente espalha-se pela sociedade, mostrando que o ser humano é um só, muito acima dos rótulos de raça, credo ou sexo.

Sutilmente um sentimento de revanche – que seria um racismo reverso – parece estar surgindo entre os atualmente discriminados. Não seria exagero pensar que eles, quando tiverem suficientes forças, segregarão os que hoje os discriminam, perpetuando este nefasto comportamento humano.

 

*RENATO DE PAIVA PEREIRA   é empresário e escritor em Mato Grosso.

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