O direito na redução na jornada de trabalho dos servidores públicos de Mato Grosso que tem cônjuge, filho ou dependente com deficiência foi alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada no Tribunal de Justiça, pela Procuradoria-Geral do Estado.
Isso porque, segundo os Procuradores que assinaram a peça inicial, a Lei Complementar nº 607/2018 possui vício formal, em decorrência de uma Emenda Parlamentar na Proposta que era de autoria do Poder Executivo, configurando em tese usurpação de competência.
O Projeto de Lei editado pelo Estado de Mato Grosso acrescentou o art. 124-A à Lei Complementar Estadual nº 04/90 (Estatuto dos Servidores Públicos da Administração Direta, das Autarquias e das Fundações Estaduais criadas e mantidas pelo Poder Público).
Ao ser encaminhado para Assembleia Legislativa, o texto originário teve um substitutivo integral apresentado pelo Presidente, Eduardo Botelho, que aumentou de 25% para 50% a redução na jornada de trabalho do servidor.
De acordo com a PGE, a mudança não poderia ter sido fruto de uma Emenda Parlamentar. Além disso, destacou na ação que o fato gerou aumento de despesa no Executivo em afronta ao disposto no art. 40, inciso I, da Constituição Federal.
Na Adin, os procuradores pediram a concessão de liminar para que seja suspensa a vigência da norma, com efeito ex tunc (retroativo à vigência) e no mérito que a lei seja declarada inconstitucional. No entanto, os pedidos estão paralisados no Executivo, que alega a regulamentação da lei, sendo que os servidores que possuem o benefício conseguiram ingressando com ações judiciais.
O caso foi distribuído ao Tribunal Pleno e está sob a relatoria do Desembargador Orlando Perri, que vai decidir se acata ou não o pedido liminar.
Os direitos da pessoa com deficiência e de sua família estão dispostos ainda no Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146 de 6 de julho de 2015) e na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência promulgada pelo Decreto nº 6449/2009.
Efeitos Reflexos
Em uma reportagem realizada pela Assembleia Legislativa no mês de maio, servidores públicos que possuem o benefício falaram sobre a importância na criação do filho com deficiência e outros, que não possuem, relataram as dificuldades que enfrentam.
É o caso da servidora Adriana Rossi, que há sete meses ingressou com pedido administrativo e ainda não obteve resposta.
“Uma rotina um pouco acelerada, porque tenho que dar conta do meu trabalho como se eu não tivesse uma criança com deficiência para cuidar e dar conta dessa criança com deficiência como se eu não trabalhasse. Então, assim, gera um pouco de culpa, da ausência que estou na vida desse filho que precisa, onde minha presença é insubstituível, ao mesmo tempo leva uma culpa ao meu trabalho por não estar dando ao máximo que eu gostaria de dar. É importante ressaltar que eu gosto do meu trabalho, eu quero trabalhar, mas se eu tenho outras demandas que eu não consigo atender, eu não vou ter emocional, enfim psicológico para atuar no meu trabalho como eu gostaria”, destacou.
Após ingressar com uma ação na Justiça, Solanyara Maria da Silva, servidora da SES, conseguiu a redução na jornada e há 10 anos percebe os avanços na vida do filho.
“Ele tem essa complexidade de patologia, de transtorno e limitações, mas isso não afetou vamos dizer assim, de uma gravidade maior ou mais severa, porque nós estivemos presentes na vida dele durante esses 11 anos dele”, afirmou.
Além disso, ela fala da saúde mental do servidor, que estando emocionalmente melhor tem condições de desenvolver seu trabalho com excelência.
“Deixa de trabalhar um período, mas isso não quer dizer que você tenha improdutividade, produtividade baixa. Pelo contrário, durante todos esses 10 anos de redução de trabalho, a minha produtividade sempre foi alta em decorrência da minha saúde emocional, minha saúde mental. Acredito que os gestores tem que observar essa lógica, porque o servidor com saúde mental equilibrada, vai produzir muito mais no trabalho”, assegurou.
Ela defende a aplicação da lei, que foi construída com todos os Poderes e com a sociedade civil.
Washington Vasconcelos, servidor do Fórum da Comarca de Cuiabá, também conseguiu a redução de jornada, que segundo ele, tem sido prioritário na vida da filha diagnosticada com autismo.
Ele defende a lei que reduz a carga horária por entender que somente com um acompanhamento diário os pais terão uma esperança de que um dia o filho tenha o mínimo possível de independência no futuro.
“Em sua maioria, a necessidade especial é para a vida toda. Talvez a única chance que os pais enxergam de um dia verem seus filhos com o mínimo possível de independência é ter um tratamento intensivo no começo, o momento de dar a criança aquilo que na maioria dos casos o poder público não pode oferecer”, frisou.
Presença Importante
Em vídeo institucional da ALMT, a psicóloga Ângela Alves fala da importância da presença da mãe na vida de um filho com deficiência.
“Acompanhei algumas crianças com seus pais e não é só com psicólogo com quem ele vai ter um acompanhamento, ele precisa do fonoaudiólogo, da equoterapia, ele precisa as vezes da fisioterapia. Então isso são intervenções que precisam de tempo e quem vai levar essa criança? (…) Essa criança vai ser um adulto no futuro e se ele não tem estímulo, não desenvolve uma autonomia, ele vai dar prejuízo mais tarde. Por que? Ele vai entrar em um asilo ou em alguma situação, que o órgão, o Poder Público, vai ter que resolver. Então, é mais fácil resolver no início, através de oportunizar a essa mãe mais tempo com esse filho, estimulando, (…)”, destacou.