Nesses meses as chuvas têm castigado grande parte do Brasil. São as águas doces mostrando a sua força e a sua supremacia. São as águas pedindo respeito ao meio ambiente.
São as águas mostrando quão poderosas elas são. Esse ir e vir temporal, a que me venho acostumando na convivência com os historiadores, tem-me levado a pensar bem mais no ir e vir das águas e principalmente na sua invisibilidade, nesse não se dar conta da perene presença das águas que passam pelas nossas vidas individuais, por nossos corpos, por nossos humores e pensamentos, por nossas casas e cidades, por nossas histórias e, o quanto elas precisam de atenção e cuidados.
Cuiabá, além de ficar a meia légua do rio homônimo entre os afluentes deste, o Coxipó Mirim e o Coxipó Açu, a vila do Cuiabá foi edificada seguindo o arco do córrego depois chamado Prainha, um afluente menor do Cuiabá, hoje centro da cidade de Cuiabá. Cuiabá nasceu nos caminhos das águas e o Prainha necessita da nossa atenção.
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Com o crescimento das cidades e com o êxodo rural, as cidades foram inchando. A pessoas vieram à procura de melhores condições de vida. E com elas, também, vieram todos os problemas causados pela ocupação desordenada, invasão das áreas públicas e privadas e um profundo desrespeito ao meio ambiente, acarretando poluição dos rios, lagos e córregos, tanto por parte da população, quanto pela inercia das autoridades responsáveis.
Em Cuiabá não foi diferente disso. Vários bairros surgiram aterrando nascentes, poluindo córregos, assim aconteceu com o Córrego Gumitá. Foi sufocado para dar lugar a Grande CPA. Sufocado para dar lugar às novas moradias, bem como, outras várias nascentes de córregos da região.
O córrego Gumitá, cuja nascente fica na Avenida Historiador Rubens de Mendonça – Bairro Morada da Serra, está localizado em um terreno de propriedade da empresa Guaná Construtora e Incorporadora Ltda., nas proximidades do IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis e da antiga chácara da Companhia de Saneamento do Estado de Mato Grosso – Sanemat.
Possui extensão aproximada de 6 km com área de 27.368m².
A nascente desse córrego está localizada nas coordenadas geográficas 15º35’S e 56º06’ W e altitude média de 165m, conforme informou o eng. Noé Rafael da Silva, ex diretor da antiga Sanemat.
O nome Gumitá é uma variação linguística regional do verbo vomitar, que significa lançar, expelir para fora. Com certeza, este recurso hídrico, não suporta o aumento da vazão por ocasião das chuvas torrenciais e assim suas águas, são lançadas, para fora da calha do córrego e por isso o nome Córrego Gumitá, informou Da Silva.
A bacia do Córrego Gumitá é totalmente urbana, onde grande parte de sua área de drenagem já foi antropizada, isto é, onde o homem já adentrou e manipulou o espaço, com várias edificações, pavimentos asfálticos, invasões na Área de Proteção Permanente – APP, sistema de tratamento de esgoto e outros equipamentos urbanos.
Após a nascente, este córrego atravessa os bairros: CPA-I, Centro América, Morada do Ouro-II, CPA-II, Tancredo Neves, CPA-III, Planalto, Novo Horizonte, Vila Rosa e Novo Mato Grosso, completamente poluído.
Nesse trajeto este manancial, recebe água do córrego do Caju que deságua no córrego Três Barras, que por sua vez recebe a contribuição do córrego Bangüe, formando assim o córrego do Moinho. Este deságua no rio Coxipó que, por sua vez, deságua no rio Cuiabá, todos acompanhados de águas servidas e esgotos produzidos pela cidade.
Tempos atrás, esta micro bacia hidrográfica, foi contemplada com o Projeto de Revitalização do Vale do Córrego Gumitá, na administração do prefeito Wilson Santos (1°/01/2005 até 30/03/2010), com previsão da construção de um coletor-tronco, visando impedir o despejo in natura do esgoto no córrego.
Também foi prevista construção de uma ciclovia, pista de skate, pista dupla, remoção e reassentamento de famílias que vivem em áreas de risco ao longo do córrego, contenção de processos erosivos do córrego, revitalização da área da Estação de Tratamento de Esgoto, incluindo atividades de educação ambiental, projeto este ainda, a executar pela municipalidade.
Informações do ex diretor dão conta que o Ministério Público Estadual – MPE firmou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a empresa Guaná para recuperar a área de preservação permanente onde está a nascente do córrego Gumitá, e outras nascentes, de propriedade dessa empresa. Esta nascente também recebe o lançamento irregular de efluentes, oriundos da Estação de Tratamento de Esgoto do Hospital de Câncer de Cuiabá, o que é objeto de outro inquérito civil. Será que foi realizado?
Laudo pericial emitido por especialistas do Ministério Público Estadual mostra que a nascente do Córrego Gumitá sofreu intervenções antrópicas, dentre as quais destaca-se o desmatamento das áreas de preservação permanente e aterramento da nascente. Além disso, estudos apontaram a possibilidade de a área já ter sido explorada por atividade garimpeira.
Observando as localidades, todas já urbanizadas, percebe-se que não houve por parte das autoridades responsáveis, principalmente vereadores, os quais tem as obrigações de fiscalizar as ações na cidade, aumento significativo de medidas no sentido de impedir, reparar os danos ambientais provocados pelas ações devastadoras ao longo do córrego Gumitá, na capital.
Assim sendo, sugerimos às autoridades, a instalação em cada travessia desse recurso hídrico, inclusive na nascente, placa de sinalização, tipo “TRAVESSIA DO CÓRREGO” GUMUTÁ, ou placa sinalizando “NASCENTE DO CÓRREGO GUMITÁ”, cujo objetivo é despertar no cidadão a consciência de preservação ambiental, da preservação das nascentes, da tomada de decisão, por parte das autoridades competentes, na implantação do tratamento dos esgotos, da arborização das áreas degradadas e outros.
Cuiabá agradece esse carinho com as águas doces potáveis urbanas.
*NEILA MARIA DE SOUZA BARRETO é jornalista, escritora, historiadora e Mestre em História. É membro da Academia Mato-Grossense de Letras (AML) e do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso (IHGMT).
E-MAIL: neila.barreto@hotmail.com
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