A Bíblia faz menções diferentes momentos da vida de Cristo, especialmente entre os 30 e 33 anos. Mas você já se perguntou como foi a infância de Jesus? Um fragmento de papiro esquecido por décadas numa biblioteca de Hamburgo, na Alemanha, pode ter algumas respostas.

O pedaço é a cópia mais antiga já encontrada, em 2024, do Evangelho da Infância de Tomé. Trata-se de um texto cristão que conta histórias de Jesus entre os 5 e os 12 anos de idade, período pouco detalhado nos evangelhos.

O manuscrito foi escrito provavelmente no século 2, mas a cópia recém-identificada foi datada entre os séculos 4 e 5. Até então, o trecho escrito mais antigo sobre o período remontava ao século 6.

A cópia estava guardada no acervo digital da Universidade de Hamburgo, na Alemanha, junto a documentos considerados “triviais”, como listas de compras. Até que dois papirologistas da Universidade de Liége, na Bélgica, o húngaro Lajos Berkes e o brasileiro Gabriel Nocchi Macedo, perceberam palavras como “Jesus”, “pardais” e “galho” no meio das treze linhas do texto.

“É uma história tão conhecida que chegou até o Alcorão”, disse Berkes em comunicado. Ele acredita que o fragmento pode ter sido um exercício de caligrafia feito por um estudante de escola ou mosteiro.

Qual o conteúdo do achado?

O fragmento do Evangelho de Tomé encontrado é considerado um texto apócrifo e, portanto, não é reconhecido pela Igreja Católica ou outras instituições cristãs. Por isso, em vez de sagrado, tem apenas valor histórico, para pesquisa historiográfica da região.

Um dos episódios descritos pelo texto mostra Jesus moldando 12 passarinhos de barro em pleno sábado, quando nenhum trabalho era permitido. Repreendido por José, ele bate palmas e faz os passarinhos ganharem vida e saírem voando.

Em outro trecho, ele se irrita com um menino que atrapalha suas brincadeiras com água e acaba amaldiçoando a criança. Ainda, o texto descreve Jesus ajudando o pai carpinteiro com um milagre: ele estica uma viga de madeira que estava curta demais.

Aos oito, Jesus ajuda José a plantar trigo, e um único punhado se transforma em uma colheita abundante, que é doada aos mais pobres. Ele também cura seu irmão Tiago após uma picada de cobra e ressuscita um menino que havia caído de uma casa.

As histórias ajudam a construir a imagem de um Jesus criança que estava descobrindo o alcance de seu poder. Mas sugerem, também, que as atitudes de Jesus preocupavam os adultos da vila, que acabaram exigindo que ele aprendesse a abençoar, e não amaldiçoar.

Gabriel Nocchi argumenta que, ainda que não prove a veracidade dos fatos relatados na Bíblia, o documento segue sendo digno de nota. “Isso que é interessante: discutir se a infância de Jesus foi assim ou não é para os teólogos, não diz respeito a historiadores”, disse, em entrevista ao UOL. “Nossa descoberta é importante para a história desse texto, pois nos permite entender como ele foi transmitido e confirmar que a língua original do texto era o grego”.

Mesmo sendo considerado herético por líderes cristãos do passado, o evangelho circulou bastante por séculos, em várias línguas e versões. É sabido, por exemplo, que ele era lido no Egito antigo. Hoje, após análise mais aprofundada dos pesquisadores, se tornou uma maneira de imaginar como teria sido a infância da figura mais importante do cristianismo.

(Por Redação Galileu)