“Estamos juntos há 10 anos e, desde o início do nosso relacionamento, sempre tivemos vontade de ser pais”, afirmaram os engenheiros Gustavo Catunda de Rezende, 29 anos, e Robert Rosselló Garcia, 31, de Brasília. Em entrevista exclusiva à CRESCER, o casal revelou que foi amadurecendo a ideia ao longo dos anos até que, no ano passado, finalmente decidiu que era o momento.
“Estávamos tentando entender como faríamos para realizar este sonho: se seria por adoção ou fertilização in vitro. Cada processo tinha suas dificuldades, mas foi quando conseguimos uma barriga solidária que realmente começamos a executar a ideia”, disseram.
A barriga solidária, isto é, quem se disponibilizou a gerar o bebê para o casal, foi Lorenna Resende, 27, a prima de Gustavo, que também mora no Distrito Federal. Já os óvulos seriam doados pela irmã dele, Camila Catunda, 20. “Nós fizemos a proposta para vários parentes e amigas que, por diversos motivos, naquele momento, não poderiam ajudar. Até que um dia falamos com a prima do Gustavo, e ela prontamente disse ‘sim’. Em relação à Camila, sempre foi conversado sobre a doação dos óvulos. Então, no decorrer desses 10 anos, ela sempre soube e estava disposta a ajudar”, contou Robert.
No entanto, na época, o casal se deparou com um impedimento: não era permitida a utilização do material biológico de um doador conhecido. “Tentamos de várias formas utilizar o óvulo da irmã do Gustavo. Contratamos uma advogada, consultamos alguns médicos, porém, não obtivemos sucesso. Avaliamos a possibilidade de entrar com um processo, mas demoraria pelo menos 2 anos e não sabíamos se nossa barriga solidária — a Lorenna — esperaria tanto tempo para realizar o procedimento”, explicou o engenheiro.
Mudança na legislação
Foi quando eles receberam uma boa notícia. Uma nova resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM), publicada em junho deste ano, alterou as normas que regulam a utilização das técnicas de reprodução assistida no Brasil. Até então, a doação de óvulos era anônima e não podia ter nível de parentesco. A partir de agora, parentes até o 4º grau podem doar óvulos para outro parente. Com isso, eles se tornaram o primeiro casal do Distrito Federal a realizar fertilização in vitro com óvulo doado por uma parente. “O fato de usar os óvulos da Camila concretiza um sonho antigo de ter nossos filhos, uma ‘misturinha’ de nós dois”, disse Robert.
“Arriscamos a dizer que fomos o primeiro casal do Brasil a realizar o processo de fertilização a partir da doação de material biológico de um doador conhecido. Após a publicação da nova resolução, o nosso processo demorou vinte dias até estarmos ‘grávidos’. Para nós, representa a materialização de um sonho antigo. E para a comunidade LGBTQIA+ — e até casais heterossexuais, que necessitem do processo de fertilização — é mais uma possibilidade na decisão de ter filhos”, afirmaram os dois.
Ajuda da família
Sobre ter doado seus óvulos para realizar o sonho do irmão, Camila disse à CRESCER: “Eu sempre achei muito legal poder ajudá-lo. Para mim, nunca foi uma questão”. Foi a primeira vez que ela passou pelo procedimento. “Incialmente, começamos com o amadurecimento dos óvulos, tomando remédios via oral e injeções subcutâneas na barriga. As injeções eram indolores, porém, eram ‘bombas’ de hormônios, então, durante o tratamento, meu humor ficou bem alterado. No dia da captação, foi tudo bem. Fui sedada e não senti dor alguma. Em aproximadamente uma hora, estava acordada e me recuperando da sedação. É um procedimento bem parecido com uma endoscopia”, descreveu.
Depois disso, foi a vez de Lorenna “entrar em cena”. Ela, que é divorciada e tem um filho de 6 anos, disse que recebeu apoio da família para gerar os bebês. “Hoje, obrigatoriamente, a barriga solidária já tem que ter pelo menos um filho. Então, se eu não tivesse, não poderia ajudar. Mas conversei com minha mãe, e ela super apoiou”, comentou.
O tão esperado ‘positivo’
Quando descobriram que o procedimento tinha dado certo, e mais, que eram gêmeos, Gustavo disse que a euforia foi “extrema”. “Estávamos na expectativa, já que havíamos transferido dois embriões. Quando confirmamos no ultrassom, a sensação foi de que todos os nossos sonhos haviam se realizado”, lembra. Lorenna está grávida de 13 semanas e os pais têm acompanhado todas as consultas e exames. “Estamos presentes diariamente”, afirmaram.
Lorenna disse que a barriga já começou a crescer. “Fomos muito agraciados pelo fato de os dois vingarem. Ficamos radiante, muito felizes, mas, lógico, também ficamos com um pouco de medo por ser uma gravidez ‘dobrada’. Não sei como meu corpo vai se comportar, ainda estamos muito no início, mas já notei que a barriga está muito maior se comparada à primeira gestação. Já não entro mais nos meus jeans”, brincou. Já Camila revelou está animada com a ideia de ter sobrinhos. “Estou muito feliz. Para nós, sempre foi apenas ‘doação de carga genética’. No nosso ponto de vista, usar meus óvulos foi a forma que encontramos de ter acesso a genética do meu irmão. Sobre ter meus próprios filhos, neste momento, almejo outros objetivos e ser mãe não está entre eles”, disse ela.
O casal ainda não sabe os sexos dos bebês, mas já discute sobre possíveis nomes. “Estamos com dificuldade para escolher. Gostaríamos que fossem nomes hispânicos, já que o Robert é cubano. Aceitamos sugestões (risos)”, disse Gustavo. Já em relação ao pós-parto, eles disseram que familiares e amigos estão “superdispostos” a ajudar. “Sabemos que cuidar de gêmeos será um desafio”, admitiram. Enquanto isso, o coração está na expectativa pela chegada dos bebês. “Ao mesmo tempo que existe uma extrema alegria de vermos nosso sonho sendo realizado, também estamos ansiosos tentando organizar o máximo de coisas para que quando eles estiverem aqui, tenhamos tempo para cuidar e curtir o momento”, disseram os dois.
Sobre os bebês, Lorenna garantiu que está preparada emocionalmente. “Todos nós passamos por um preparo psicológico. Toda essa parte que as pessoas julgam muito delicada, principalmente sobre o desapego com os bebês, tudo isso é acompanhado. Mesmo sabendo que eles não são meus, claro, há muitas mudanças hormonais e me sinto emocionalmente diferente. Mas eu entendo que os bebês não são meus filhos”, afirmou. “É um ato totalmente de amor. Você precisa se abster de vários aspectos da sua vida pessoal. Meu estilo de vida está mais regrado, estou mais calma, precisei abrir mão de várias coisas para ajudar a realizar um sonho que não é meu; fui escolhida para isso. Estou muito feliz. É uma gratidão que ultrapassa qualquer barreira, preconceito ou tabu”, finalizou Lorenna.