Março comemora-se o Dia Mundial da Água. O termo água refere-se, regra geral, ao elemento natural em si mesmo, desvinculado de qualquer uso ou utilização. Constituindo a substância mais abundante na Terra, o estoque natural de água existente no Planeta tem mantido constante as suas características quantitativas e qualitativas nos últimos 20.000 anos. Seria impossível viver sem a água? É um bem renovável, mas não deixa de ser limitado.

A água forma a maior parte do volume de uma célula e representa no ser humano cerca de 70% de seu peso. Importante testemunho dos corpos, a água passa pelos esgotos após prestar os mais humildes serviços, assumindo as formas dos diferentes recipientes que a acolhe e serve ao corpo nos seus mais íntimos gestos, num constante encontro e desencontro, universalizando os seus diferentes gestos.

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As regiões Norte e Centro Oeste, onde está o Estado de Mato Grosso, possuem juntas 84,2% das reservas de águas brasileiras. Em 1995 as cidades ocupavam 2% da superfície terrestre, mas consumiam 60% da água doce potável do planeta, com isso desencadeando impactos ambientais indiscutíveis.

Num outro sentido, as “transformações urbanas” muitas vezes, penetravam fundo no espaço doméstico, tal “como o fornecimento de água que poupou o trabalho de abastecer as casas”.

Tendo vivenciado por quase três décadas o dia-a-dia do gerenciamento público da captação, armazenamento, tratamento e distribuição de água doce potável na cidade de Cuiabá-MT, convivendo com a crescente parte “invisível” desta cidade, faço aqui um percurso mais ou menos cíclico, como o das águas.

Trabalhando com engenheiros, geólogos, químicos, biólogos, sanitaristas, compartilhei conversas sobre a situação atual das disponibilidades e perdas de águas de um modo que me parecia tão evidentemente importante, nem me preocupava escrever isso.

Conservei esse entendimento da importância das águas (e, em especial das águas doces potáveis urbanas), afinal, atrás do automatismo do gesto de abrir uma torneira e obter água em abundância, podemos encontrar uma longa história nada tranqüila, repleta de disputas e de alianças entre autoridades públicas e religiosas, entre comerciantes, engenheiros, médicos e a população pobre.

Esse ir e vir temporal, a que me venho acostumando na convivência com os historiadores, tem-me levado a pensar bem mais no ir e vir das águas e, principalmente, na sua invisibilidade, nesse não se dar conta da perene presença das águas que passam pelas nossas vidas individuais, por nossos corpos, por nossos humores e pensamentos, por nossas casas e cidades, por nossas histórias, bem como, examinar as políticas e ações governamentais de abastecimento de água doce potável na vila e na cidade de Cuiabá, como aspectos decisivos na produção e na reprodução deste ambiente urbano que varou séculos e, hoje, é a cidade de Cuiabá.

O arraial inicial e depois a vila do Cuiabá tiveram sua localização mais ampla, continental, definida nos anos 1770. O rio Cuiabá está ligado à história da vila e da cidade às quais deu nome. Da Serra Azul, onde é débil veio cristalino, vem lambendo o sopé da cordilheira grandiosa, borbulhante, seguindo o caminho do seu destino, semeando vida.

As cabeceiras de drenagem, ou “veredas”, ocorrem nas serras Arara e Azul, e no planalto da Chapada dos Guimarães. A principal nascente está em Rosário Oeste-MT, a 120km da capital. A porção Sul é ocupada por extensa planície (terras baixas e planas), constituindo o Pantanal mato-grossense. O rio Cuiabá (e seus tributários) é responsável por 69,3% do abastecimento público de água doce potável na área de sua bacia. Nos municípios de Cuiabá e Várzea Grande, atende respectivamente 95% e 82% da demanda de água potável.

Toda água doce potável consumida pela população da micro-bacia retorna ao rio Cuiabá por esgotos, fator potencial de contaminação da qualidade da água. Além disso, serve de abastecimento da zona rural, a irrigação, a geração de energia elétrica, navegação, lazer, pesca e diluição de esgotos domésticos e industriais.

Nas várias versões da história da vila e da cidade de Cuiabá, o rio homônimo foi roteiro de aventuras esplendorosas, de epopéias trágicas e grandiosas, de práticas cotidianas quase invisíveis a viajantes e desbravadores. É um elemento principal de paisagem, representa vida para a cidade. Vivemos em contato com ele, vivemos dele, somos íntimos dele. A nossa culinária está ligada a ele. O nosso linguajar está ligado nele. O nosso peixe advém dele. As hortas estão em seu entorno, a cerâmica, as redes e a rapadura.

Foi e é reservatório de inspiração para a construção cotidiana da cultura ribeirinha e urbana. Nele, as artes, a música, as literaturas têm perene fonte de inspiração. Festas e danças como Siriri, Cururu, São Gonçalo, as lavações de São João, a festa de São Pedro, padroeiro dos pescadores, para os cuiabanos não são tradições, são vivências. Comer peixe, principalmente os mais nobres como o pacu assado, a mugica feita do pintado, a pacupeva cozida acompanhada do arroz sem sal, o bagre ensopado e a piraputanga recheada com farofa de banana da terra, não são pratos típicos da culinária cuiabana, são pratos do dia a dia, oriundos das famílias ribeirinhas. São comidas que invadiram os lares cuiabanos e, se tornaram costumes e culinária tradicional. Cultuar os santos como Nossa Senhora, São Benedito, Senhor Divino, São Pedro, São Gonçalo, São João, festejá-los, lavá-los hoje, nas águas do rio Cuiabá ou, como outrora, em suas Fontes, Poços, Chafarizes e Bicas não são folclores, mas costumes que marcam as relações profundas dos córregos, rios, das suas águas com os moradores, num encontro de vida com as suas águas doces potáveis sagradas e profanas.

E de práticas cotidianas quase invisíveis aos viajantes e desbravadores. Estas, principalmente às relacionadas à captação, armazenamento, tratamento e distribuição de água doce potável urbana.

Outro rio decisivo na bacia do Cuiabá é o Coxipó, considerado de água doce potável pela Lei Provincial (MT) n° 7 de 1873, onde descobriu nas suas margens, ouro em abundância. Sua nascente fica na atual zona urbana do município de Chapada dos Guimarães-MT, localizado a 70 km da Capital mato-grossense, na Serra de Atimã, que remonta ao aldeamento fundado com o nome de Sant’ana de Chapada em 1751. O Coxipó corta a área do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães e incorpora pelos seus caminhos vários ribeirões e córregos, entre eles, o rio Mutuca, antes denominado de Butuca e, ao final, desemboca no rio Cuiabá. O rio Coxipó tem 82 km de comprimento, com micro-bacia de cerca de 700 km quadrados e localiza-se no centro-sul de Mato Grosso, ligando o planalto (Chapada dos Guimarães) à baixada cuiabana (Cuiabá) e contribui hoje para o abastecimento de água doce potável da cidade de Cuiabá com a estação de abastecimento de água denominada Coxipó do Ouro.

O rio Coxipó Açu, também importante para a formação do Cuiabá. Fica localizado hoje, na cidade de Nossa Senhora da Guia-MT povoada desde o século XVIII. Localiza-se na bacia fluvial do rio Cuiabá, entre a sua margem esquerda e a do seu tributário o rio Coxipó-Açu. A primeira denominação dada ao Coxipó-Açu foi “Coxipó-Guaçu”, e acredita-se ser de origem indígena (Índios Coxipones). Sua rede hidrográfica é composta pelos seguintes cursos d’água: rios Cuiabá, Coxipó-Açu, Bandeira, Machado; ribeirões Forquilha, Taquaral, Tucum, Baús. Dois Córregos e os Córregos Soberbo, Forte, Ouro, Machadinho, Capão do Caju, Fundão, Coivara e o Córrego Boi de Pena. Pelo aspecto sociocultural, Guia se situou em um dos pontos principais do famoso caminho que seguia para as Minas de Diamantino.

Nesses rios, o povo ribeirinho vive refletindo a sua significação na população urbana através dos seus artesanatos, pesca, lazer, festas de santos. Essa vocação das águas dos rios Cuiabá e Coxipó de dar vida e contribuir para a formação das cidades de Cuiabá, Várzea Grande, Nossa Senhora da Guia e outros municípios, é importante para Cuiabá.

O córrego Prainha, além de ficar a meia légua do rio Cuiabá e entre os afluentes deste, o Coxipó Mirim e o Coxipó Açu, a vila do Cuiabá foi edificada seguindo o arco do córrego depois chamado Prainha, como já foi visto, um afluente menor do Cuiabá, hoje centro da cidade de Cuiabá. Outros córregos como os atuais, Barbado e Manoel Pinto, por estarem à época ainda mais distantes dos limites edificados da vila e do porto, não têm representação. Mas fica evidente que a localização da vila e da cidade foi privilegiada por fios d’água expressivos. O córrego Prainha permitia a entrada de pequenas embarcações até a praça do Aracaty, atual Ipiranga, ladeada pelo córrego Cruz das Almas, onde às suas margens os homens vendiam os seus pescados à população.

Nos anos de 1850 a cidade cresceu em torno de dois novos eixos de expansão: a sudeste, pelo caminho que ia ao Coxipó; a noroeste, buscando o bairro Lava – Pés, no além Boa Morte. O “Plano” de 1777 indicava sete fontes contornando a vila: a do “Ernesto”, a de Maria Corrêa, a do Mundéu, a “junto de Feliciana Gomes”, a “junto a Manuel da Silva”, a da Mandioca e a “detrás da igreja”. A do “Ernesto” mais ou menos onde hoje está o Morro da Luz, a de Maria Corrêa seria a da (no sentido de rua da margem esquerda do córrego) Prainha, a do Mundéu seria na parte leste do atual terminal “Bispo”, as duas “junto” – de Feliciana e Manuel – e a da Mandioca estavam as três no circuito da atual praça do Conde de Azambuja e a “detrás da igreja”, ou da Matriz era na atual Isaac Póvoas, fronteira à atual praça Rachid Jaudy (e no século XIX e XX passou a ser a “Cacimba do Soldado”).

No pós-guerra do Paraguai a vida urbana da cidade de Cuiabá foi intensificada, incentivada pelo aumento de fluxos de capital e créditos, havendo a necessidade da implantação de políticas públicas de captação e distribuição de água doce potável na vila e na cidade de Cuiabá, o que foi feito entre os anos de 1790 a 1886.

Anterior ao ano de 1790, algumas autoridades provinciais desejaram dotar a Vila de um sistema de abastecimento público de água doce potável por meio de um valo do córrego Motuca até o Jacé, na Vila do Senhor Bom Jesus de Cuiabá, porém, somente no ano de 1882, foi efetivado.

No ano de 1790 foi construído o Chafariz e seu Aqueduto, no Largo do Rosário. Em 1808, há referências a um “Chafariz” na Mandioca. Em 1850, uma das bicas da Mandioca balizava o fim da rua da Mandioca (começando esta no “Beco Empinado”): “até a última bica”. Entre os anos de 1858 e 1863, o Arsenal de Guerra de Cuiabá distribuía água potável em vários pontos da cidade. Pressionado pela população, o presidente da província tomou a decisão de construir um açude próximo à igreja do Rosário, mais conhecido como Tanque do Bahú.

A Cacimba do Soldado, nativa no terreno da chácara, na antiga Praça Santa Rita e atual Praça Rachid Jaudy era uma fonte natural que formava um lago na Rua Barão de Melgaço.

Em 1868 o governo provincial estimulou por meio de lei a construção de um chafariz no “Largo do Ipiranga”, a ser alimentado pelas águas de manancial existente na “parte superior da Travessa do Vilas-Boas. Ou, não sendo estas suficientes, trazendo as do rio Cuiabá, “por meio de um encanamento”.

Nesse mesmo ano parte da população do Porto coletava água em um “Tanque da rua Bela”, que ficava “antes de chegar no Arsenal de Guerra” (indo da “cidade” para o “porto”), no último trecho da Rua 13 de Junho. Esse tanque tinha o nome de Limoeiro, também conhecido como Bica do Limoeiro, no final da rua Bela do Juiz quase ao sair ao largo do Arsenal de Guerra.

Em 1871 o governo provincial construiu “um reservatório d’água no antigo quintal do Maranhão, bem como um aqueduto para alimentação do chafariz do largo da Conceição, ” atual praça Bispo Dom José, ou simplesmente “Praça Bispo, em 1872.

Chegava-se, assim, no fim dos anos 1879, aos limites algumas fontes de água potável que circundaram o centro da vila e da cidade de Cuiabá durante cerca de 150 anos.

Havia também, mais ou menos próximos ao centro da cidade, outros pontos de abastecimento de água potável, como o Tanque do Baú, o Tanque Natural, o Poço da Lixeira, dois poços vizinhos ao Tanque do Baú, etc. O poço da Lixeira ficava ao lado da chácara de propriedade da senhora Maria Gisbraz, fundadora do bairro, conhecida como uma excelente doceira e cultivadora da terra.

Além desses lugares de água doce, mais próximos ao centro da cidade, havia outras alternativas de abastecimento de água doce potável como o Tanque dos Bugres, também conhecido como Tanque do Menor, que abastecia parte dos moradores do segundo Distrito, atual bairro do Porto.

Em fins de 1880 o governo de Mato Grosso publicou em jornal de circulação nacional nota de chamada a “concorrentes para o abastecimento d’água à capital da província”. Os parágrafos seguintes são baseados nesse documento.

Em maio do ano seguinte o governo assinou contrato com os empresários João Frick e Carlos Zanotta. Era um contrato de 180 contos de réis, que o governo deveria pagar “em cinco prestações iguais”.

Na “Praça do Palácio” seria construído “um Chafariz de repuxo”. Quatorze fontes seriam instaladas nos seguintes pontos: fundos da Matriz, “aquém da Ponte do Rosário”, rua Primeiro de Março (na sua bifurcação em rua 7 de Setembro e Beco do Candeeiro), no Beco Torto perto da rua 11 de Julho, na esquina da travessa da Assembléia com a rua Barão de Melgaço, na esquina da rua Barão de Melgaço com a travessa da Câmara, Largo da Boa Morte, Mundéu (no Largo da Caridade), no largo do Bispo Dom José, no largo do Ipiranga, rua 13 de Junho (no “canto Costa Campos”), no largo do Arsenal de Guerra, “Perto” da igreja de São Gonçalo, no largo do Capim. Cada uma dessas 14 fontes conteria duas Borne Fontaines. Oito dias após a conclusão das obras e funcionando o sistema, sua “conservação, custeio e administração” passariam à responsabilidade do governo provincial.

Em abril de 1882 começaram as obras, “principiando os trabalhos com a escavação para o reservatório ao noroeste da praça do Aracaty”. Em novembro desse ano as obras do novo projeto foram concluídas. O sistema público de abastecimento de água potável foi inaugurado em 30 de novembro de 1882, no espigão do taboleiro da Boa Morte, em areia lavada e tijolinhos, com capacidade para 1.000m³ (1 milhão de litros) de água, pelos empresários João Frick e Carlos Zanotta. Só uma terça parte da população da cidade ficou beneficiada, com dois horários de distribuição: das 6 às 8 horas e das 17 às 20 horas, diariamente. Na praça Alencastro, centro da cidade, o chafariz de repuxo foi inaugurado.

A partir de então, a concepção do ambiente urbano da cidade de Cuiabá, principalmente em seu centro, começava a ser marcada pelo abastecimento de água não mais brotando em fontes naturais, explícitas, mas serpenteando por canos ocultos, correndo caminhos produzidos industrialmente, longos cilindros de metal escondidos sob a terra, parte invisível (para a maioria dos moradores) da cidade é equipamento urbano oculto.

Em agosto de 1883 o governo provincial autorizou os empresários a ampliar o sistema de abastecimento e estendeu para 25 anos seu direito a explorar o fornecimento de água a domicílios (cujo número aumentou). Em fevereiro de 1884 foram concluídas as obras da ampliação e o engenheiro das obras públicas constatou a quadruplicação da capacidade de distribuição de água. A extensão da rede domiciliar aos bairros da Boa Morte e Lava-pés só foi efetivada em 1911. As águas do chafariz da boa Morte, ou seu “reservatório” bem mais tarde, já no século XX.

Após a implantação desses sistemas, autoridades da época se preocuparam em regulamentar o sistema de abastecimento da cidade e, com isso constituíram conforme Lei n. º 735, de 03 de março de 1887 foi promulgado em 19 de junho desse ano regulamento para o funcionamento da Hidráulica que no período funcionava regularmente, tendo como diretor o engenheiro da província.

A instalação dos medidores também serviria para controlar o consumo d‘água e, ao mesmo tempo, poderia regularizar o fornecimento de água dos bairros que não estavam sendo atendidos. A medida do possível, a Diretoria de Água foi substituindo os canos velhos por outros de maior capacidade, a fim de se evitar o desperdício da água e melhorar o abastecimento dos bairros que ficavam localizados na parte alta da cidade, como era o caso do bairro Lava-pés, no alto da Boa Morte.

Pressionados pela população em 1904, há a implantação da canalização da água da rua Couto Magalhães, atual Avenida D. Aquino e a extensão de um ramal desse encanamento para o Beco Quente, atual Comandante Baldoino.

Outra melhoria feita na cidade de Cuiabá antes de 1912, foi a colocação de 14 Fontes Públicas, chamadas de “Borne Fontaine”, que eram pequenas bicas cilíndricas de ferro, instaladas simultaneamente ao primeiro sistema público de abastecimento de água doce potável inaugurado em 1882. Essas bicas também, eram conhecidas na cidade como “Boca de Leão”, as quais forneciam água à população pobre que não podiam efetuar o pagamento pelo consumo da água.

Pelo menos desde a segunda metade do século XVIII algumas residências do centro da Vila Real do Bom Jesus do Cuiabá dispunham de acesso privado a mananciais de água potável. Inventários pós morte, relatórios policiais, processos judiciais e alguma documentação iconográfica demonstram claramente a existência de muitos poços nos quintais das “casas de morada” ou das “casas de residência”.

Nas casas, num dos cantos, o pote de barro com o seu tampo de madeira e junto dele, pendurada num fio, a pedra ume para purificar a água, retirada das fontes, bicas, chafarizes, poços e rios. A presença da pedra ume talvez caracterizasse o medo da população em contrair doenças advindas da água. Em tanques e depósitos domiciliares, lambaris e cascudos foram utilizados como “purificadores” naturais, ingerindo lodo das paredes.

Na virada do século XIX para o XX, ainda se encontrava em residências de Cuiabá o “filtro de pedra”, que por vezes lembrando “enorme seio generoso, arredondado”, ia “gotejando lento e carinhoso a água cristalina”.

Em 1886, mais de 400 penas domiciliares estavam instaladas em residências da cidade. Quase 77% delas concentravam-se na margem direita do Prainha.

Em 1897, o comércio da cidade de Cuiabá aparentemente já contava com demanda de bombas hidráulicas, canos de goma e de lona, aparelhos de louça para lavatório, pedra mármore para lavatórios e outros itens similares, indicativos nas novas formas de se materializar a captação, o transporte e os usos da água potável na cidade.

Somente após 1941 é que o sistema de abastecimento de água doce potável recebeu tratamento através de produtos químicos, com a construção da Estação de Tratamento “Eng. José Brunello Bombana”, na Rua Presidente Marques. Em 1966 foi constituída a Companhia de Saneamento do Estado de Mato Grosso – SANEMAT, iniciando as suas atividades em 27 de janeiro de 1966. Foi extinta o órgão anterior, a EFLA – Empresa de força, Luiz e Água. No governo Pedro Pedrossian foi construída uma nova Estação de Tratamento de Água – Austregésilo Homem de Melo “BARÃO, na Avenida São Sebastião, inaugurada em 1970. Foi projetada para atender Cuiabá, até o ano 2.000. No entanto, em 1975 houve a necessidade da sua ampliação, em função do crescimento da cidade. As duas estações compõem o Memorial da Água Eng. José Luiz de Borges Garcia.

Em março de 1990, em função do crescimento da região do Coxipó, a Sanemat implantou a Estação de Tratamento de Água “Eng. Osvaldo Gomes Bezerra”, no bairro Tijucal. Com o crescimento da cidade de Cuiabá, apesar da existência de inúmeras estações de tratamento de água existentes para abastecer à população, o engenheiro José Luiz de Borges Garcia, em 1975, já ponderava a necessidade de uma nova estação de tratamento de água, para atender uma população de Cuiabá, em seus 300 anos.

 

*NEILA MARIA DE  SOUZA BARRETO é jornalista, escritora, historiadora e Mestre em História. É membro da Academia Mato-Grossense de Letras (AML) e do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso (IHGMT).
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