A julgar pelos mais recentes conclaves, a eleição do sucessor do Papa Francisco será bem tranquila, levando no máximo uma semana e sem grandes polêmicas na votação. No entanto, nem sempre foi assim: nos séculos passados, os conclaves já foram marcados por acontecimentos bastante inusitados (e até violentos).

Confira alguns dos conclaves mais notórios:

236: Fabiano era um fazendeiro romano que resolveu visitar Roma na época em que o conclave estava acontecendo. O historiador Eusébio afirma que uma pomba pousou na cabeça de Fabiano, o que foi entendido por todos como uma manifestação do Espírito Santo. O homem, que nem candidato era, foi eleito com unanimidade. De fato, ele foi considerado um dos melhores Papas da primeira fase do Cristianismo.

532: nessa época, era muito comum a prática da simonia (compra ou venda de cargos eclesiásticos, itens sagrados ou sacramentos). Após a morte do Papa anterior, a Igreja passou dois meses numa esbórnia de venda de itens sacros. O Senado de Roma precisou intervir: baixou um decreto que proibia a simonia. O próprio rei ostrogótico da Itália, Atalarico, participou da elaboração do documento. O Papa João II, que acabou eleito, era muito amigo desse rei. Ele foi o primeiro papa a adotar um nome diferente do seu próprio.

1241: a eleição estava demorando demais. Após 60 dias sem resultados, os dez cardeais que haviam sobrado na votação foram trancados num prédio malcuidado onde não havia limpeza dos banheiros e nem médicos para cuidar dos doentes. De acordo com o livro “Behind Locked Doors: A History of the Papal Elections“, de Frederic Baumgartner, os cardeais só chegaram a uma decisão após um deles morrer e o governo de Roma ameaçar exumar o corpo e deixar a decisão com ele. Assim, o Papa Celestino IV foi eleito (e morreu 15 dias depois, tornando-se o papa com o papado mais curto da história). Foi assim que virou costume trancar e isolar os bispos para o conclave, mantendo-os livres de qualquer influência.

1269: esse ano marcou o início do conclave mais longo de todos, após a morte do Papa Clemente IV no ano anterior. A população local de Viterbo (cidade italiana onde o conclave estava sendo realizado), frustrada com a demora, barricou as portas e janelas e reduziu os suprimentos dos cardeais a pão e água. Em junho de 1270, ainda sem uma deliberação, o povo arrancou o telhado do palácio, deixando os religiosos expostos ao clima. Diz a lenda também que eles estavam seguindo as orientações de um cardeal para que o Espírito Santo pudesse descer com mais facilidade. Mas não adiantou muito: o Papa Gregório X só foi eleito em 1271.

1287: este conclave demorou tanto que seis cardeais morreram ao longo das reuniões por causa do calor em Roma. Após longos onze meses, os cardeais, já exaustos do processo, elegeram um frade franciscano que não queria o cargo. Foi preciso uma segunda votação para que ele enfim aceitasse e se tornasse o Papa Nicolau IV.

1292: após a morte do Papa Nicolau IV, do tópico anterior, houve mais um conclave demorado: foram 28 meses de deliberações até os cardeais resolverem eleger um ermitão de 85 anos, que acabou se tornando o Papa Celestino V. Ele abdicou do papado cinco meses depois.

1378: nessa época, o papado havia retornado a Roma há pouco tempo após passar uma época sediado em Avignon, na França. Quando este conclave aconteceu, uma turba de civis, tremendo que o papado voltasse à França, se reuniu ao redor do conclave exigindo que um Papa romano fosse eleito — “se non che tutti vi occideremo” (“caso contrário, matamos todos vocês”). Dito e feito: Bartolomeo Prignano, de Nápoles, foi eleito e se tornou o Papa Urbano VI. Mas seu papado foi um desastre, levando alguns cardeais a declararem sua eleição inválida e a formar um novo conclave. O Papa que eles elegeram, Clemente VII, levou o papado de volta para Avignon. Essa divisão permaneceu por quatro décadas, com os papas de cada lado invalidando e excomungando os do outro.

1492: este foi o conclave em que Rodrigo Bórgia, aristocrata espanhol influente e adúltero, se tornou Papa comprando votos. Bórgia usou sua influência, riqueza e conexões para obter apoio de cardeais, pagando grandes somas de dinheiro ou oferecendo favores e terras em troca de votos. Esta eleição, aliás, é um dos episódios mais notórios de corrupção na história da Igreja. Ela teve um impacto grande nas reformas que aconteceram nos séculos posteriores.

1503: o conclave mais curto da história. Demorou apenas algumas horas para que Giuliano della Rovere fosse eleito o Papa Julio II. Ficou conhecido como o “papa guerreiro” por liderar pessoalmente campanhas militares a favor de territórios papais.

1605: este conclave ficou marcado porque teve briga de mão. Os cardeais, divididos entre dois candidatos, ficaram tão exaltados que começaram a se agredir. O cardeal Visconti, já idoso, ficou com vários ossos quebrados, tornando-se o único caso registrado de ferimento em um conclave. No final, nenhum dos dois favoritos foi eleito e o escolhido foi um papa (Paulo V) que representava um meio-termo entre os dois lados.

1623: os cardeais presentes no conclave foram surpreendidos por um enxame de abelhas que, diz a lenda, invadiu a sala e se dirigiu ao Cardeal Maffeo Barberini (cujo brasão, coincidentemente, tinha abelhas). Os cardeais interpretaram isso como um sinal e o elegeram Papa.

1655: um grupo de jovens cardeais resolveu aplicar uma pegadinha nos mais velhos: um deles se vestiu de Espírito Santo e foi assustar os mais velhos na calada da noite. É dito que um cardeal ficou tão chocado que caiu no chão frio e, por causa disso, morreu de pneumonia.

1831: este foi o conclave mais longo da era moderna, durando 50 dias. O eleito foi um monge camaldulense (ordem da família dos Beneditinos) que assumiu o nome de Gregório XVI. Extremamente reacionário, ele impediu que ferrovias fossem construídas em terras papais. Foi a última vez que elegeram um monge como Papa.

1903: esta foi a última ocasião em que um imperador aplicou veto a uma eleição papal. O imperador Franz Joseph, da Áustria, anunciou seu veto contra o cardeal secretário de estado, que era o favorito ao título. Outro cardeal foi então eleito, tornando-se o Papa Pio X, que é também o último Papa a ser canonizado como santo.

1978: este foi um ano difícil por causa do calor absurdo que fazia em Roma. Até então, durante o conclave, os cardeais ficavam abrigados no Palácio Apostólico, que tinha as janelas seladas. Revoltados, os cardinais exigiam que elas fossem abertas. O Papa João Paulo I foi eleito (contra sua vontade), mas morreu 33 dias depois, tornando necessário um segundo conclave no mesmo ano. Após esse segundo ritual, o novo Papa eleito, João Paulo II, ordenou a construção da Casa de Santa Marta, uma pousada com mais de 100 suítes para os cardinais se instalarem durante o conclave. É lá que eles se hospedam até hoje durante a cerimônia. As janelas, entretanto, permanecem lacradas durante o conclave.

2013: o conclave que elegeu o Papa Francisco começou de forma inusitada: um falso cardeal, vestido com robes falsos, invadiu uma reunião pré-conclave, tentando passar despercebido. Ele se apresentou como “Basilius” e disse aos padres ser membro da Igreja Ortodoxa Italiana (que não existe). Foi descoberto pelos guardas e levado pra fora.

(Por Victor Bianchin)