Um novo mapeamento da superfície queimada pelo fogo no Brasil revela que a área queimada entre 1985 e 2022 foi de 185,7 milhões de hectares, ou 21,8% do território nacional.
A média anual alcança 16 milhões de hectares/ano, ou 1,9% do Brasil.
São extensões comparáveis a países: no caso do acumulado em 38 anos, a área equivale à soma da Colômbia com o Chile; na média anual, ao Suriname.
Os dados são da Coleção 2 do MapBiomas Fogo, lançados no Seminário “Fogo no Brasil: Estratégias aplicadas ao Manejo Integrado do Fogo (MIF)”, nesta quarta-feira (26), com apoio do PrevFogo-Ibama.
O conjunto de informações sobre as cicatrizes deixadas pelo fogo sobre os mais de 851 milhões de hectares do território brasileiro são obtidas a partir de imagens de satélite e processamento em nuvem.
O MapBiomas Fogo não contabiliza o número de focos de calor, mas sim a extensão consumida pelas chamas.
A área afetada pelo fogo varia entre os seis biomas brasileiros, com o Cerrado e a Amazônia concentrando cerca de 86% da área queimada do Brasil, entre 1985 e 2022.
O Cerrado queimou, em média, 7,9 mha/ano, ou seja: todo ano uma área maior que a da Escócia queimou apenas nesse bioma.
No caso da Amazônia, a média foi de 6,8 milhões de hectares/ano – quase uma Irlanda.
Mas, quando se analisam as áreas dos biomas, a liderança é do Pantanal, que teve 51% de seu território consumido pelo fogo nesse período.
O Estado de Mato Grosso apresentou maior ocorrência de fogo, seguido pelo Pará e Maranhão.
Os municípios que mais queimaram no país entre 1985 e 2022 foram Corumbá (MS), São Félix do Xingu (PA) e Formosa do Rio Preto (BA).
Os dados do MapBiomas Fogo dão importantes pistas para que os governos federal e locais possam combater queimadas e incêndios.
Além dos biomas, estados e municípios de maior incidência, o mapeamento também mostra os períodos do ano de maior incidência.
Em nível nacional, os meses entre julho e outubro concentram 79% da área queimada no Brasil, com setembro respondendo por 34% do fogo.
Mas o registro mensal de fogo varia entre os biomas.
No caso da caatinga, por exemplo, aproximadamente 60% do fogo acontecem entre outubro e dezembro; no Cerrado, 89,5% do fogo ocorre principalmente entre julho e outubro.
“Com essa série histórica de dados de fogo, podemos entender o efeito do clima e da ação humana sobre as queimadas e incêndios florestais. Por exemplo, percebemos claramente que, em anos de El Nino, temos mais ocorrência de incêndios, como nos últimos El Ninos (2015 – 2016 e 2019), se comparados aos anos de La Niña, quando chove mais na Amazônia (2018 e 2021). A exceção a essa regra foi 2022, quando, mesmo sendo um ano de La Nina, a Amazônia queimou bastante”, explica Ane Alencar, Coordenadora do MapBiomas Fogo e Diretora de Ciência do IPAM.
“Na realidade, para que o fogo ocorra e se espalhe, precisa de uma combinação de três ingredientes: precisa ter material em quantidade e em boas condições de queima, um clima favorável para a queima e uma fonte de ignição. A história do fogo contada pelos dados do MapBiomas demonstra claramente tanto os anos de maior seca quanto os anos de maior desmatamento”, completa.
Sobre o Manejo Integrado de Fogo (MIF), Ane explica que “as pessoas acham que todo o fogo é só ruim. O fogo só é ruim quando é utilizado de forma inadequada e em biomas que não dependem do fogo para se manter, como a Amazônia. Em biomas como o Cerrado, o Pantanal, o Pampa, o fogo tem um papel ecológico e ele deve ser manejado de forma correta para não virar um agente de destruição. Para isso, as práticas relacionadas ao Manejo Integrado do Fogo (MIF) são importantes pois elas podem, através das queimas prescritas e controladas, reduzir a quantidade de material combustível e evitar grandes incêndios”.
Vera Arruda, coordenadora operacional do MapBiomas Fogo e pesquisadora do Ipam, acrescenta que “o Cerrado é um bioma que evolui com a presença do fogo, sendo parte natural do seu ecossistema, onde muitas espécies vegetais e animais dependem dele para sua sobrevivência. Porém a frequência e intensidade do fogo têm aumentado nos últimos anos, devido ao desmatamento e às mudanças climáticas que causam o aumento da temperatura e da seca.”
AMAZÔNIA E CERRADO
Em todo o Brasil, cerca de 63% da área afetada pelo fogo foi queimada mais de uma vez em 38 anos.
Mas esse percentual muda quando analisamos a área queimada em relação ao bioma.
No caso do Pampa, da Mata Atlântica e da Caatinga, por exemplo, a área queimada uma única vez entre 1985 e 2022 corresponde a 80%, 72% e 65% do bioma, respectivamente. Na Amazônia, entretanto, apenas 39% foram queimados uma única vez.
Quase metade (48%) foi queimada entre duas e quatro vezes, sinalizando que a maioria das queimadas na Amazônia são recorrentes.
O percentual de áreas queimadas recorrentemente na Amazônia é maior do que no Cerrado, onde 36% da área queimada pegou fogo uma única vez.
O fogo recorrente, de duas a quatro vezes entre 1985 e 2022, atingiu 38% da área queimada no Cerrado no período – 10% a menos que na Amazônia e 5% a menos que no Pantanal, onde a área queimada de duas a quatro vezes correspondeu a 43% do bioma.
Em contrapartida, o Cerrado é o bioma que tem a maior quantidade de áreas com recorrência de eventos de fogo maiores que 16 vezes, ou seja, áreas que queimaram pelo menos a cada 2 anos, totalizando mais de 2 milhões de hectares.
Mais de dois terços (68,9%) do fogo no período ocorreram em vegetação nativa; apenas 31,1% foram em área antrópica.
Campos e Savanas são o tipo de vegetação nativa que mais queima; no caso de tipo de uso de solo, é a pastagem.
Mas a proporção varia entre os biomas.
Na Amazônia e Mata Atlântica, a maior parte do fogo ocorreu em áreas antrópicas, como pastagem.
Os demais biomas seguem o padrão nacional, com a maior parte do fogo ocorrendo em vegetação nativa.