É pule de dez a substituição de Fernando Diniz por um estrangeiro no São Paulo, como também parece ser questão de tempo o anúncio do argentino Hernán Crespo. O processo de escolha é elogiável. Além de servir para conhecer melhor treinadores de menos visibilidade no Brasil e entender se suas ideias se adequam às do clube, o mais importante das entrevistas é um alinhamento de expectativas e realidades sobre condições financeiras, metodologia de jogo e metas a curto, médio e longo prazo. A análise é do jornalista Alexandre Lozetti. Confira:
O ponto é que ao selecionar seu novo técnico por um caminho, de fato, mais profissional, o São Paulo assume também o compromisso com um trabalho de colaboração mútua para que o período do casamento seja o mais extenso possível. No pacote, também os possíveis benefícios e riscos da opção por um não brasileiro.
As ideias de Crespo não diferem tanto das de Fernando Diniz, embora na execução pareça haver uma predileção pelo uso de três defensores e transições mais velozes, principalmente após a retomada da posse de bola. O São Paulo certamente tratou disso nas conversas com o argentino.
A partir disso, a escolha dos jogadores que vão compor o elenco será fundamental. Uma das tantas razões – a maioria delas ainda mal explicada – para a perda do título brasileiro foi a carência de peças que pudessem colocar em prática o futebol que o São Paulo se propôs a jogar. Não será possível contratar aleatoriamente.
Crespo vai precisar, como Diniz precisou – e não teve –, de zagueiros velozes com qualidade no passe vertical, não aquele de ladinho para o parceiro de zaga; atacantes de beirada rápidos e de bom passe; um centroavante de mais imposição física; volantes que mesclem capacidade física e rapidez de movimentos.
Como encontrar características tão específicas sem muito dinheiro para investir? A resposta deveria estar numa equipe qualificadíssima de analistas de mercado e desempenho. Há bons jovens, ainda nem tão valorizados financeiramente, formados em suas categorias de base já sob conceitos do que se considera moderno no futebol. Mas conselheiros não os conhecem.
Quando se analisa o perfil dos entrevistados, entende-se que o São Paulo está disposto a ter um time de futebol ofensivo, corajoso, que propõe jogo. Essa ideia não se implementa apenas com boa intenção. É preciso montar um grupo de jogadores e uma comissão técnica capazes de executá-la, ainda que para isso precisem evoluir com treinamentos e tempo.
O risco é contratar um profissional que pode vir a ser cobiçado por mercados mais atraentes, dos pontos de vista financeiro e competitivo. O próprio São Paulo perdeu dois estrangeiros para seleções nacionais – Juan Carlos Osorio para o México, em 2015, e Edgardo Bauza para a Argentina, em 2016. Mais recentemente, o argentino Eduardo Coudet trocou o Internacional, então líder do Brasileirão, pelo Celta, da Espanha.
Juan Carlos Osorio deixou o São Paulo para dirigir a seleção do México, em 2015 — Foto: Marcos Ribolli
Os portugueses entrevistados pelo São Paulo também não escondem o desejo de trabalhar na Inglaterra. Jorge Jesus, de uma geração mais veterana, deixou o Flamengo para retornar ao Benfica.
Seja pela melhora recente do processo de formação, por questões de idioma ou pelo canibalismo do mercado nacional, em que os treinadores raramente têm tempo de acrescentar um trabalho com início, meio e fim ao portifólio, os brasileiros ainda não são vistos como opção por seleções ou equipes europeias.
O São Paulo terá um treinador na vitrine. Mais um motivo para se empenhar completamente em proporcionar a ele condições e situações que tornem sua passagem agradável e vencedora. (Alexandre Lozetti/Globo Esporte)